Senhores Deputados, agradecia que se sentassem para podermos começar a nossa segunda sessão.
Senhores Deputados e Senhores Membros do Governo, estamos prontos para começar a segunda sessão desta Assembleia de hoje.
O Governo traz-nos uma proposta de Combate à Abstenção e para começar o debate passo a palavra ao Senhor Primeiro-Ministro Guilherme Costa do grupo rosa para fazer a sua primeira intervenção em nome do Governo.
Guilherme Silva – Primeiro-Ministro
Muito boa tarde Senhor Presidente da Assembleia e a todos os Deputados.
No âmbito do cada vez maior número de abstenção, o Governo decide pôr em prática medidas que, sinceramente, se fossem postas ontem já seria tarde. É verdade, já ontem era tarde. Todos nós temos de votar. Há mais de vinte anos que a abstenção tem estado sempre a aumentar. Isto não é um problema do nosso Governo, é um problema de todos os Governos.
Pela primeira vez é apresentada uma medida séria para acabar com este flagelo da nossa sociedade.
Nós, o Governo, consideramos fulcral reforçar a legitimidade democrática, alargando a base eleitoral.
No nosso ponto de vista e de todas as pessoas de bom senso, Portugal tem que votar. Não é só um direito mas também um dever.
Nós temos criado, ao longo do tempo, iniciativas para o voto e sensibilizar a população. Não têm resultado. Como, aliás, vemos noutros sectores, como os transportes ou prevenção rodoviária, em que só sensibilizar não chega. O que temos que fazer? Possivelmente, multar. O que estamos aqui a discutir é o futuro do País. Se as pessoas não votarem, estão a atingir não só o futuro do País mas também o Governo, a legitimidade de quem cá está.
O que é que acontece? Perguntam vocês e eu também. (RISOS)
Temos que tomar medidas que combatam isto. Nós estamos a falar do futuro de todos nós, temos que ter uma participação activa no futuro de todos nós. Neste caso, o voto, vai contribuir para o nosso futuro.
Temos que deixar de ter a ideia que tudo o que estes senhores aqui em cima fazem não tem importância para o nosso futuro. Tem e muita, por isso devemos participar.
Nas últimas eleições foram 60% que não votaram! É muito! (PROTESTOS).
Uma voz
É mentira!
O Orador
É mentira? Em que é que se baseia? Não respondo a provocações vindas de baixo (PROTESTOS) e continuando porque o tempo urge. Vou passar à explicação das medidas.
Art. 1: “Objectivo e extensão”. N.º 1: Fica o Governo autorizado a legislar no sentido de aprovar um sistema de coimas que sancione os cidadãos maiores de 18 anos que se furtem ao dever legal de recenseamento.
N.º 2: Fica o Governo autorizado legislar no sentido de aprovar um sistema de coimas que sancione os cidadãos maiores de 18 anos que, estando recenseados, se furtem ao seu dever físico… cívico. (RISOS NA SALA)
(Fico muito triste por ver um debate tão sério ser levado para o gozo. Isto é um assunto muito sério, sabe? Tem consciência disso? Era bom que tivesse, sabe porquê? V. Exa. está a representar muitos portugueses que votaram em si). Continuando:
N.º 3: O disposto nos números anteriores não se aplicará a cidadãos que, por impossibilidade física ou psíquica, não possam exercer o seu recenseamento eleitoral ou direito de voto.
Art. 2: “Âmbito”. O regime de coimas a aprovar pelo Governo, aplicar-se-á ao exercício de voto nas eleições autárquicas, legislativas, presidenciais e europeias.
Art. 3: “Duração”. A presente autorização legislativa deve ser utilizada no prazo máximo de sessenta dias.
Agora com o tempo que ainda me resta, deixem-me só fazer uma pequena comparação.
Presidente
Senhor Primeiro-Ministro, agradeço que conclua.
Orador
Está tudo dito e fica na vossa consciência o facto de aprovarem esta lei ou não, mas acho que é fundamental e é de louvar. Aliás, é triste que seja este Governo a ter uma medida desta, visto ter sido um erro de todos nós, não digo só meu, a abstenção ter aumentado tanto neste últimos vinte e tal anos.
Muito obrigado
Presidente
Muito obrigado Senhor Primeiro-Ministro.
Tem a palavra para uma intervenção no debate a Senhora Deputada Márcia Silva do grupo amarelo.
Márcia Silva – Oposição 1
Muito obrigado.
Sua Excelência, o Senhor Presidente da Assembleia da República,
Senhor Primeiro-Ministro,
Senhoras Ministras, Senhores Ministros
Senhoras e Senhores Deputados
Para começar, não estamos aqui para discutir níveis, somos todos iguais perante a lei, quem vem debaixo, quem não vem debaixo.
É revoltante que após trinta anos da conquista da democracia surja uma proposta do Governo que a limite. A aplicação de coimas condiciona a liberdade de expressão do cidadão. Eu tenho o direito de votar ou não.
A abstenção é um direito, e é um direito que quando é exercido tem um significado político. O português que se abstém mostra o seu descontentamento com a política e isso não se resolve obrigando-o a votar sob coação de aplicação de coimas.
Em vez de termos um Governo autoritário que impõe medidas anti democráticas, como é o caso, devíamos ter um Governo que se preocupasse com o estudo e combate das causas da abstenção.
O essencial é saber porque é que os portugueses se abstêm e depois tomar medidas para acabar com esses motivos. Sinceramente, a penalização dos efeitos sem combater as causas é um erro clamoroso, é descabido.
Felizmente, e mostrando que não somos uma Oposição destrutiva lançamos algumas ideias para fomentar a participação eleitoral.
Porque não pensar em criar condições para dinamizar o processo burocrático utilizado pelo recenseamento, o voto eleitoral através da Internet, incutir a educação política nas escolas para cativar os jovens e por aí.
Meus caros amigos, este é o caminho.
Por outro lado, mesmo se, por absurdo, quiséssemos seguir o vosso caminho, surgem-nos dúvidas.
Primeiro, estas coimas são também aplicadas aos círculos de emigração?
Segundo, na vossa proposta referem-se ao valor das coimas, 5% do salário mínimo ou trabalho cívico. Um jovem de dezoito anos, estudante que não vá votar após três meses, interrompe os seus estudos para se dedicar ao trabalho cívico se não tiver condições para pagar a coima?
Presidente
Senhora Deputada, peço que conclua por favor.
Oradora
Terceiro, houve aqui uma desautorização do Ministro da Presidência ou então uma prova cabal da incompetência deste Governo.
O Senhor Ministro disse à imprensa que a proposta iria abranger todas as eleições, incluindo as regionais. A proposta que aqui apresentaram não refere as eleições regionais. Das duas uma: ou recuaram na ideia inicial ou desautorizaram o Ministro.
Vozes
Muito bem, muito bem. (PALMAS)
Oradora
Esqueceram-se de o incluir. O que prova a vossa ligeireza, a vossa incapacidade e a vossa total incompetência. Retirem esta descabida proposta e combatam as verdadeiras causas da abstenção.
Muito obrigado.
Presidente
Está inscrita para falar no debate a Senhora Deputada Gabriela Queirós, representando o grupo roxo.
Gabriela Queirós – Oposição 2
Muito obrigada Senhor Presidente.
Muito boa tarde Senhor Primeiro-Ministro,
Senhores membros do Governo
Senhoras e Senhores Deputados
Tem toda a razão, é muito triste que este seja o primeiro Governo a apresentar uma proposta desta. E o meu primeiro impulso é agradecer-lhe porque se o Senhor insistir nesta medida perderá as próximas eleições - levar os cidadãos a votar à força (e é disto que aqui se trata, sejamos claros), fará com que o Senhor perca as próximas eleições. E nós conhecemos os números porque felizmente ganhámos mais eleições que o Senhor até agora. (RISOS)
A questão aqui é que as pessoas não votam e não vão às urnas por um descrédito generalizado da classe política. E o Senhor tem culpa, eu tenho culpa e todos nós. O que o Senhor não pode é transferir para os cidadãos eleitores um castigo que somos nós que merecemos.
A diferença entre o Senhor e nós, é que esta Oposição não está disposta a deixar de lutar, esta Oposição quer trazer os cidadãos de volta às urnas, quer fazer emergir aos olhos dos cidadãos uma Oposição credível, uma classe política credível, enérgica, convincente, competente, é isso que vai trazer os cidadãos de volta às urnas. (PALMAS)
O direito de voto é uma das conquistas mais importantes do Homem como ser político e como ser social. Esse direito de voto felizmente é livre, livre no seu exercício mas livre e sobretudo na sua disponibilidade.
A soberania reside no povo mas cabe ao povo decidir qual é a forma de a exercer. Já agora, Senhor Primeiro-Ministro, esta Assembleia representa todos os cidadãos, os que votaram e os que não votaram, os que foram às urnas e os que ficaram na praia e é para todos eles que temos que trabalhar.
O número três da sua proposta, acho-lhe graça, sinceramente, o Senhor disse: “o disposto dos números anteriores não se aplicará a cidadãos que por impossibilidade física ou psíquica não possam exercer o seu recenseamento eleitoral ou direito de voto”. Coitadinho deles, não é?
Mas não pensaram em eliminarem as barreiras, em levar-lhes o recenseamento eleitoral e o direito de voto a casa se preciso for. Em facilitar o processo eleitoral, em facilitar o voto electrónico, em investir.
E, já agora, para onde vai o dinheiro aplicado nas coimas que vão ser arrecadadas com a sua fantástica proposta? Mais cartazes da Comissão Nacional de Eleições que ninguém lê? Em mais tempos de antena que ninguém vê? Ou, finalmente, apostar numa educação cívica a sério, numa educação para a cidadania a sério nas nossas escolas?
Senhor Primeiro-Ministro, sensibilizar a população não tem resultado (como o Senhor diz) porque não há programas sérios para isso. Não se investe em educação para a cidadania e não é com propostas dessas que o senhor vai conseguir lá chegar.
Nós sabemos que o voto é um direito, sabemos que o voto é um dever, nós temos noção que a abstenção é um problema gritante mas o voto é um dever cívico, não é um dever legal! É um dever de cidadania e a cidadania não se força, incute-se! Não se obriga, exerce-se! E sobretudo não se castiga, merece-se.
Presidente
Senhora Deputada, peço que conclua por favor.
Oradora
Muito obrigada Senhor Presidente.
Façam os Senhores por merecer a soberania de que estão investidos porque esta Assembleia não vai conceder-vos a autorização necessária para regular esta matéria. (PALMAS)
Vozes
Muito bem, muito bem.
Presidente
Tem a palavra o Governo, pela voz do Senhor Ministro Rodrigo Lopes.
Rodrigo Lopes - Ministro
Senhor Presidente
Senhores Deputados
A Oposição brindou-nos mais uma vez com uma das suas floridas intervenções, completamente demagógicas e despropositadas.
A Senhora Deputada Márcia Silva acusou o Governo de autoritarismo? Sabia que nos regimes autoritários, aquilo que menos conta são os outros cidadãos? Sabia que nos regimes autoritários o direito que permanece acima de todos os outros é o direito do Estado impor a sua vontade? O que é que nós queremos ao desejar que os cidadãos votem?
Orador
Não me interrompam que eu não as interrompi.
O que é que os Senhores propõem, após trinta anos de democracia em Portugal (uma democracia relativamente jovem)? A partir de 71 e 77 os índices de abstenção obtiveram uma subida sustentada, atingiram o valor record em 99 de quase 39%.
A Senhora Deputada Gabriela Queirós referiu que as pessoas não votavam porque estavam desiludidas com o sistema, porque estavam desiludidas com a política e pensavam que os políticos não as ouviam. Tem a certeza que é isso? Já ouviu falar de preguiça cívica? De ficar a tarde inteira no café a dizer mal do Governo. Ou daqueles que pensam que o Governo é responsável por tudo. Está enganada: as pessoas têm mais responsabilidades.
O problema em Portugal é um problema de responsabilidade. Nós gostamos de nos furtar às responsabilidades. O Governo não pode fazer tudo e para responder à Senhora Deputada Márcia Silva: o Governo não é totalitário, não pode fazer tudo.
As pessoas devem ter vontade de votar, de exprimir a sua vontade. É inadmissível que se passe a tarde no café a dizer mal do Governo e no dia das eleições “baldar-se” para a praia. É totalmente inadmissível e não há políticas erradas. Seja deste Governo, seja da vossa oposição, no passado que justifique esta atitude.
É puro laxismo, é puro laxismo.
Depois a Senhora Deputada Gabriela Queirós referiu que nós devíamos levar as urnas a casa das pessoas. Isso é fantástico, sabe quanto custaria ao erário público? Está a ver carrinhas da Comissão Nacional de Eleições a percorrerem o Bairro Alto em Lisboa a dizer:
Presidente
Senhor Ministro, peço que conclua por favor.
Orador
Olhe Sra. Elvira, venha cá recensear-se - a Senhora Elvira está acamada, por acaso.
Foi por isso que na Lei pusemos que pessoas incapacitadas físicas ou psíquicas não teriam essa obrigação. O que está em causa é fazer ressurgir a qualidade da nossa democracia.
Presidente
Senhor Ministro, muito obrigado. (PALMAS)
Tem a palavra para um pedido de esclarecimento ao Governo o Senhor Deputado Gonçalo Capitão.
Gonçalo Capitão – Grupo Surpresa
Esta é uma proposta verdadeiramente fascizante, Senhor Primeiro-Ministro.
(PALMAS) - peço desculpa, não cumprimentei nem o Senhor Presidente nem os Senhores membros do Governo e os Senhores Deputados.
E a prova que os Senhores têm intuitos fascizantes é que pelos vistos já nem no café se pode falar mal do Governo. (RISOS e PALMAS)
Acabou a liberdade de expressão, como disseram alguns dos nossos colegas da Oposição. A abstenção pode significar tranquilidade com a vida democrática ou pode significar um profundo descontentamento – o que também é legítimo.
Já agora em vez de despenalizar por que não premiar aqueles que forem votar? Porque é que não fazem sorteios como na Rússia? Ou porque é não dão prendas como houve em Gondomar. (PALMAS). Mais ainda, porque é que não limparam os cadernos eleitorais? Tivessem limpado os cadernos eleitorais (se se tivessem lembrado disso), se calhar não tinham tantos problemas.
Controlar duas abstenções seguidas? Os Senhores vão pôr funcionários do Estado a controlar duas abstenções seguidas? Então porque é que não controlam primeiro a evasão fiscal, o desemprego, a pobreza e o analfabetismo? Não vos interessa.
Por último, para além de fascizante o vosso Governo é miserabilista: em vez de subir o nível de vida dos cidadãos vai confiscar-lhes parte do salário mínimo por exercerem a sua liberdade. Qualquer dia os Senhores têm coimas para quem bocejar no discurso de natal do Primeiro-Ministro ou quem for à casa de banho na mensagem de Ano Novo do Presidente. (PALMAS)
Presidente
Para responder se assim o desejar, pelo Governo a Senhora Ministra Susana Faria.
Susana Faria - Ministra
Boa tarde.
Senhor Presidente,
Senhores Deputados
De facto os cidadãos não vão votar, não podem ir votar. Esta Oposição, mostra que os cidadãos não estão satisfeitos. (RISOS)
Sim, porque nós estamos cá e vamos trabalhar. Vamos ter força e vamos trabalhar.
As pessoas têm obrigação moral de participar na vida pública e na definição dos seus destinos. Votar permite expressar todas as suas posições, quer seja a escolha de quem vai governar ou descontentamento, falta de confiança nos candidatos ou no sistema - podem demonstrá-lo com voto em branco.
É para isso que serve o voto em branco. Para expressar descontentamento.
Só assim é legitimada a opinião de todos os cidadãos que estão de acordo e desacordo com os candidatos e respectivas políticas. Hoje e no futuro, com a garantia de que com este sistema, num prazo definido no tempo, poder-se-á expressar novamente a sua opinião. Existem países que aplicam este sistema, o Brasil é um caso. E as coimas? Não, a coima não é 5% do salário mínimo! Não, a coima é a perda da personalidade jurídica, é a perda dos direitos! Nós estamos a falar em perdas de direitos e em cumprir os deveres.
Presidente
Senhora Ministra, agradeço que conclua, por favor.
Oradora
E quanto às coimas, elas deviam ser aplicadas aos Deputados que não fazem o trabalho de casa. (RISOS).
Presidente
Muito obrigado Senhora Ministra.
Peço a atenção aos Senhores Deputados dos grupos que não intervieram neste debate. Relembro que o Governo interveio através do Senhor Primeiro-Ministro Guilherme Costa, do Senhor Ministro Rodrigo Lopes e da Senhora Ministra Susana Faria.
A Oposição 1 interveio através da Senhora Deputada Márcia Silva e a Oposição 2 através da Senhora Deputada Gabriela Queirós.
Vamos então votar. Agradeço que votem os Senhores Deputados que pensam que o Governo ganhou este debate. (PAUSA). Agradeço agora que votem os Senhores Deputados que acreditam que a Oposição 1 ganhou o debate. (PAUSA). Levantem agora o boletim os Senhores Deputados que acham que foi a Oposição 2 que ganhou este debate. (PAUSA). Obrigado.
Dou por encerrada esta segunda sessão, proclamando os resultados. A Oposição 2 venceu este debate com 41 votos, contra 5 da Oposição 1 e 4 do Governo. (PALMAS)
Passo a Presidência ao Senhor Deputado Carlos Coelho e agradeço que os grupos se substituam para a próxima sessão.