Mensagem Final
   
   
 

 

 

 

 

 

 


Carlos Coelho – Director UV

O Prof. Valadares Tavares é uma daquelas raras pessoas que associa um grande rigor e qualidade intelectual, a uma grande capacidade de comunicação, como aliás vão ter oportunidade de ver. É um professor catedrático que tem uma grande experiência quer em Portugal, quer ao nível da Europa, (como aliás podem ver consultando o seu curriculum). É Presidente do Instituto Nacional de Administração e aceitou o nosso desafio para nos falar, fazendo uma radiografia de Portugal. O Prof. Doutor Luís Valadares Tavares tem como hobby a história das ideias políticas, a música country e a natação que, dizem os entendidos, é o desporto mais completo. A comida preferida são saladas tropicais, portanto um homem com uma preferência austera na gastronomia (RISOS), o animal preferido é a águia-real, ele dir-nos-á se é por razões estéticas ou por preferências futebolísticas. O livro que sugere é um livro em que ele colaborou, mas que não é só dele e portanto, não o podemos acusar de narcisismo: “Reformar Portugal”. O filme que sugere é “O leopardo” de Visconti e a principal qualidade que aprecia nas pessoas é a beldade.

Senhor Professor Valadares Tavares muito obrigado por ter aceite o nosso convite, a palavra é sua.

 

Professor Valadares Tavares

Acho que vocês vão ficar razoavelmente desiludidos, depois desta intervenção do meu amigo Carlos Coelho, mas tenho que dar um certo desconto. É que realmente somos amigos há muitos anos e eu penso que o nosso País tem défice, (o défice está muito na moda), temos um défice de políticos com ideias, com energia e com criatividade e aqui o meu amigo Carlos Coelho, é um dos melhores exemplos de resposta a esse défice.

Eu gostava de vos dizer o seguinte: este convite que me foi feito, eu aceitei-o com imenso gosto. Acho que vale a pena, justamente no Verão, trabalhar com os jovens e esse assunto, aliás vai ser retomado daqui a bocadinho na nossa apresentação. Mas este tema da radiografia de Portugal pode ser agarrado de muitas formas, com muitas estatísticas, com muitos dados, mas eu não vou fazer isso. Eu vou, no fundo, deixar aqui um repto: serem também vocês a descobrir o País. Até porque eu continuo convencido que muitas das ideias, muitos dos factos, muitos dos lugares comuns que vocês estão habituados a ouvir, não são realmente verdade.

O País é um bocado diferente daquilo que vos aparece todos os dias.

O meu nome é Luís Valadares Tavares, podem-me tratar por Luís, já agora deixem-me dizer-vos o seguinte: eu tenho o email mais curto de toda a administração portuguesa que é [email protected] . Para quem se esquecer do meu nome, que, aliás, é imperdoável, podem-se lembrar de Lisboa e Vale do Tejo, é exactamente as mesmas iniciais (RISOS). INA é o Instituto Nacional de Administração, pt é o País. Portanto, uma região, uma instituição e o País.

Bom, falando agora do nosso País. Eu devo-vos dizer que acho que é um Pais fantástico. Eu pertenço a uma geração que viveu muito o processo de transformação política de Portugal, e tive a certa altura, oportunidade de ser professor convidado numa universidade americana, em Columbia e optei por ficar cá e fiz muitíssimo bem. Sou um entusiasta de Portugal, acho que é um país espantoso, acho que todos vocês têm imensa sorte de serem portugueses. Eu sou um fã, eu sou um entusiasta do nosso País.

E é por isso que eu acho que vale a pena começar pela questão dos activos. Enfim, alguns de vocês estão em Gestão, outros não estão, mas sabem que, hoje em dia, quando se fala de qualquer sistema numa empresa, num hotel, num partido político, numa juventude, é bom que se diga quais são os pontos fortes e os pontos fracos, quais são os activos.

Depois vamos ver um bocado do passado recente, sucessos, erros, desafios, opções e certamente depois vamos ter um bocado de debate convosco. Mas quais são os activos? O activo mais importante que há no nosso país, por assim dizer, acho que é o capital humano. O nosso País, em nenhum momento da sua história, teve tantas pessoas qualificadas, tantos jovens qualificados, tantas pessoas com especializações, com mestrados, com MBA’s, com doutoramentos, desde as políticas às empresas. Não sei se vocês repararam, que aqui há tempos, um jornalista muito conhecido, o Nicolau Santos, escrevia no Expresso que justamente havia no nosso país um escol de empresas muito fertil. E indicava os temas, as áreas, os nomes. E depois identificava que em todas essas empresas havia um ponto comum. O seu gestor era uma pessoa muito qualificada. Tinha um mestrado, tinha uma especialização, tinha trabalhado no estrangeiro. Portanto, nós temos mais capital humano do que em qualquer momento. E talentos. Se vocês repararem o português é naturalmente talentoso. Na guitarra, no fado, no desporto, na engenharia, na arte, na política.

Mesmo a nível internacional. Eu, por exemplo, terei sido talvez, o primeiro a felicitar o Dr. Durão Barroso pela sua escolha para Presidente da Comissão, porque estava convencido que era isso que ia acontecer. Como analista marginal da sociedade, mandei-lhe os parabéns mas ainda não era conhecido o facto e ele ficou muito surpreendido. Telefonou-me a perguntar quem é que me tinha dito. Eu disse, “ninguém me disse, mas enfim, percebi pelos sinais do estava a acontecer. É um facto muito importante para os portugueses. Eu, por exemplo, fui eleito Presidente do Comité de Educação da OCDE, não vejam nisto qualquer vaidade pessoal, mas de facto, porque era melhor do que os outros. Notem que os portugueses, embora sejamos poucos, 9 ou 10 milhões, em muitos casos já pomos algumas condições. E às vezes temos melhores resultados do que os outros. Portanto, eu peço-vos que vocês, (que estão em princípio na casa dos 20, 20 e tal anos), aceitem este meu testemunho. Em princípio, de um modo geral, nós somos melhores do que os outros.

Por outro lado, temos muito mais internacionalização. E portanto, isso é bom. Eu por exemplo, sou professor convidado de uma universidade americana, aliás no próximo ano vou lá dar um curso, e uma das coisas que eu faço sempre quando inicio as aulas, é perguntar aos alunos onde é que eles estiveram, fora do país. De um modo geral, estão numa situação semelhante à do presidente Bush quando iniciou funções: tinha ido ao México. Isto é o capital que nós temos. E naturalmente, gostamos até de estar noutros sítios, trabalhar noutros países, adaptamo-nos bem e somos muito mais diversificados.

Eu tenho o privilégio de ser professor há cerca de 30 anos e ao longo destes 30 anos vejo dois fenómenos muito interessantes: 1) muitos dos meus colegas mudaram pouco e 2) a maior parte dos alunos mudaram muito. Ou seja, vocês hoje são bastante diferentes do que eram os alunos de há 20, 30 anos. E talvez o traço mais importante dessa mudança é justamente a diversidade. Vocês hoje são muito mais diversificados. Um tipo que é muito bom em surf, o outro que é muito bom em política, o outro que sabe imenso de música rock, o outro que faz jogos de estratégia lá no clube de xadrez, outro que faz não sei quê. Vocês são muito mais segmentados, para usar uma linguagem do marketing, do que eram há 20 ou 30 anos atrás. Isso é muito interessante.

Eu quando dou aulas de gestão (Católica, Técnico), faço exercícios de jogos de negociação. Os jogos são, por exemplo, muito mais interessantes do que aqueles que eu faço na Universidade de New Castle, em que sou professor convidado no nordeste de Inglaterra. Porquê? Porque os alunos aí são muito mais homogéneos.

E toda este enriquecimento, por exemplo, étnico do nosso País, vejam-no como um sinal muito positivo, os ucranianos, os romenos, os africanos, os asiáticos. Se tivéssemos aqui mais cinco, fazíamos agora um inquérito. Qual é a cidade em que vocês gostavam de estar? A maior parte das pessoas (entre as quais me incluo) responde Nova Iorque. Porque é que nós gostamos muito de ir a Nova Iorque? Por causa da vivacidade. A qualidade de vida em Nova Iorque é muito pior do que em Genéve, na Suiça. Mas Genéve é uma chatice. Não acontece nada. São todos iguais.

Vejam o caso do turismo. Turismo antigamente era ver bilhetes postais. Era visitar o Taj Mahal ou visitar a Torre Eiffel - isso passou. Os países, as economias, as empresas, baseadas nesse turismo estão todas a falir. E uma boa parte do nosso País, nesse aspecto, também está a falir. Porquê? Porque o que nós gostamos hoje em dia é ter experiências. Muito especialmente o turismo jovem. Mas também da minha idade. Por exemplo, eu gosto imenso de ter experiências. Fazer alpinismo, ou viver com uma família nas Montanhas Rochosas, ou outra qualquer actividade. Porquê? Por causa da diversidade.

Estes pontos são positivos. São pontos em que somos bons - nas pessoas. Tenho aqui umas imagens para vocês não adormecerem durante a minha intervenção, algumas mais conhecidas que outras, mas acho-as importantes.

Quando dou aulas de Gestão, o que eu lhes digo é sempre isto (se calhar, uma das poucas coisas que os meus alunos fixam): se vocês estão a fazer um curso de gestão, devem gostar de pessoas. Claro que nem toda a gente gosta de pessoas, há quem goste de animais, ou de paisagens. E se isto é válido para a Gestão, é muito mais válido para, por exemplo, as áreas da actividade política. As pessoas que se dedicam à actividade política devem gostar de pessoas. Isto que vos vou dizer, já digo há uns quantos anos, (não há aqui qualquer oportunismo político), mas, por exemplo, o Dr. Pedro Santana Lopes quando fala – vocês vão ver isso nestes dias – há ali uma atitude de interesse, de gosto pelas pessoas. Isso é muito importante. Porque é que eu pus aqui estas pessoas (APRESENTAÇÃO EM POWER POINT)? Algumas vocês conhecem, não é? O novo ícone do Ronaldo, etc. Este aqui debaixo acho que não devem conhecer, o que está no meio, é um colega meu, Engenheiro Segadães Tavares que teve o equivalente ao prémio Nobel de engenharia de estruturas. Achei que devia estar aqui. Basta quando nós somos realmente talentosos.

Este aqui da direita não sei o nome (algumas são fotografias feitas por um aluno meu), mas vocês sabem com certeza, é um actor muito conhecido das telenovelas, uma indústria em expansão, muito importante. Neste momento já corresponde a 40% do share. Portanto, a indústria nacional de multimédia. Deixem-me dizer-vos. Eu continuo convencido de que o nosso País tem todas as condições para termos um cluster de informática e multimédia. E criatividade. Não é andarmos a fazer concursos para candidaturas de empresas, em que aparecem “as da rolha, ao rebuçado”. Era fazer aí uma aposta prioritária. Isto é só para vos dizer que as pessoas são importantes.

Depois temos aqui também a questão das comunidades e das regiões. O nosso País tem regiões e comunidades muito diferentes. Esta fotografia aqui. Pode parecer uma manifestação de estudantes contra as propinas. De facto, não é. É um encontro de tunas académicas. Onde estava a tuna da minha escola, que é o Técnico. Como sabem é a melhor tuna do País. (RISOS). Temos aqui uma grande diversidade de regiões. Por exemplo, esta região onde estamos (e que foi muito bem escolhida) é uma região muito bonita.

Devo dizer que em Lisboa chovia torrencialmente e vocês têm um sol tropical.

Outro tópico: vocês não acreditem muito na cantiga que as nossas empresas são todas más e fracas. Temos um conjunto de empresas muito variadas, muitas delas de sucesso. Estes 20 anos, (de 1977 a 1997) – vocês devem ter nascido por volta de 80 e pouco – mas estes 20 anos em que vocês foram crescendo, deixaram de ser bebés e passaram a ser adultos responsáveis, são 20 anos em que o País também se transformou profundamente. É muito difícil, encontrarmos 20 anos em que o País tenha mudado tanto, ao longo de 800 anos de história. Vocês estão a ver a coincidência? Terem nascido e, digamos, crescido justamente nos 20 anos em que o País mudou mais, nos últimos 800 anos? É uma coincidência espantosa. E em muitos aspectos mudou de uma forma positiva. Por exemplo, esta questão do PIB: 3% de crescimento em média por ano, ao longo de 20 anos, é muito. É muito bom. É um enorme sucesso. Há muito poucos Estados assim a nível mundial. Tenho a ideia que o nosso fatalismo que não cola com a realidade. Este é um enorme sucesso.

Eu tenho filhos um pouco mais velhos que vocês e lembro-me que quando eles eram pequenos, em certas épocas do ano não havia leite. Era, salvo erro, Outubro, Novembro. O Carlos será terrivelmente mais jovem do que eu, ainda se lembra, portanto havia ali uns meses, Outubro, Novembro, em que não havia leite. Portanto, é um País muito diferente.

Saúde. Eu acho que também vale a pena chamar a atenção para estes factos. Referem-se à política do Dr. Cavaco Silva na área da Saúde. Naqueles anos, no início da década de 90, foi espectacular nalguns aspectos. Vocês reparem em 1980 - eu prometo hoje maçar-vos pouquíssimo com dados quantitativos, portanto, estejam descansados que não vão ser fustigados nessa óptica, mas alguns são importantes. Aqueles que nasciam em 80, em 1.000 morriam 24. Passados 20 anos, em 1.000 morrem 6. Espectacular. Portanto, alguns de vocês se tivessem nascido com 20 anos de diferença, as chances são completamente diferentes. De 24 para 6. Estão a ver bem o que isto significa? É um dado muito importante. Saber se estamos vivos, se estamos mortos.

(UM MINUTO INAUDÍVEL NA GRAVAÇÃO) Há um facto que eu acho que é importante. Aquela geração que nasceu em 60, 70, só 6% chegavam ao ensino superior. Da que nasceu em 80, 40% chegou ao ensino superior. 6 vezes mais. Vocês que estão aqui, que nasceram na década de 80, se tivessem nascido 20 anos antes, em 6 só estava 1. os outros não estavam aqui. Imaginando que vocês aqui estão todos no ensino superior. Estão a perceber? Uma vez apresentei isto num encontro de associações de estudantes, houve um dirigente associativo que me disse assim: “Professor, tem razão. Mas há um problema. É que os que nasciam em 60, só 6% entravam no ensino superior, mas depois acabavam o ensino superior e tinham um emprego. Os de 80, entram 40%, mas depois ficam no desemprego”. E eu disse-lhe: “tens razão. O ideal será: para efeitos de acesso, nascer em 80, para efeitos de emprego, nascer em 60 (RISOS). E optimizarmos a nossa estratégia”.

Aquela ideia de que Portugal não muda, é exactamente o contrário. Agora tem havido erros monumentais. É evidente que não podemos contar só coisas simpáticas. Eu digo que os erros são monumentais porque são mesmo espectaculares. São monumentais e só se explicam pelo facto de as pessoas não terem o mínimo de análise e de conhecimento da realidade. Reparem na Despesa Pública e vão ver que houve erros monumentais. Não tem nada a ver com Bruxelas. Aquela confusão de se pensar que é um erro de Bruxelas, de haver uns chatos que querem 3% para o défice, de 4 ou 5 ou 6. Não tem nada a ver com isso. Nada. É outra história.

O problema do emprego preocupa-vos. A mim também. Preocupa-nos a todos.

Na produtividade também há erros monumentais. Apresento-vos aqui um gráfico muito simples. São 3 países. Portugal, Espanha e Irlanda. Vocês sabem que a União Europeia é um mercado comum. Estamos em competição uns com os outros. O que é que aconteceu? (Sempre que quiserem interromper, estejam à vontade). Em 91 38% da riqueza que produzíamos anualmente ia para Estado. Despesa Pública. Passámos para 43%. Pode ser chato, não foi simpático, mas também, que diabo, é um aumento de 5%. Porém, há um problema é que os outros evoluíram no sentido oposto. Já viram? Espanha passou de 41 para 35. A Irlanda de 41 para 25. e não pus ali mais casos para o gráfico não ficar carregado. Mas tínhamos o caso dos Países Baixos, Bélgica, etc. A excepção foi a França e a Alemanha. Mas à França e à Alemanha nós não nos podemos comparar. A França e a Alemanha, aliás, estão a ficar com problemas gravíssimos. Portanto, isto não é um problema de Bruxelas.

Vocês estão a correr uns com os outros. Há um concurso, há uma competição entre nós. Se há uns quantos que andam muito depressa, os outros também têm que andar. Vocês conhecem aquela anedota do francês e do inglês que estão na selva? A certa altura aparece um leão que se põe a correr atrás deles. Então perguntam ao inglês se a estratégia dele é correr mais do que o leão, ele diz: “não, é correr mais do que o francês”. (RISOS). É exactamente o mesmo problema. Acham que este é um problema de Bruxelas? Acham que isto é Bruxelas? Os nossos políticos podem dizer: “mas é que os espanhóis são uns tontos. Eles não deviam ter evoluído de 41 para 35%”. Temos agentes partidários respeitabilíssimos que ainda querem aumentar mais a despesa pública, com subsídios a todos, de maternidade, de paternidade, de desemprego, de emprego, etc. “Eles são uns tontos, estão todos errados”. Bom, mas a certa altura, o mundo está todo errado e se eu estou a competir com um mundo que está todo errado, o melhor é também estar errado. Estão a perceber? É uma atitude pragmática. Não tem nada a ver com problemas de fundamentação macroeconómica. Só tem a ver com o francês, o inglês e o leão. (RISOS). Fixem isto. O francês, o inglês e o leão.

Emprego. Agora estamos a entrar um bocadinho na fase deprimente da minha apresentação, porque eu já vos disse que estes erros são todos monumentais. São espectaculares, são vistosos. Dá para fazer estes slides, há pessoas que cometem erros, mas erros discretos. Os nossos são erros mais espectaculares. O que é que aconteceu em termos de emprego? Durante 10 anos, entre 1992 e 2002. Portugal aumentou 33% do emprego público, 0,8% do emprego privado. Isto quer dizer, criámos postos de trabalho, com certeza que sim. Aonde? No Estado. Qual era a estratégia? Começava-se por pedir a uma pessoa para fazer umas pequenas tarefas, depois essas tarefas passavam a recibo verde e depois o recibo verde passava a funcionário público. Geralmente pessoas pouco qualificadas. Deixem-me dizer-vos uma coisa, isto não é só a Administração Central, não são os directores-gerais. Deixem-me pôr-vos aqui um facto concreto: Municípios entre 96 e 2002, 6 anos. Quanto é que aumentou a factura de despesas de pessoal dos nossos municípios? Digam lá. Um guess? (Quando faço perguntas, é para vocês responderem). Digam lá uma percentagem. Eu repito, despesas com pessoal, vamos esquecer as fundações e as empresas municipais e aquelas soluções todas, mais criativas dos nossos municípios. O próprio município. Factura com o pessoal. 96-2002 preços constantes. Quanto é que aumentou a factura? 10%. Outra. 20. Outro. 40%. Aumentou 40%. É evidente que também há uma faceta positiva, porque se forem ver, esses 40% de aumento não foi com doutorados, nem com especialistas de água, nada disso. Foi com os miúdos que não conseguiram passar no 12º ano e que tinham que fazer qualquer coisa. Uma pessoa amiga que pedia a um vereador: “olhe tenho lá um Joãozinho que é tão bom rapaz (RISOS), ele foi uma vítima, a professora embirrava com ele, chumbou, não consegue fazer, há 20 anos que anda a tentar fazer o 12º ano (RISOS). Que diabo, não há aí na Câmara qualquer coisa que ele possa fazer?”.

(Eu gosto imenso do que faço e da vida que tenho), e no outro dia estava com uns amigos a jantar, jantamos periodicamente, e sempre que jantamos temos um tema, para aprendermos com os outros. Dou-vos esse conselho: vocês periodicamente, semanalmente, façam esse exercício: o que é que aprenderam na semana passada? Podem ser coisas simples. E estávamos a fazer esse exercício. Tínhamos esses dados. 40% é assustador, mas há municípios em que foi 70%. Então o exercício que nós fizemos foi: qual é a empresa do nosso País, (empresa que pode ser de indústria, serviços, etc) que aumentou as despesas de pessoal em 40% naquele período? E nós discutimos, discutimos. Fomos jantando, pedíamos mais coisas, etc, até encontrar uma empresa e de facto, encontrámos uma. Já na sobremesa, em desespero de causa, conseguimos encontrar uma empresa com um pequeno problema: essa empresa faliu. Portanto, o nosso crescimento de emprego foi completamente diferente do da Espanha, para não falar do da Irlanda.

Eu devo-vos dizer que estes dados resultam de uma interacção que eu tenho tido com o Professor Medina Carreira, até a fonte foi ele que obteve. E o que é que isto significa? Qual é a percentagem do dinheiro que o Estado vai buscar aos portugueses? Qual é a percentagem gasta com salários, subsídios, pensões, etc? E como vocês podem ver, em toda a União Europeia, Portugal está na taxa máxima: 83. Em 10 anos os valores passaram de 72 para 83. A Grécia fez exactamente a evolução oposta.

Mas há aquela ideia de dizer: “este é o problema dos 3% do défice para Bruxelas”. Acham que é? Vocês têm casos como a Irlanda, que está nos 54% e nós estamos em 83.

Isto é realmente para vos mostrar que houve aqui erros graves. A questão da produtividade. Não vale a pena batermos mais na velhinha, porque ainda é pior, quer dizer, estamos realmente com níveis muito baixos…

Eu tive aí um enorme debate com o Eng. António Guterres, por quem aliás tenho muita estima e foi meu colega de curso. Sobre este problema da produtividade, chegámos a uma conclusão fundamental: não nos entendíamos! Ele não aceitava os números e os factos, mas pronto, enfim.

Vamos entrar agora aqui numa parte, emocionante desta nossa reflexão, que se podia chamar a teoria do cometa. Algum de vocês estuda astrofísica? Astronáuticas? O mais próximo se calhar é engenharia aeroespacial. És tu? Então pronto. Temos apesar de tudo aqui um homem do espaço. A teoria do cometa é a seguinte: de um modo geral os países vão melhorando, ou vão evoluindo, mais depressa, mais devagar, ritmos maiores.

A Irlanda melhorou muito, já sabem, também não vale a pena irritarmo-nos mais com o caso da Irlanda. Podíamos arranjar desculpas: eles têm os amigos americanos, falam todos inglês, etc. E também é um país onde chove imenso, não dá gozo nenhum andar para ao ar livre e uma pessoa tem que trabalhar, não é? Quer dizer, não sei se já foram à Irlanda, quase nem há discotecas, é realmente um país onde há poucos motivos de distracção. É um país chato. A Irlanda melhorou muito, mas a Espanha que é tão animada e que se diverte tanto, como vêem, continuou a melhorar. Agora o que é interessante – eu agora digo interessante, mas de facto é dramático – e é por isso que eu chamo a esta reflexão a teoria do cometa – é que Portugal aproxima-se, mas entra em afastamento. Um bocadinho como aqueles cometas que se aproximam na altura e depois saem numa trajectória gradual. Portanto, em termos de poder de compra, estamos a piorar desde 97-98, face à média europeia. Se quisermos ficar satisfeitos, então podemos comparar-nos com o Burundi: não tenho os dados do Burundi mas devemos ter 100 vezes o poder de compra deles. Mas o problema é que nós estamos neste clube e portanto é neste clube que estamos a combater. Agora reparem no seguinte: este é o cenário mais dramático que eu tenho aqui: os mais sensíveis fechem os olhos (RISOS). De facto, devia colocar ali uma bolinha da televisão, mas depois há pessoas que só vêem os filmes quando têm bolinha, também não sei se funciona.

Desde 97-98 que o País se está a afastar. Já vimos que se afasta em termos de riqueza e do dinheiro que temos. Mas também se afasta em escolarização. Sabem o que é a taxa de escolarização? É a percentagem de jovens de uma determinada idade que está a estudar. Ensino secundário, ensino superior, ensino profissional, ensino militar, ensino artístico, religioso, seja o que for. O que é dramático é que atingimos ali a casa dos 79%, enfim, ela é razoável e depois, enquanto que os outros continuaram a aumentar, nós passámos a diminuir. Na casa dos 16 anos, mas nos 19 também. E sabem que esta ideia do cometa, que nos estamos a afastar em relação à Europa, é válida para a riqueza, educação, mas também energia e ambiente. Estamos numa rota de divergência. O que é obviamente dramático muito mais para a vossa geração que para a minha. Já agora, deixem-me só dar uma boa notícia: eu penso que o Ministério da Educação não conhece estes dados, nem está a fazer estas análises, portanto, estão muito menos preocupados do que nós.

Grandes desafios. A minha fotografia do País é uma fotografia com muitas contradições, que teve 20 anos de enorme sucesso, que está agora - como vocês quando estão a conduzir em de excesso de velocidade e entram numa curva, onde não sabem se vão conseguir acabar a curva, ou não ou se saem pela tangente – claramente com indicadores de divergência, anómalos nalguns aspectos, com os tais 80% do dinheiro que sacamos às pessoas para salários, subsídios, pensões, etc.

Seria maldade da minha parte se não passasse a uma atitude mais construtiva: saber o que é que eu penso que se pode ou deve fazer. Grandes desafios. Mais economia de conhecimento, em vez de economia de mão-de-obra barata. Vocês sabem que é uma ideia importante, participação cívica e empreendedorismo. É por isso que, por exemplo, é muito importante estarem aqui, porque isso significa que vocês têm interesse em participar em actividades sociais. Vocês sabem que há países na Europa que elegeram este objectivo como um dos seus 4 ou 5 objectivos mais importantes. Eu fui convidado pelo Ministério das Finanças da Finlândia e estive a trabalhar com eles o mês passado, lá a participação cívica é um dos objectivos fundamentais.

Imaginação. Melhorar a administração e evitar o fatalismo nacional. Há bocadinho falávamos naquele livro que publiquei em conjunto com colegas e amigos “Reformar Portugal”. Eu agora se escrevesse um livro seria “Imaginar Portugal”. E acho que é muito importante que a vossa geração consiga fazer isso. E eu dou já aqui alguns exemplos daquilo que podia ser imaginar o nosso País. Já agora vou apresentar-lhes um bocadinho de ciência, digamos assim, que acho que é importante. A questão do desenvolvimento económico é uma questão central. Portanto, já viram, nós estamos numa rota de divergência, temos de saber se retomamos esse processo, de uma forma ou outra. Ao longo dos vossos próximos 30 anos, este problema do desenvolvimento pode estar presente. Portanto, eu acho que vale a pena, rapidamente, lembrar-vos estas ideias. O modelo tradicional do desenvolvimento é este: há mais dinheiro, há receitas. Com isso fazemos estradas, escolas, centros comerciais, cinemas, enfim, capital físico. Com esse capital, produzimos os recursos, produzimos bens a que estão associados serviços. Fecha-se o ciclo. Este é o ciclo antigo. O ciclo tradicional. De um modo geral ainda vos ensinam numas cadeiras de economia, nas folhas, nas disciplinas.

Porém, a sociedade actual funciona de outra forma. Acreditamos que a matéria-prima principal é a informação. Por isso é muito importante este tipo de eventos. Informação. Foi com isso que se mudou o mundo. A informação transforma-se em conhecimento. É muito diferente haver informação ou haver conhecimento. Todos nós conhecemos pessoas muito informadas, têm muitos dados, têm muitas estatísticas, mas não percebem bem as coisas. Conhecer é compreender. Por exemplo: vocês podem ter muitos dados sobre uma pessoa, mas não sabem como é que ele se comporta, não a conhecem. Eu digo: conheço bem aquela pessoa. Quando eu o digo, quero dizer que sei como se comporta: se eu lhe contar uma anedota, ele ofende-se ou não se ofende. Isso é que é conhecer. Compreender como funciona.

 

Depois tenho aplicação do conhecimento. Vocês sabem que também é muito diferente ter conhecimento ou ter aplicação. Por exemplo, as nossas Universidades muitas vezes têm conhecimento, mas são incapazes de o aplicar. Nem querem saber. Vocês têm o caso das velhas economias do Leste Europeu. Eu tive muitos contactos antes das alterações políticas, por exemplo, com a Polónia. Chegava-se lá e havia imenso conhecimento. Eram pessoas muitíssimo cultas, muitíssimo educadas. Mas a sociedade não era capaz de aplicar o conhecimento. E aquele modelo, aquele sistema extinguiu-se. Não correu bem. Uma coisa é conhecer, mas isto tem até que ser por vocês próprios. Em relação a uma disciplina que estão a estudar na Universidade, uma coisa é a informação: saber os problemas que o professor dá e que saem no teste ou que não saem, as folhas, os livros que se têm que estudar, que não têm que se estudar, etc; outra coisa é perceber a matéria, saber aplicar essa matéria. Acontece sabermos muito de um assunto, mas depois sai um problema e não somos capazes o resolver. São coisas diferentes.

A economia moderna baseia-se muito neste ciclo. Depois em redes de cooperação e inovação. Os mercados globalizados geram dinheiro, voltamos a ter informação. Este modelo de desenvolvimento é o grande desafio para o nosso País. Não é o outro. É este. O que acontece é que em termos de indicadores é fácil, hoje em dia, esquematizar, quantificar estas dimensões. Não vos vou maçar com esses indicadores (APRESENTAÇÃO EM POWER POINT), eu depois dou-vos fotocópias disto, um conjunto de indicadores, percentagem de pessoas que estão a estudar, empresas de tecnologias médias altas, etc, etc.

Nós estamos em competição com os outros. Só vale a pena ver se estamos bem ou mal, na comparação com os outros.

Depois temos a informação, temos o conhecimento, e a aplicação de conhecimentos. Estamos em escada descendente. Ou seja, onde estamos menos mal, ainda é no dinheiro. Já repararam? Passamos a vida a queixar, que não chega, e com razão. Mas é onde estamos menos mal. Vocês reparem que é extraordinária esta descida, não é? Parece que eu fabriquei estes dados, mas dou-vos a minha palavra de honra que são os dados das estatísticas, mas até parece um bocado mal, eu gostava que houvesse aqui mais irregularidades para não suspeitarem do analista. Mas é mesmo uma escadinha. Depois a Finlândia também é uma escada, mas ao contrário. Reparem que o rendimento, em relação à média europeia é evidentemente melhor do que o nosso. Não é terrivelmente melhor: ainda agora, no centro de Helsínquia, andei bastante por lá, o parque automóvel não é melhor do que o nosso, até acho que é pior. Tem muitos impostos sobre os combustíveis, os consumos, transporte individual, aquelas coisas todas, não se nota assim uma afluência muito maior do que a nossa. Mas depois, quando vamos para os outros indicadores é que há uma diferença abissal. Este vai ser o problema da vossa geração: tentar ver se passamos a mudar aquela escala.

Agora, ficava-me mal não falar nada sobre a Administração Pública. Já agora deixem-me dizer-vos o seguinte: o Instituto Nacional de Administração que dá pelo nome de INA, do qual sou o presidente, é um instituto espectacular. Se algum de vocês nos quiser visitar, são bem-vindos. Funcionamos no palácio dos marqueses de Pombal, que fica ali em Oeiras, perto do Centro Comercial de Oeiras, Carrefour, muito acessível, contactem-nos, são todos muito bem-vindos. É um palácio que foi construído pelo senhor Marquês de Pombal, cujo irmão era o Chefe do Estado Maior General das Forças Armadas e o outro irmão o chefe da Inquisição. Portanto, aí não haveria défice de concentração de poderes. Palácio muito bonito e nós, o INA, fazemos coisas interessantes e, enfim, estamos satisfeitos, porque na última comparação que houve a nível da UE, somos um dos 5 melhores institutos, a par do inglês, que é o SNPS, o francês, o holandês e eventualmente, um dos nórdicos. Foi uma classificação muito injusta, porque obviamente nós somos melhores do que os outros, mas enfim, vocês sabem esses problemas de votações, etc.

A questão da administração pode ter várias imagens. Por exemplo, eu acho engraçado este slide dali, porque é um slide que me faz lembrar muito as reuniões dos conselhos científicos, que eu tenho nas nossas universidades. Há uma certa liturgia religiosa e que é muito a imagem da administração. Há outros edifícios que fazemos na administração que são fundamentalmente uma escada que vai para cima, não sei se já repararam?! A ideia do céu. Portanto, a administração é o céu. Depois há outras imagens. A melhor é esta, a nossa página na Internet, www.ina.pt, não deixem de consultar, temos sempre novidades interessantes para vocês.

Grandes culturas. O problema da administração é um bocado aborrecido estar aqui a falar hoje sobre isso convosco, mas há grandes culturas na administração. A certa altura fui responsável por um projecto interessante: lançar uma escola de pós-graduações em gestão em Hong-Kong e Macau. Está a funcionar muito bem, foi um projecto durante 3 anos, muito interessante e descobri que na Ásia também há 4 grandes culturas de administração pública. Há a chinesa, que é a mais antiga de todas, há a japonesa, há a do sudoeste asiático, que hoje em dia é muito marcada, por Singapura e há a cultura indiana que é um cultura um bocadinho mais recatada. Na Europa nós temos a anglo-saxónica, a germânica, a latina e a escandinava.

Nós somos latinos, como é evidente. Como é que funcionamos em termos aplicação da lei, eficiência da justiça, cumprir ou não cumprir contratos, expropriação, corrupção? Houve um grupo de investigadores de várias instituições, espalhados pelo mundo, que fizeram essa análise. Vocês podem ver que a cultura latina saiu bastante mal. De facto, em boa verdade, saiu em último lugar. Aplicamos mal a lei, a nossa justiça não é realmente muito eficiente, não sei se já tinham dado por isso (RISOS). A corrupção também, apesar de tudo, gostamos de ir ajudando a resolver os problemas, não cumprimos os contratos, e de vez em quando, há umas expropriaçõezinhas. Os anglo-saxónicos ficaram muito desiludidos. Pensavam que apareciam no topo. Quem apareceu no topo foram os escandinavos. Isto é só para vos dizer que aquela administração pública que anda muito associada ao Estado, ao Poder, à não comparabilidade, acima do cidadão, acima de todos, aquela administração é culpada também, já está sujeita a esses marketings, etc.

Eu não resisti. Temos aqui estes slides. É uma coisa que, mais dia menos dia vai acontecer a cada um de vós: receberem um cheque que não é bom. Quando vocês ficaram satisfeitos porque venderam a mota, recebem um cheque e vão ao banco depositar o cheque e passados uns dias o banco diz: “tenho uma má notícia para si: o cheque não tem cobertura”. Outra situação é vocês, mais dia, menos dia, terem um apartamento ou uma casa e depois alugarem o apartamento e a pessoa deixar de pagar a renda. São duas situações que vos podem acontecer. Esta comparação é uma comparação variável que é: quanto tempo se leva, através do sistema da justiça, da máquina da administração, a resolver estes problemas? Em baixo têm os dias até se resolver o problema da cobrança do cheque e em cima o despejar o inquilino que deixou de pagar. Temos aqui os vários países. Nestas coisas também há sempre um aspecto positivo, há sempre uns piores do que nós. Portugal está aqui. Eu presumo que a Itália tenha outros mecanismos para resolver esses problemas (RISOS). Mas a Itália está ali numa posição um pouco duvidosa. Falando a sério, reparem, em relação aos outros países, há aqui as comparações que me preocupam. Por exemplo, Espanha está ali.

O turismo. Passamos a vida a falar que queremos investir no turismo. Os investidores do turismo são os mesmos do imobiliário. Os mesmos. Os mesmos produtos, as mesmas pessoas, os mesmos fundos. Eu se tiver que investir aqui em Castelo de Vide, ou ali em Badajoz, ao ver este gráfico penso: vou para Badajoz. Porque se o inquilino deixar de pagar a renda, eu levo metade do tempo do que em Portugal para resolver o problema. Estão a ver? Se também é um país latino, a justiça também é latina: porquê? Eu gostava muito que vocês ficassem com esta ideia: a vossa geração tem que interpelar o País em relação a estes problemas. Eu acho que nós devemos perguntar ao nosso Estado, aos nossos políticos, aos nossos dirigentes, desde o Presidente da República, ao juiz: porquê? Porque é que em Espanha leva metade do tempo a resolver o problema do que aqui? Já agora, hoje em dia, fala-se muito na questão da ruptura da justiça, mesmo os comentadores, mesmo o meu queridíssimo e estimadíssimo amigo Marcelo Rebelo de Sousa, quando fala na justiça, diz sempre que é preciso mais dinheiro. Então, eu aliás vou oferecer-lhe este slide que ele não deve conhecer: tenho 3 países - Portugal, Espanha e França. E temos o número de juízes por 100 mil habitantes. Em Portugal passámos de 12 para 14. Pode ser justificado, mas temos mais juízes por habitante do que Espanha e do que França. Mas se for tribunais, pior ainda. Temos um índice enorme. Vamos continuar a aumentar cada vez mais, juízes, juízes, juízes, tribunais. Não é uma questão de sistema, não é uma questão de estarmos a atafulhar os tribunais com coisas que não devíamos ter. Eu podia-vos contar muitas histórias, mas muitas até são realmente muito chocantes, neste início do dia, não seria talvez muito apropriado.

Os jovens e a administração pública. Preocupa-me muito a questão dos melhores talentos irem ou não servir os interesses públicos. Eu devo dizer, eu não tenho nada de neo-liberal e sou um entusiasta daquilo que se poderá chamar uma certa modernização, ou um certo renascer do interesse público. Acho que é muito bonito. Eu acho que é um conceito muito valioso. E por isso preocupa-me e estou interessado em que os melhores jovens, de uma forma ou de outra, estejam ligados ao interesse público. Fizemos um inquérito aos jovens e perguntámos: porque é que você não quer ir para a Administração Pública? Isto é um inquérito segmentado. Jovens já licenciados em pós-graduações, em princípio os melhores, a fazer mestrados. E a maior parte deles diz que é porque não há incentivos e compensação de dinheiro. Não é a questão do salário. Eu devo-vos dizer que mostrei este gráfico à Dra. Manuela Ferreira Leite e ela ficou felicíssima. Na 1ª parte, depois na 2ª parte, já não. (RISOS).

Agora, a palavra mais importante aqui de toda a manhã: “kiss”, eu ensino muito isto aos alunos de gestão, e penso que esta palavra vos fica no espírito, porque está associada a actividades que vocês gostam (RISOS). Vocês devem estar a pensar que eu enlouqueci definitivamente, porque no meio da apresentação aqui estou a dizer para se beijarem, mas realmente aqui “kiss” quer dizer keep it simple and short. É uma sigla internacional. Enfim, nas universidades americanas quando damos gestão, falamos sempre nisso: keep it simple and short, quer dizer: tentarmos ser sintéticos, objectivos, simples. Se eu não estiver a ser simples em relação a alguma coisa, é porque não sei bem essa coisa. A minha preocupação é tornar estes assuntos o mais simples possíveis. Qual é o paradigma do nosso País? (E isto agora é uma sigla minha, tem direitos de autor). MICO – make it complex and obscure. (RISOS). Se vocês repararem há muito essa cultura no nosso País, nos vossos professores, nas instituições. Na minha vida, nas actividades que tenho tido, nunca me aconteceu receber um parecer jurídico que começasse por dizer que era um problema simples. Não. Pelo contrário. Este problema é da maior complexidade. Somos um País que cultiva a complexidade. E depois torna-se tudo obscuro. Geralmente conclui que é necessário um segundo parecer. (RISOS). Mas isso é um problema de emprego, enfim, é respeitável. Mas fixem o Kiss. Pratiquem muito este lema porque ajudarão o País a ser um País mais simples e pragmático.

Pelo lado estratégico: temos que melhorar a formação que, como já vimos, temos piorado. Temos vontades e pessoas encantadoras. Eu tenho o privilégio de conhecer pessoalmente os ministros da educação desde há não sei quantos anos – até me pergunto próprio se não haverá um mau olhado nesse aspecto – e de ter relações pessoais da maior estima, pessoas muito interessantes que têm feito sistematicamente os maiores disparates. É um pouco como aquele aluno que sabe a matéria e depois chega ao exame e diz tudo ao contrário. O problema é que aqui é um exame que se prolonga por 8, 9 anos…

Depois o problema da descentralização. Eu realmente sou muito sensível a isso. Vocês sabem que na generalidade dos países da UE, mais de 50% da Administração Pública é descentralizada. Nós temos 90% centralizada. É um erro. Temos que criar uma nova cultura. Inovação, emprego e turismo.

O que é que eu aqui ainda gostava de vos dizer sem vos cansar muito? Qual é o nosso futuro? É muito difícil falar de futuro. Vocês sabem que de um modo geral as previsões são erradas. Mas há uma especialmente interessante para as pessoas de engenharia (quantos é que estão aqui de engenharia?) Portanto este é o engenheiro que disse: “as invenções atingiram o seu limite. Não tenho esperança que surjam novos desenvolvimentos”. O que é interessante é que isto foi dito há 2.000 anos, por um colega meu que é engenheiro civil, de Roma, eu sou de Lisboa. Portanto ele teve a consciência que tudo estava no máximo, mas não acertou.

Agora a vossa actividade. De dirigente político. “As mulheres sensatas e responsáveis não devem votar”. Esta frase, acreditem ou não, foi dita por um presidente dos Estados Unidos. Não foi o Bush. (RISOS). Foi o Cleveland. Mas também não foi há tanto tempo como isso, foi há 100 anos. Não sei se vocês, nas vossas academias da JSD, estudam história dos Estados Unidos, mas também é muito interessante. O Cleveland foi duas vezes presidente. A primeira vez correu muito bem. A segunda vez foi um desastre. Acabou com as cidades em manifestações, fogo, pancadaria, uma situação catastrófica. Mas ele assinou o decreto, a lei que permitiu à mulher americana poder votar. Mas quando assinou disse: “cuidado, eu estou a assinar isto, mas mulheres sensatas e responsáveis, espero que não votem”. Já agora ficam a saber que o primeiro país do Mundo que deu o direito de voto às mulheres foi a Nova Zelândia e o 2º foi a Finlândia.

Depois a nível do futuro, nós temos que resolver aqui alguns problemas. Aquele problema da escolarização, a percentagem de população que tem pelo menos o 12º ano. Já se sabe que Portugal está pior que os outros (a barra da esquerda é a de 95, a da direita é uma extrapolação que passa para 2015, mas admitindo que não temos a tese do cometa, porque se nós temos a tese do cometa, bom, isso então, desaparecemos ali do slide) mas o que é grave é se vocês compararem a distância entre Portugal e Espanha. Mesmo corrigindo o cometa, que é duvidoso, a nossa distância vai sendo cada vez maior. Novamente a história do francês, do inglês e do leão. Ou combinamos que os outros todos entram em estagnação, isso era bestial, se vocês descobrirem um processo em que se consegue haver um espécie de pacto de estagnação, vamos combinar que durante uns anos ninguém avança, isso é óptimo, talvez se consiga acompanhar o passo. Mas eu vejo exactamente o contrário. Esse é um dos problemas que temos de mudar.

Outra é a questão da assimetria regional. Vocês já repararam, por exemplo, Lisboa, (ainda por cima com a minha sigla, lvt), somos a região já com uma maioria bastante superior à média europeia, mas depois temos as outras muito atrasadas. O norte em declínio acentuado. O Alentejo também não melhorou muito. Temos o caso da Madeira evidentemente, portanto temos três ricos, chamemos-lhe assim, LVT, Algarve, Madeira e depois estes aqui, muito baixo, um País tão pequeno, com tantas assimetrias, não está bem. Não se justifica. Têm que ver se corrigem isto. Depois daqui a uns anos, vou-vos fazer uma entrevista a saber se corrigiram ou não.

Radiografia dos municípios. Os municípios são muito diferentes. Aqui têm o nível de ensino, portanto, os conhecimentos que as pessoas têm lá nos municípios e aqui a paridade do poder de compra. Estou a usar o princípio da economia do conhecimento. Não sou daquelas pessoas que falam em economia do conhecimento e depois quando comparam as regiões ou municípios ou países é só dinheiro. Não estou a cair nesse pecado. Esta análise é poucas vezes feita: saber o que é que sabemos e o que é que podemos comprar.

Há aqui uma lógica muito interessante que eu quero que vocês percebam. Este é o eixo do desenvolvimento muito baseado no rendimento. Este é o do conhecimento. São dois eixos diferentes. Já agora por curiosidade, até porque eu penso que é uma Câmara PSD, que pontinho será este aqui? Ou seja, com um capital humano um bocado sobre o baixo, mas claramente com maior poder de compra do que os que estão aqui nesta zona. Uma Câmara PSD, qual é? Esta não adivinham. São João da Madeira. É um caso muito especial. Podíamos estar aqui uma semana a partir daquele slide, mas não estamos. Isto depois quando se fazem as classes dos concelhos, somos realmente um País com muitas assimetrias e isso acho que tem de ser corrigido.

A nível educativo, eu costumo arreliar os chamados teóricos da educação com este gráfico. Tenho os concelhos classificados em conjuntos, em classes e depois tenho os resultados na matemática, que todos vocês gostam muito. Portanto, as médias das matemáticas no 12º ano. Porque é que eu gosto imenso de arreliar os ideólogos da educação com isto? Porque mostra que para as mesmas condições sócio-económicas as pessoas têm resultados muito diferentes. Portanto aquele paradigma marxista de dizer: não, esses têm resultados baixos porque são pobrezinhos e os ricos é que têm bons resultados. Aquela ideia do materialismo dialéctico em que se explica o fenómeno social à custa da variável monetária é negado aqui. Portanto, se o Marx estivesse vivo e visse este meu slide, mudava de ideias. (RISOS).

Mais a participação cívica. Este problema da inovação e do empreendedorismo é talvez um dos défices maiores das nossas universidades. Vocês aliás agora quando chegarem às vossas universidades podem perguntar: Qual é o espaço que me dão aqui para inovação e empreendedorismo? Ou ainda pensam que estão a ensinar um curso que eu depois, com um canudo, fico logo empregado? Na maior parte dos casos têm que ser vocês a inovar. Empreender. Inventar a vossa utilidade para a sociedade.

E voltamos à ideia do início. Gostarmos das pessoas. Aqueles casos de maior sucesso são de um modo geral de pessoas que gostam dos outros. Eu lembro-me sempre de um aluno que tive no Técnico que desaparecia de vez em quando, e eu perguntava-lhe o que é que ele ia fazer e ele dizia-me sempre que tinha tido uma ideia e que precisava de dinheiro, era uma pessoa sem dinheiro, com vários problemas económicos e ia ajudar a resolver esse problema, concretizando essa ideia. Com imenso sucesso e agora é obviamente um gestor com imenso sucesso. Mas lembro-me uma vez, era a questão das pizzas. Ele no Algarve descobriu uma zona em que as pessoas não conseguiam ter pizza em casa. Então ele arranjou um sistema lá com os amigos de motoreta. Nessa altura ainda não se usava muito esse sistema de distribuição de pizza. Fez imenso dinheiro com aquilo. Ou distribuir pão, ou falar com as pessoas. Vocês sabem que uma área de negócio que se faz em todas as sociedades e no nosso País também, é por exemplo, apoiar os velhos. E uma forma de apoiar os velhos, por exemplo, é visitá-los e falar com eles. Vocês podem dizer isso é muito chato, mas pode ser um trabalho. E bem pago. Eu já decidi não envelhecer enquanto vocês não montarem empresas com qualidade nesse sector.

Solução de problemas: uma vez ali no Técnico apareceu um daqueles escritos dos anarcas a dizer: “è melhor ser parte da solução do que do problema”. E eles têm razão. Gerar soluções em vez de problemas. E tenho aqui alguns exemplos para vocês. Têm a ver com a vossa vida e com a vossa actividade. Vamos aqui ver um facto concreto. A maior parte dos países europeus têm 25% de cada geração nos chamados diplomas de especialização. São cursos tipicamente de 2 anos. Acabam o ensino secundário, fazem esses cursos. Pode ser manutenção de computadores, controlo de qualidade, técnicas ambientais, gestão de florestas, etc. Porquê? Porque há muita gente que não tem paciência para fazer cursos longos e porque são muito necessários à sociedade. Nós não temos isso e depois temos aqui uma distorção importante. Muitas vezes essas pessoas em vez de fazerem esses cursos vão fazer cursos sobre arqueologia moderna, teoria da teoria sobre o ensino, etc, etc. e depois obviamente não têm emprego. Esta é uma ideia que pode ser interessante. A outra é a dos summer jobs.

O Summer Job é uma actividade que durante o Verão os jovens alunos podem fazer, recebem dinheiro e depois, na Páscoa, têm que fazer um curso de duas semanas. O summer Job pode ser, por exemplo, vigilante de floresta, para combater os incêndios, pode ser aqueles que vocês vêem naqueles filmes, aqueles com as meninas muito bonitas, salva-vidas, nas praias, etc, evitar que as meninas morram afogadas, ou os meninos, pode ser treinador de alunos, em desporto dos YMCAs, dessas coisas todas… Ora bom, qual é a vantagem disso? A vantagem disto é que 90% dos jovens no equivalente ao nosso 10º, 11º ano e fim da universidade, durante o verão têm um trabalho. No nosso país devíamos ter qualquer coisa como 400.000 jovens. Pelas minhas estatísticas, temos quanto muito, 4.000. Porque é que isto é muito mau? Porquê? Porque esses jovens podem fazer tarefas muito úteis e para eles é muito bom. Porque ganham dinheiro, socializam, têm uma excelente desculpa para não passar as férias com os pais, estão a salvar o país, portanto, é uma tarefa patriótica, convivem, divertem-se, conhecem o país, conhecem outras pessoas. É extremamente útil. Este caso do combate aos incêndios é um exemplo importante. Muitos países, por exemplo, os Estados Unidos, em regiões muito afectadas pelos incêndios, como é o caso da Califórnia, conseguiram reduzir drasticamente os incêndios, à custa dos jovens estudantes. Porquê? Porque têm a estratégia de tentarem combater o incêndio muito rapidamente. A teoria moderna é que são 30 minutos: temos 30 minutos para corrigir aquilo. Portanto têm uma rede de vigilantes muito eficiente, umas centenas de milhar de jovens a fazer isso e depois têm brigadas de intervenção rápida que conseguem apagar os incêndios no seu início.

Na Europa isso também já tem sido feito. Um caso muito importante é a Galiza. Quando eles introduziram um sistema semelhante (em 1990) com jovens estudantes espanhóis, brigadas de intervenção rápida, os fogos extinguiram.

Este fatalismo que há neste país, de dizer que tem havido sempre fogos, não há nada a fazer… É uma questão de mobilização. Aliás se vocês repararem, por exemplo, na Califórnia, vocês ainda têm incêndios. Não sei se já repararam, ocorrem agora no mês de Setembro, porquê? Porque as aulas começam a 28 de Agosto. Nos Estados Unidos hoje em dia a maior parte das aulas, em muitos Estados, começam a 25, a 28 de Agosto. Portanto, os jovens regressaram todos às universidades e deixámos de ter os fire watchers. É o período de maior risco para o combate aos incêndios, porque não têm os jovens.

Nós aqui não temos esse problema porque temos férias mais dilatadas. Mas portanto vocês estão a ver esta ideia de imaginar soluções? É evidente que a outra solução é dizer que é preciso mais funcionários públicos: o observador de 1ª, o observador de 2ª, o coordenador de observação, etc . Isto não é forma de resolver o problema.

Nestes últimos 5 minutos, gostava de vos deixar algumas ideias que podem ser úteis para a vossa universidade. A minha sugestão a nível de País e para a vossa geração: não admitirem que vão ser empregados dos outros, mas que vocês é que têm que criar a vossa própria dinâmica. A empresa já não é aquela custódia tradicional de recurso: tem que passar a ser um espaço de inovação. É a tal história do miúdo da pizza que se lembrou de satisfazer necessidades que não estavam satisfeitas, uma procura não satisfeita, arranjou uma solução que desse certo. Isto é o modelo de actividade na sociedade moderna. Isso significa que, vocês têm que ter outros talentos. Vocês neste momento estão a estudar várias matérias, vários assuntos, é tudo muito importante. Mas há aqui um conjunto de talentos e eu achei que tinha obrigação moral de vos falar, porque acima de tudo vale a pena chamar a atenção para certas coisas. Há um conjunto de talentos que são poucos, mas que vão ser essenciais no vosso sucesso.

Digo-vos isto com a maior convicção. Aqueles de vocês que, independentemente de serem bons médicos, bons engenheiros, bons economistas, bons juristas, penso que se vocês fixarem estes talentos, conseguirem desenvolvê-los, podem ter a certeza que vão ter um imensíssimo sucesso.

Primeiro a comunicar. A sociedade moderna baseia-se muito na comunicação. Eu acho escandaloso como é que continuamos a ter cursos nas universidades e as pessoas passam o curso todo sem ter de comunicar. Há cursos em que as pessoas passam o tempo todo, por exemplo, em ligação a um computador. Ou então a só fazer palavras escritas. Ou então só a entregar trabalhos. Portanto são soluções horríveis. Portanto, comunicar é muito importante.

Negociar. Negociação é fundamental. Como vivemos numa sociedade em rede, temos que encontrar equilíbrio nas trocas de uns com os outros. E estamos permanentemente em negociação.

Cooperar. Vocês sabem que realmente é uma crítica que se faz à nossa maneira de ser. Nós não gostamos muito de cooperar uns com os outros. Somos pouco cooperativos. E isso impõe-nos muitas diferenças. Eu fui consultor na Finlândia de um processo muito importante de negociação, não vou estar aqui agora a maçar-vos com isso, mas depois deixei de lá estar e perguntei-lhes como é que aquilo ia. Eles disseram: “aquilo está tudo a correr bem. Porém temos aqui uma dificuldade com os sindicatos, as empresas, a Nokia, temos aqui uma dificuldade”, “Então qual é?”, eles não queriam dizer, mas depois insisti muito e eles: “Estamos todos de acordo! Não há uma opinião diferente”. E eu fiquei a pensar. Pode ser uma oportunidade para os portugueses. Nós mandamos meia dúzia de portugueses e passado um mês já não há consenso nenhum, não é? Fiquei a pensar nisso. Eles estavam tristes, estavam todos de acordo uns com os outros. Portanto, nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Mas nós aqui, na questão da cooperação, por exemplo, é muito importante nas universidades, nas instituições onde trabalhamos, ter objectivos de equipa. Como há no desporto, não é? Os resultados do futebol são por equipa, não são por jogador. Ou são por jogador? São por equipa. Podíamos fazer somas de jogadores, mas não é isso que fazemos. A questão da cooperação.

Depois a questão da direcção. Vocês sabem que aquele problema todo do 25 de Abril, criou-nos um certo receio em relação à ideia da direcção. Não gostamos de dizer que somos um Director, por exemplo na universidade, em vez de ter um director de mestrado, dizemos que é um coordenador. Eu não sou nada coordenador, sou director. Estão a ver? Há solução de responsabilidade. Gostamos de organizar e de aprender.

Se vocês fixarem este hexágono, podem ter a certeza que vão ter imenso sucesso. Nós devemos sempre aprender. Eu, por exemplo, todos os anos, dedico pelo menos uma semana a ser aluno de um curso. Este ano estive a pensar o que é que ia fazer e escolhi um curso numa universidade nos Estados Unidos. Fui muito bom aluno. Éramos 110 e eu fui um dos melhores participantes e o tema era: “Como tratar com pessoas difíceis”. Achei que era um assunto com relevância aqui para o nosso País. Portanto, estes talentos são muito importantes. Não se esqueçam disso. Pode ser muito importante para o vosso sucesso.

As últimas duas imagens, São duas fotografias que eu acho bonitas. Isto é um albatroz. É uma fotografia tirada por um amigo meu, a um albatroz negro. É um albatroz que há naquela zona dos Estados Unidos. Vocês já viram isso nos filmes. Um albatroz é aquele pássaro pesado, dos desenhos animados, é muito difícil levantar voo. Vocês reparem nesta fotografia ele já está no ar e ainda está a correr. Já repararam as patas? Ele continua a correr, coitado. Andou não sei quantos metros para levantar voo e ainda ficou com aquele vício nas pernas de estar a correr. É muito difícil o take off.

O nosso país está com um problema complicado. Difícil o take off. Para cada um de vocês também é difícil o take off, iniciar a vida, etc. A boa notícia é que depois é muito bonito o albatroz a voar. Ou seja, Portugal pode ser melhor. Está bem? Ficamos por aqui. PALMAS

 

Jorge Nuno Sá – Presidente da JSD

Bem vamos começar agora as nossas perguntas. Certamente estão ansiosos, depois desta fantástica explanação e começamos hoje pelo grupo roxo e o 1º a intervir é o Mário Rui Santos.

 

Mário Rui Santos

Bom dia Eng. Valadares Tavares. Foi um prazer ouvi-lo discursar, tem o talento da palavra e tem uma grande capacidade de discurso e de exposição. Agradecer em nome da Universidade de Verão a sua presença que está a ser muito positiva e interessante. Fez uma grande análise do nosso País, a várias escalas, quer a escala europeia de que fazemos parte, quer à escala nacional e eu achei muito interessante. Recordo-me, antes de mais, de uma história que eu vi hoje na televisão que falava sobre assimetrias regionais no interior do país. Nós somos um país bipolarizado, com dois grandes centros urbanos e eu recordo-me, no interior do país de serem dados incentivos à fixação das pessoas. Havia um casal que tinha casado recentemente e o município tinha dado um incentivo à maternidade, um incentivo fiscal à fixação dessas pessoas. Pensei que seria útil dar incentivos a essas pessoas, só que o incentivo mais importante será o emprego, É isso que as pessoas procuram, porque é isso que elas precisam para sobreviver. É dinheiro, e dinheiro consegue-se com trabalho. Eu não acho que é correcto dar-se incentivos à maternidade ou à fixação das pessoas, mas dar incentivos ao trabalho.

Isto surge do ponto de vista da intervenção da administração pública, de haver muitos homens que vão para a administração pública. No litoral ou nas áreas metropolitanas isso é compreensível porque há emprego, há mais empresas privadas. No interior do país a desertificação é constante e há falta de empregos, há falta de empresas privadas que existam no interior.

A minha questão vai para esse ponto. Temos áreas tão diversas que se podem investir, tal como o turismo, como a indústria, com potencialidade no interior do país. Também somos um país tão pequenino, temos 600 Km de comprimento, no entanto temos dificuldades em fixar populações no interior do país. Tendo em conta que a população fugiu toda para o litoral. Quem vai estudar para as áreas metropolitanas fixa-se aí e raramente volta ao interior do País. Queria saber que medidas é que poderão ser apontadas para reduzir estas assimetrias regionais, incentivar a fixação regional da população, incentivar o emprego. Eu acho que parte tudo do emprego, apesar de haver institutos politécnicos e de haver universidades no interior, para a fixação da população. Mas haver esses incentivos não é suficiente. Para além das infraestruturas viárias que foram criadas para Castelo Branco, mas gostava de saber qual era a sua opinião e o que é que pode ser implementado para nós ultrapassarmos esta situação. Portugal não é só as áreas metropolitanas, é um país inteiro com 600 Km de comprimento. Obrigado.

 

Valadares Tavares

Muito obrigado. Eu julgo que esse é realmente um dos problemas centrais aqui do nosso País. Num país, de facto, com um território tão pequeno, como vamos evitar este desequilíbrio espantoso? De um lado a IC 19 e do outro lado um país vazio. Aliás deixem-me dizer-vos. Hoje de manhã, vim de Lisboa para aqui e realmente não encontrei ninguém. Portanto é a sensação de um país vazio. Eu gostava só de vos dizer o seguinte: Só há de facto uma solução - mais investimento e mais actividades nessas regiões. Esse debate foi um debate que vivemos muito, aliás numa altura em que o Carlos Coelho também tinha responsabilidades na educação, que foi a questão política do investimento no ensino superior. Vocês agora não fazem ideia, mas em 89, quando passámos a ter muito mais dinheiro, no PRODEP, investimento no ensino superior, havia correntes muito fortes que diziam assim: é preciso fundamentalmente investir em instituições em Lisboa e Porto e eventualmente Coimbra.

Porquê? Porque investir noutras escolas, noutros institutos fora deste eixo, “não dá eficácia, as pessoas não são tão boas, o melhor é investir aqui”. Eu defendi sempre a tese oposta. E foi muito difícil. A certa altura, lembro-me perfeitamente, em 90, salvo erro, numa reunião com o Primeiro-Ministro, Prof. Cavaco Silva, estavam essas duas tendências. Felizmente, em meu entender, ganhou aquela que eu defendia: que era preferível descentralizar a rede. Então investiu-se muito na Universidade de Vila Real, Bragança, Trás-os-Montes, Guarda, Faro, com imensos problemas, como é evidente e como é conhecido. Mas foi uma regionalização. Foi uma descentralização.

Eu julgo que se fizermos isso nas outras áreas de actividade, nomeadamente na actividade pública, turismo, ambiente, etc, começamos a colocar actividades nesse espaço. Então só há uma solução. É colocar pessoas, actividades e investimento. Não há outra receita. Aquilo que se fez em educação não foi feito nos outros sectores. Tem que passar a ser feito nos outros sectores.

 

Jorge Nuno Sá

Muito bem. Segunda pergunta, cabe ao grupo castanho ao Guilherme Bandeira.

 

Guilherme Bandeira

Bom dia. A minha pergunta é a seguinte: A avaliação do desempenho da administração pública, sobretudo a avaliação dos quadros dirigentes, é uma questão fundamental para se poder pôr em prática, no combate à ineficiência da administração pública. Quais os métodos de avaliação e que tipo de indicadores podem ser utilizados ou devem ser utilizados?

 

Valadares Tavares

Sim senhor, vocês estão já muito em sintonia com os problemas da gestão pública. Uma das originalidades do nosso país é que na administração pública, praticamente, não tem havido avaliação. Eu não resisto a contar o que me aconteceu quando fui director do GEP (Gabinete de Estudos e Planeamento do Ministério da Educação), passado uma semana chegou uma senhora sub-directora com uma pilha de fichas de avaliação dos meus 200 funcionários, e tinham todos praticamente 10. Eu tinha acabado de chegar do Técnico e disse: “isto não está bem. Todos 10, numa escala de 0 a 20?”. A senhora disse: “Não, isto é uma escala de 0 a 10!”. E reparei que havia uma senhora com 7. Eu obviamente só quis entrevistar essa senhora. Os outros tinham todos 10. Era uma senhora muito mais competente que os outros, tinha um doutoramento. Era detestada porque efectivamente tinha mau feitio – foi aí que eu realmente iniciei a minha formação de gestão de pessoas com mau feitio – e depois fez coisas extraordinárias de qualidade e de competência.

Portanto, temos sido até agora a única administração na União Europeia que não tem realmente um sistema de avaliação. Todas as administrações têm vindo a ter sistemas, têm vindo a melhorar. Aliás a própria Comissão Europeia. No último ano, ou dois anos, já tinha um bom sistema de avaliação, melhorou ainda esse sistema.

Mesmo assim, como vocês estão a ver, há esta reacção dos sindicatos, enfim das forças que estão em menos sintonia com isto. Mas é realmente uma questão fundamental.

Como é que se faz a avaliação? A avaliação, de um modo geral, faz-se em relação a objectivos – cada um de nós deve ter objectivos bem definidos, saber se os atingiu ou não atingiu – vocês devem fazer isso também em relação a vós próprios, na próxima semana qual é o vosso objectivo, de cada um de vocês? No fim da semana vêem se atingiram ou não. Competência, ou seja, capacidades, o que é que somos capazes de fazer? E depois, atitude.

De facto, estas são as três dimensões. É evidente, quando se tem funções dirigentes, além disso há uma fotografia muito importante. O que é que os outros pensam de nós? Por exemplo, eu sou presidente do INA. O ser avaliado deve basear-se muito naquilo que as pessoas que usam os serviços do INA, pensam do INA. Em cada curso, fazemos uma avaliação. Assim como vocês com certeza me vão avaliar, devem-no fazer, devem dar notas: foi melhor nisto, foi pior naquilo, cada aluno do meu Instituto chega ao fim e dá-nos umas notas. Se as notas estão, por exemplo, a piorar, o que é que o governo deve fazer em relação ao presidente do INA? Substituí-lo. O que eu vos digo é que estão a melhorar. Há aqui uma perspectiva muito importante que é a da avaliação externa. Isso já avançou? Não avançou e é muito difícil avançar, porque como sabem, no nosso país, as instituições detestam ser avaliadas. A escola detesta ser avaliada. Vocês lembrem-se que estão num país em que tivemos ministros da educação do governo socialista que choravam de raiva – penso que se pode dizer assim – quando pensavam que os resultados das escolas eram divulgados. Mas eles detestam. Houve um ministro que chegou a escrever ao Conselho Nacional da Educação que nem o Conselho Nacional de Educação podia dizer aqueles resultados que vos mostrei há bocadinho naquele slide. Segredo militar. Segredo nuclear. As instituições detestam ser avaliadas. Avaliar dirigentes tem de ser por aí.

 

Jorge Nuno Sá

3º grupo é o grupo azul e é a Eduarda Coelho que coloca a questão.

 

Eduarda Coelho

Bom dia senhor professor. Eu gostava de fazer uma pergunta que está relacionada também com as diferenças e as assimetrias que existem a nível do nosso país, entre o interior e o litoral, principalmente. E também pegando um bocadinho na história do inglês, do francês e do leão, era saber qual é que acha que seria o impacto da exclusão do nosso país face à localização periférica dentro da Europa e à importância dos acessos e da facilidade de intercâmbios. Qual é que seria o impacto da exclusão do nosso país de uma eventual rede TGV na península ibérica.

 

Valadares Tavares

Portanto a questão das assimetrias agora pôs-se mais em termos de periferia, em relação à Europa. Aí é evidente que não vale a pena esconder que na medida em que a União Europeia se expandiu para leste, nós ficámos mais periféricos. Em relação ao centro da Europa, neste momento, somos mais periféricos do que éramos há 10 anos atrás. É inevitável. Quando falei do caso da Finlândia foi exactamente por causa disso. É que a Finlândia também é muito periférica mas são os líderes mundiais em telemóveis, são os líderes mundiais em recuperação de navios e transformá-los em paquetes de cruzeiros, são os líderes mundiais em equipamento para tratamento de madeiras, florestas, etc. e proximamente serão líderes mundiais num sector ligado mais às biotecnologias que está neste momento em desenvolvimento.

O facto de sermos periféricos não quer dizer que não possamos ser os melhores. Isso hoje em dia é mais fácil com a economia do conhecimento, porquê? Porque temos a Internet. Não sei se vocês já repararam que a distância na Internet mede-se pelos cliques do computador. E tanto faz a empresa estar na Nova Zelândia ou estar em Lisboa, ou estar em Madrid, esses contactos são mais fáceis de estabelecer. Isso também significa que temos que ter boas ligações ao resto da Europa, bons aeroportos, boas redes ferroviárias, etc.

Quanto à solução específica do TGV. É um problema que tem sido muito estudado. Eu julgo que neste momento tem que se ter sempre um certo cuidado entre aquilo que é útil e aquilo que é possível, em termos de custo. As fiabilizações apontam para uma ligação, que ligue as duas capitais, Lisboa-Madrid. Agora se me perguntarem se isso vai ser crítico para o nosso desenvolvimento nos próximos anos, tenho imensas dúvidas. Será mais crítico, por exemplo, nós aprendermos a exportar, termos empresas que ajudem a exportar os nossos produtos, o que não tem acontecido. Portanto é com certeza um desenvolvimento natural, mais cedo ou mais tarde com certeza que vamos ter: nos próximos anos penso que se justifica uma ligação. Mas não é crítico. A Finlândia não tem TGV e vive felicíssima, não é?

Convém não transpor os nossos problemas para os objectos. Quer dizer eu não estou a exportar mais, como sabem as exportações também estão em declínio. Já agora uma recordação importante, eu não estou a exportar mais mas não é por não haver TGV. Eu não estou a exportar mais, porque ainda não descobri que uma forma de exportar é fazer uma empresa nos mercados de referência para ajudar a colocar os meus produtos. Nunca se fez ainda isto. Eu não estou a exportar mais por causa disso. Vocês não vão estudar para Inglaterra, ou para França ou para a Finlândia por não haver TGV.

Agora, é com certeza um desenvolvimento natural importante, tem que haver aí um certo cuidado para não ser mais uma fonte de despesa pública por depois não ser viável. Em termos de análise de viabilidade, penso que nos próximos anos, mais cedo ou mais tarde, haverá viabilidade para uma ligação. Não 4 ou 5 ligações. Não uma ligação em Vigo, outra ligação na linha do Vouga, outra ligação na linha do Tejo, outra ligação por Sevilha. Com certeza que não. Nos próximos anos haverá com certeza alguma hipótese de desenvolvimento.

 

Jorge Nuno Sá

Luís Cardoso – grupo cinzento.

 

Luís Cardoso

Muito bom dia. O grupo cinzento gostaria de lhe dar as boas vindas à Universidade de Verão e sobretudo dar-lhe os parabéns pelo magnífico retrato que fez do nosso País porque acho que saímos daqui mesmo com uma noção exacta do que Portugal evoluiu, ou melhor, andou para trás nos últimos anos.

Quanto à nossa questão centra-se um pouco na comparação entre o litoral e o interior, mas noutro sentido. Isto é, por exemplo, aqui para Castelo de Vide, passámos por excelentes acessibilidades, como referiu há bocado; mas vimos pelo caminho que não tínhamos nada de concreto, não tínhamos cidades, poucas indústrias tínhamos. Como referiu há pouco, urge transferir o conhecimento do know-how para o interior, mas pegando numas palavras que ouvimos há pouco tempo de um grande senhor que é o José António Saraiva, porque não a transferência da capital do litoral para o interior?; porque não pegar no exemplo do Brasil, que transferiu do Rio de Janeiro para Brasília e actualmente o interior está-se a desenvolver; porque não pegar no exemplo futuro de Pequim, já que damos tantas vezes o exemplo asiático?; porque não pensar que podemos fazer algo diferente e deixarmos de pensar que só daqui a 20 anos é que vamos fazer algo com o interior, quando podemos ter uma noção exacta de que é agora que temos que agir e sobretudo fazer algo para o nosso País?

 

Valadares Tavares

Eu acho que essa questão, é uma questão muito interessante, e deixem-me aqui ser muito honesto convosco: este assunto que não está bem estudado. É um assunto que realmente devíamos ter pessoas a estudar, mas não está estudado. Que é o seguinte: a economia moderna e muito especialmente aquele tipo de modelo que eu vos falei da economia de conhecimento, baseia-se em cluster de actividades, ou seja, se tu fores sozinho para um sítio qualquer, viver, pensas assim “eu vou descentralizar, vou viver para Serpa e vou montar lá o meu consultório”. Passados uns tempos fechas o consultório e vais-te embora. Ou seja, nós só conseguimos viabilizar sustentabilidade e desenvolvimento em cluster, actividades inter-conexas.

A questão que pões é uma questão muito importante: o que é que eu posso passar para o interior? Tu quando dizes a capital – hoje em dia há várias capitais – há uma capital, por exemplo do ensino, há uma capital da saúde, há uma capital dos negócios, há uma capital política com os ministérios, etc., há várias capitais. Eu concordo contigo. Acho que era interessante pegar numa dessas capitais, não sei exactamente qual, mas numa dessas, ou em mais do que uma e colocá-la fora. Por exemplo, aquela ideia por exemplo que eu vos dei do cluster da imaginação, criatividade, multimédia, inter-actividade, software, informática, esse cluster é uma capital que podíamos pôr e devemos pôr com certeza nalguma zona do País e que não é Lisboa. O que está a acontecer com Lisboa é que tem quase todas as capitais em cima. Até a do ensino. Vocês sabem quantos jovens do ensino superior andam em Lisboa diariamente? (Não digo nas aulas. Porque obviamente há outras coisas para fazer mais importantes). Andam por lá, (encontramos nos cafés, nos cinemas, nos museus, na 24 de Julho, etc), esses sítios todos somados, quantos é que há por dia em média? Cem mil! Em que 40 mil é ensino superior privado e 60 mil ensino superior público. Portanto, a capital universitária neste momento é Lisboa. Em termos de dimensão. É bom? Posso dizer que não.

Eu concordo com a tua ideia. Agora, se me perguntares: “quais são essas prioridades?”, esse estudo não está feito. Mas tínhamos que escolher – é um problema político – tínhamos que escolher umas quantas capitais para saltar fora. Agora, concretamente a capital política dos ministérios e tal, será a melhor solução? Eu essa não sei se é muito importante. Há casos na Europa, não o conjunto, mas por exemplo um ministério que foi posto fora da cidade mais importante, etc., mas também não funcionou terrivelmente bem.

Agora há outras capitais que geram mais actividade que os ministérios. As tecnologias, a criatividade, a inovação, o multimédia, etc., geram mais actividade.

 

Jorge Nuno Sá

Muito bem. Agora é o grupo rosa a colocar a questão e é o Nelson Coutinho.

 

Nelson Coutinho

Bom dia Professor Valadares Tavares. Há pouco falou-nos do Portugal, cuja sua radiografia é de um país doente, mas com potencialidade para ser saudável. A questão que o grupo rosa tem para lhe colocar é se acha que Portugal algum dia poderá ter uma economia competitiva em relação aos outros países da Europa, visto que neste momento temos um atraso estrutural significativo.

 

Valadares Tavares

Bom, vamos lá a ver. A minha resposta é que sim. Aliás é que sim, até porque tem que ser que sim. Porque reparem, nós estamos numa corrida, onde ou conseguimos ser competitivos ou então vamos para a tese do cometa, que é dirigimo-nos para um país que não é exactamente o nosso modelo de desenvolvimento.

Agora, o que tu podes dizer é o seguinte: “mas segundo os dados que nos apresentou, isto vai de mal a pior!”. Aí é boa notícia. É que nós muitas vezes, quando temos condições desfavoráveis mas a certa altura nos mobilizamos para um certo objectivo, conseguimos ter sucesso. Vocês já reparam que até no desporto isso acontece. Muitas vezes, quando ninguém dá muito por nós, como aconteceu ainda há pouco tempo nos Jogos Olímpicos, nós temos uma arrancada no fim que conseguimos passar à frente.

Portanto, nós somos particularmente bons numa certa improvisação, numa certa ultrapassagem das nossas próprias limitações. Simplesmente isso implica estarmos mobilizados para esse objectivo.

Portanto a dúvida que eu tenho e essa é a confissão que eu te faço, não é se nós somos capazes ou não. Respondendo à tua pergunta a minha resposta é que sim, embora todos os indicadores sejam contra, estão a ver? É um bocadinho como o Churchill quando dizia: “toda a gente está convencida que vamos perder a guerra, a boa notícia é que vamos ganhar”. Eu aí não tenho dúvidas. Agora a dúvida que tenho é que para essa resposta se concretizar temos que ter uma grande mobilização nacional. Quando temos essa mobilização, conseguimos. Conseguimos na integração na União Europeia, conseguimos no Euro. Conseguimos.

Agora, haverá essa mobilização nacional? Haverá esse esclarecimento? Esse consenso nacional sobre esse desafio? Essa é que é a dúvida e aí é que vocês podem ajudar a que esse consenso exista e que essa consciência exista.

 

Jorge Nuno Sá

Muito bem. Grupo amarelo, agora. É o Ricardo Lopes.

 

Ricardo Lopes

Bom dia Professor. Em nome do grupo amarelo, desejo-lhe as boas vindas. Nós ontem quando preparávamos esta temática para hoje, deparámo-nos com um artigo de opinião do “Público”, datado de 23 de Janeiro, aquando das manifestações da CGTP, em que disse que os problemas que advinham de um aumento da função pública vinham da governação do Eng. Guterres. Mas disse que estávamos a melhorar. E eu passo a citar: “Na semana passada publicaram-se 3 Leis notáveis que irão quebrar com o conservadorismo nacional, exigir novos níveis de transparência, prestação de contas e de qualidade da administração pública”.

A nossa dúvida é: serão suficientes e estarão a ser aplicadas estas leis?

 

Valadares Tavares

Evidente que vocês têm toda a razão, quando fazem essa pergunta. Portanto, houve um trabalho que me pareceu muito importante, eu fiquei muito satisfeito por ter sido entrevistado nessa altura, altura ideal para ser entrevistado, porque realmente a legislação tinha sido publicada e ainda não havia o tal tempo de saber se estava a ser aplicada ou não, não é? Portanto foi o momento ideal para dar essa entrevista. E é realmente um quadro legal bem feito, interessante, moderno, em sintonia com o que se está a fazer.

A dúvida que vocês põem tem toda a razão. Será que o nosso País, por exemplo, aceita o desafio que, há bocadinho o vosso amigo falava, de sermos avaliados? Os directores gerais aceitam? Os directores de escola, os reitores, os directores de faculdades? Portanto, as pessoas aceitam este novo clima de exigência, transparência?

Por exemplo, ao nível dos empreendimentos, eu discuti isso com o senhor Ministro das Obras Públicas a semana passada, porque é que nós não havemos de ter na Internet uma estatística com o custo previsto inicial para uma obra e o custo final? O tempo inicial e o tempo final. Estão a ver? Portanto, são reptos muito exigentes e portanto quando tu perguntas se está a ser aplicado, se está a ser suficiente, com certeza que não é suficiente. Portanto, a lei é importante, mas é uma condição, não é suficiente. Agora quando perguntam se está a ser aplicado, eu diria muito timidamente, com muita timidez, com muito respeito humano, com muito receio de incomodar alguém. Não sei se vocês já repararam, mas os portugueses muitas vezes, a passarmos as portas, somos complicados. Temos aquelas cerimónias sempre de dizer “faz favor”, “com licença”. Sabem que até internacionalmente, por exemplo em Bruxelas, se diz, quando se vêem umas pessoas a passar uma porta, a fazer muita cerimónia, para ser o outro a passar é porque é um português.

Nós aí somos curiosos, quer dizer porque a impressão que eu tenho é que há intenção de aplicar, mas é uma intenção com muita timidez e acho que aqui é um sentimento que não é bom. Acho que não devemos ser tímidos e portanto aí, realmente estou preocupado. Enfim, sou optimista, mas estou preocupado.

 

Jorge Nuno Sá

Próxima questão é para o grupo laranja e é o Miguel Mendes.

 

Miguel Mendes

Professor, os meus respeitosos cumprimentos e em nome do grupo laranja, gostaria de lhe fazer a seguinte questão. No entanto antes de lhe fazer a pergunta concreta, permita-me ler uma pequena citação proferida no início deste ano por um político, falando precisamente sobre a radiografia de Portugal. E esse político diz-nos o seguinte: “O dinheiro fácil, o laxismo e uma certa falta de rigor, tem minado a atmosfera do País. Precisamos de um novo sobressalto no melhor sentido do termo, maiores energias partidárias, maior empenhamento dos responsáveis políticos a começar naturalmente por mim”. E depois formula a seguinte questão: “Ponho todos os dias esta pergunta. O que é que poderemos fazer mais?” Ora este comentário foi do Presidente da República, Dr. Jorge Sampaio. Penso que é uma questão extremamente pertinente e actual, ou seja, o que é que todos nós portugueses, como sociedade, como colectivo, poderemos fazer por Portugal e gostaria que articulasse a sua resposta com um ponto que deixou em aberto no artigo de opinião publicado pelo Professor no “Diário Económico” em 1 de Setembro deste ano que tinha como título “Cavalo de Tróia” que fala da internacionalização da economia portuguesa, da imagem de Portugal.

Ou seja, a minha questão articulada com esta é: Quais é que são os sectores estratégicos que Portugal deve apostar sobretudo para potenciar o nosso crescimento económico e melhorar a qualidade de vida dos portugueses? Muito obrigado.

 

Valadares Tavares

Vamos lá a ver. Eu penso que realmente há aí um início de questão muito importante, que é: vocês não tomarem uma atitude passiva, tomarem uma atitude pró-activa. Os portugueses não devem estar sempre à espera que seja o Estado a resolver ou a criar condições – aquela frase “não criaram condições” – mas pelo contrário, a cultura moderna e a sociedade moderna baseia-se muito nas iniciativas que cada um de nós tem que ter, que cada um de vocês tem que ter em toda a vida, quer dizer, acho que até morrer temos que estar nessa situação.

A segunda questão é a questão relacionada com essa questão das prioridades. Vocês sabem que um dos problemas que há no nosso país é que de facto nunca há prioridades. Tudo é prioritário. Em termos das ciências políticas, vocês agora chamam a isso, all inclusive policy, quer dizer há sempre tudo, quer dizer é tudo sempre prioritário. Isso significa não escolher. O que é péssimo. Nesse artigo, defendi e defendo a ideia que nós a nível de apoios e de políticas de Estado, devemo-nos concentrar num número reduzido de casos. Por exemplo, na agricultura há um conjunto de produtos em que nós realmente podemos incidir, desde as flores ao vinho, portanto há aí uma fileira que realmente podemos ter bastante sucesso e aliás há bastantes estrangeiros no nosso País a ter sucesso nesse sector.

Depois temos o caso da indústria, mais indústria propriamente dita, onde temos toda a área dos moldes e dos vidros, cristais que também são áreas realmente importantes. Há uma dúvida mais ou menos antiga que é a questão do papel, que conseguimos passar da simples produção de papel para produtos com mais valor acrescentado.

Temos o turismo. Temos o multimédia, áreas de informática e acredito que possa haver aqui um espaço específico para serviços especializados de terceira idade. Vocês sabem que há muitos estrangeiros de terceira idade que querem vir para Portugal e isto corresponde a uma indústria de muito sucesso. Portanto, isto dá (mais coisa menos coisa) as tais sete áreas.

Eu defendo que devíamos incidir nesses e em vez de andarmos a fazer concursos onde aparece de tudo um pouco, devíamos incidir os nossos apoios sobre esses vectores. E dá uma imagem correcta do País.

Eu não resisto a contar-vos um episódio que se passou comigo. Eu estava em Hong-Kong, justamente naquele trabalho que vos referi há bocadinho, e estava a trabalhar com um amigo meu chinês que nunca tinha vindo a Portugal. Chinês de Hong-Kong. E eu tinha o catálogo do ICEP. E portanto, naturalmente disse-lhe: Olhe, tenho aqui um catálogo. E ele começou a folhear o catálogo. Isto foi em 97. E começou a gostar imenso. E eu disse: Então, mas você nunca foi a Portugal? Não, não fui, mas hei-de ir. Realmente giríssimo, deve ser interessantíssimo. E depois acabou de ler o catálogo e disse: Sabe nunca fui, mas o vosso país deve ser muito parecido com outro país que eu visitei. Então qual é? A Tunísia. Estão a ver? Nós muitas vezes damos uma imagem desfocada. E nós não somos a Tunísia. A Tunísia não tem um laboratório de engenharia civil; a Tunísia não tem algumas universidades como nós temos; a Tunísia não tem indústria de moldes, não tem muitas outras coisas, não tem aeroespacial, não tem componentes automóveis, estão a ver? Portanto, nós muitas vezes temos dado a imagem de Portugal ser um país das praias, mulheres bonitas, de vinho e de um turismo serôdio, o Pais não é isso. Portanto a propósito do “Cavalo de Tróia”, a primeira coisa é deixar de desfocar a fotografia do País. Devo dizer que isso se mantém. Se vocês virem os catálogos do País, contrasta, com a imagem que a Espanha divulga.

Eu estava em Nova Iorque há pouco tempo, quando o “New York Times” tinha uma página inteira paga pelo governo de Espanha. Estão a ver o “New York Times”? Aquele jornal grande. Uma página inteira. E ¾ da página era sobre tecnologia espanhola. O Seat, indústria espacial, etc. Eu não sabia, fiquei a saber, que Sevilha é o 4º centro aeroespacial na UE. ¾ da página era tudo tecnologia, know-how, hiper avanço de Espanha. E depois tinha um bocadinho em baixo que dizia assim: mas você ao fim de isto tudo deve ficar cansado. Também temos umas praias e umas pousadas, tudo isso é muito simpático.

Há aqui um problema de imagem que infelizmente não tem sido bem gerido.

 

Jorge Nuno Sá

Próxima questão é para o grupo verde e é o Jorge Jacinto que a coloca.

 

Jorge Jacinto

Muito bom dia a todos. Senhor professor, gostámos bastante. O grupo verde ficou bastante agradado com o nome de Valadares Tavares, porque temos a certeza que, com mais 19 Valadares Tavares no nosso País, não havia cá Irlandas, nem Finlândias que andassem a competir connosco.

Também fiquei contente, eu pessoalmente, porque parece que o crescimento anual do PIB começou em 77. Se quiser meter a data precisa é o 14 de Abril, eu nasci no dia 14: o meu contributo ao País para o crescimento anual do PIB (RISOS).

A nossa pergunta e porque somos os verdes, vai centrada para um aspecto que nos preocupa particularmente. Floresta, incêndios florestais. O ano passado entrou também na casa de todos, na sua casa houve um aparelho sempre a arder constantemente, muitas vezes era o mesmo fogo passado em várias perspectivas, e aquilo que nos preocupou é que este ano, quem deu a ajuda para não arder foi S. Pedro. S. Pedro foi o principal responsável. Não foram os incentivos que houve à floresta e à prevenção. E foi espectacular essa apresentação. Foi na minha terra, Proença-a-Nova. Houve aviões, houve bombeiros. Espectacular! Uma coisa digna de um filme do melhor. Portanto, não ia nada arder. Mas o facto é que ardeu.

A nossa pergunta centra-se no seguinte: 1º, porque eu acho que gosta de perguntas difíceis, se fosse o senhor que tivesse que decidir, decidiria que iriam ser guardados ou, iriam ser facultados Toyotas Yaris para guardar a nossa floresta, portanto esta foi uma medida de 2004, queria-lhe perguntar a sua opinião.

E 2º a floresta que temos, que não temos, qual era na sua opinião a melhor solução para reflorestar ou não, com o quê? Porque a floresta é da riqueza maior que nós temos no País, mas principalmente no distrito de Castelo Branco, o meu distrito. É um distrito brutalmente assassinado e que precisamos de uma solução que até hoje ainda não vi. Gostava então da sua opinião.

 

Valadares Tavares

Oiçam. Eu acho que esse problema dos incêndios é tão importante que, embora tivéssemos aqui apenas um tempo escasso para que falasse convosco sobre o nosso País, achei que vos devia chamar a atenção para esse problema. Portanto o incêndio é realmente um problema essencial ao nosso País. É um problema de segurança, de defesa do nosso País.

Vocês reparem que, eu mostrei-vos o gráfico da Galiza, podia-vos mostrar outro, há outro, por exemplo, de experiência desse tipo no sul de França, em que as incidências caem terrivelmente. E não é de facto com grandes aparatos que se vai lá. Hoje em dia eu julgo que há consenso internacional em relação a isso. A forma de combater os incêndios é, obviamente, pela prevenção. Ter as matas, os caminhos desimpedidos, etc. Há até uma regra que os autores da especialidade recomendam que é gastar pelo menos metade em prevenção, portanto quando se gasta em prevenção menos de metade do total é mau. E depois ter fundamentalmente sistemas de detecção e de combate muito rápido. Ou seja, aí é que é muito importante ter a tal rede de vigilantes para os quais devíamo-nos mobilizar, designadamente os jovens deste País, termos 100 ou 200 mil jovens nessa actividade.

A detecção. Depois comunicação. Hoje em dia isso é muito fácil. Há sistemas de comunicação muito rápidos e ter brigadas de intervenção que combatem os incêndios nos primeiros 20, 30 minutos. Há autores que dizem que são os 15, 20 minutos, há outros que dizem que são os 30 minutos. Portanto, é uma estratégia, de certa forma, oposta daquela que tem sido adoptada.

A estratégia que tem sido adoptada tem sido a dos meios pesados. O grande avião ou o grande sistema, o que pressupõe sempre que eu não sou capaz de combater o mal à nascença. Tem sido em meu entender realmente uma estratégia errada e com maus resultados. Mas, mais cedo ou mais tarde, é natural que o País se aperceba disso e que corrija.

Combater incêndios. Aliás há um amigo meu americano que é especializado nessa área que diz: combater incêndios é a mesma coisa que combater enfartes cardíacos. Tem que ser muito rapidamente nos primeiros minutos. Caso contrário, não há nada a fazer.

 

Jorge Nuno Sá

Nona pergunta é para o grupo bege e é a Sandra que a coloca.

 

Sandra Ribeiro

Muito bom dia sr. Professor. Muito bom dia a todos. Os meus colegas já o disseram, mas acho que não é demais repetir, que tivemos aqui uma das melhores apresentações destes dias da Universidade de Verão 2004. Eu penso que todos estaremos de acordo com isso e por isso estamos muito satisfeitos por o termos aqui.

Em 2º lugar eu gostaria de salientar uma coisa que para mim foi particularmente interessante, que foi dizer que, num País em que a auto-estima que está em baixo, gostei muito de ouvir que realmente considera, eu também considero isso – já tinha feito essa análise – que os portugueses quando querem podem ser tão bons ou melhores do que os outros.

Então a minha pergunta vem na sequência disto. Se nós podemos ser tão bons ou melhores do que os outros, porque é que os nossos licenciados, os nossos melhores quadros não conseguem obter o seu emprego? Porque nós temos 40 mil licenciados desempregados. Será a falta de ligação entre universidades e empresas? Há muitas justificações para isto, mas realmente nós não conseguimos resolver este problema, que nos afecta particularmente. Estamos aqui numa assembleia de jovens e não poderia deixar de focar esta questão.

Uma outra questão, já agora. Falou-se aqui nos clusters, nós falamos muito em sectores estratégicos para Portugal, e a verdade é que realmente nunca vemos também nessa matéria grandes avanços. Será que, por exemplo, o cluster da aeronáutica em Beja tinha possibilidades de arrancar, de avançar, portanto um cluster ligado às novas tecnologias? Obrigada pela atenção.

 

Valadares Tavares

É evidente que vocês estão preocupados e estamos todos preocupados com esse problema que é um problema fundamental, que é a questão do emprego. Andará na casa dos 45 mil jovens, que não têm emprego. Isso resulta muito do seguinte: a sociedade moderna tem um conjunto de necessidades. O emprego corresponde à resposta a essas necessidades.

Quando nós começamos a certa altura a fazer qualificações muito afastadas dessas necessidades, começamos a ter este tipo de problema. Vocês sabem que há muitas dessas pessoas que correspondem a cursos, por exemplo, das ciências de educação, formação de professores. Eu não vos apresentei esse dado, mas a nível de toda a OCDE, toda a OCDE, somos o País que em termos de ratio, tem menos alunos do ensino básico e secundário por professor. Não quer dizer que estejam bem distribuídos, nem estejam bem colocados. Aliás ainda não devem estar colocados a esta hora, mas mais cedo ou mais tarde vão acabar por ficar colocados.

Mas, se nós continuarmos a formar pessoas em perfis, em licenciaturas onde já há excesso, aí começo a ter mais desempregados. Neste momento eu devo ter qualquer coisa como 300 licenciaturas em educação, neste País. Se multiplicarem por 30, número médio de pessoas que entram por ano, estaríamos na casa dos 10 mil licenciados por ano. 10 mil licenciados que não são absorvidos pelo mercado de emprego. Simplesmente, o problema maior é que estas licenciaturas que se têm vindo a desenvolver no nosso País, podiam dar um conjunto de formações e de capacidades, que as pessoas diziam: “fiz educação, está bem, não vou para professor mas tenho capacidade para fazer x, y e z”. Mas aí é que não aparece x, y e z. Eu diria, em duas palavras, que esse desemprego resulta muito principalmente da miopia ou até da utopia ou da indiferença dos nossos responsáveis do ensino superior em relação à formação que estão a oferecer.

Agora também temos aquele problema dos diplomas de especialização, da tal formação mais curta, que é muito importante em todos os países. No nosso país quase não há. É um erro muito grande. Por outro lado, este problema é resolúvel. Deixem-me contar uma experiência que eu tive na Universidade Católica. Durante muitos anos, preocupei-me imenso com esse problema e isto passou-se até numa paróquia da cidade de Lisboa: uma vez tive uma reunião com jovens, como vós, eram 10 jovens e vários estavam no desemprego. Um deles estava no desemprego há 4 anos. É uma coisa realmente traumática. Eu fui para casa, pensei, tenho que fazer qualquer coisa. E propus um curso de 6 meses de informação e decisão na empresa. Portanto uma matéria muito horizontal. Dá para pessoas que venham de sociologia, mas também dá para os que vieram de engenharia, de direito. Informação e decisão na empresa. Um curso de 6 meses. Vocês acreditem ou não, houve as dificuldades habituais, mas depois toda a gente achou que era uma ideia óptima e tive uns financiamentos, etc. – isto, aliás deixem-me dizer-vos que isto geralmente se consegue. Eu nunca deixei de fazer nada no nosso País por não haver financiamento. Mesmo desde o 14 de Abril – nasceste a 14 de Abril de 77, não foi? – mesmo desde o 14 de Abril de 77, nunca se deixou de fazer qualquer coisa por não haver dinheiro, consegue-se sempre. E portanto fizemos esse curso. Nesse curso seleccionámos 50 desempregados que já estavam há mais de 2 anos no desemprego, licenciados. Fez-se o curso. Correu muito bem. Todos eles ficaram colocados.

Portanto, vocês reparem, eu fiquei aqui com uma dúvida, quer dizer, se calhar há aqui uma questão de um clique. As universidades continuam a não ensinar certas coisas essenciais ao mercado de trabalho. Por exemplo, essas pessoas ficaram a saber funcionar com Access, para fazer uma base de dados lá na empresa, não sabiam. Muitos deles nunca tinham mexido com um computador, tudo isto depois passou-se não chegou a 6 meses, foi 4 meses e qualquer coisa. Então será que eu consigo pegar nesses 40 mil e recolocá-los? Como sabem é uma das intenções do actual Governo e parece-me que meritória, a minha colega do Técnico é Ministra do Ensino Superior, realmente tem que se fazer aí qualquer coisa. Se calhar dizem: mas isso funcionou com os seus 60. Mas para os 40 mil já não dá. Não sei. Se calhar tem que dar outras coisas, tem que se inventar outras coisas. Portanto é um problema resolúvel. Eu participei há poucas semanas num debate muito concorrido numa faculdade de ciências humanas, departamento de história, em que os responsáveis me diziam que não estavam minimamente interessados nesse problema. A escola não tinha nada a ver com esse problema. Não são uma agência de emprego, como foi usada a expressão pelo director do departamento. Assim não. Assim não conseguimos funcionar.

Agora, há um problema tão grave como esse, que é a desistência no ensino superior. Vocês sabem que está próximo dos 50% em média? É um absurdo. Mas aí eu penso que, neste momento, os principais responsáveis são os alunos. Os alunos do nosso ensino superior tornaram-se extremamente acomodados. E, portanto aquela força de contestação por exemplo que a minha geração naturalmente tinha, de pôr tudo em causa, de fazer abaixo-assinados – aliás eu era o redactor da turma para os abaixo-assinados e para os comunicados, foi aí que eu comecei a fazer o meu jornalismo de parede – esse tipo de dinâmica perdeu-se muito e ficou uma mais conservadora, que não funciona bem.

 

Jorge Nuno Sá

A última questão é do grupo encarnado e é o Humberto Monteiro a colocá-la.

 

Humberto Monteiro

Ora muito bom dia. Senhor Professor. Deixe-me felicitá-lo por ser uma referência para o curso de engenharia civil, e a questão do grupo encarnado é a seguinte: Sendo o Europeu de 2004 um sucesso, que uniu a Europa em torno de um ideal que foi o desporto, teremos capacidade de organizar uns jogos olímpicos em 2016, criando estruturas, infra estruturas sem afectar prioridades básicas nomeadamente a saúde, a educação, entre outras? Muito obrigado.

 

Valadares Tavares

Ainda bem que o tempo de perguntas não é infinito, porque vocês estão a fazer perguntas cada vez mais difíceis e portanto, eu sinto-me como aquele aluno na prova oral que a certa altura começa a olhar para o relógio. O que eu acho é o seguinte. Vocês reparem: se me perguntarem se temos a capacidade, é evidente que temos. Aliás todos esses desafios em que nos temos metido têm corrido muitíssimo bem. A Expo correu muitíssimo bem. O Euro 2004 correu muito bem. Correm todos muito bem. Portanto, temos toda a capacidade. Agora a questão é se queremos e como queremos. É evidente que, por exemplo, em relação ao Euro, houve um despesismo em relação à construção de estádios, que é perfeitamente ridículo. Portanto, não é preciso ser especialista em avaliação de projectos para se estar mesmo a ver que aquele estádio que se fez, em Faro, em que somando as noites de glória dos dois clubes, dá para 10% do estádio, ou 15% do estádio. E depois as pessoas dizem: Não há problema porque vamos inventar concertos rock. Mas como todo o País está a tentar inventar concertos rock, depois também não dá.

Portanto, vocês lembrem-se do seguinte: à medida que um país se desenvolve, há maior consciência daquilo que os nossos amigos economistas chamam os custos de oportunidade. Ou seja, um euro que eu gaste aí, não estou a gastar noutra coisa. Isso é uma consciência que os países atrasados não têm. Se vocês estiverem num país africano muito atrasado, ou da Ásia, ou das Américas, as pessoas não têm essa consciência. À medida que o país está desenvolvido, percebe. Porque é que eu hei-de gastar um euro nesse estádio, se posso gastar no hospital da minha cidade?!

O Dr. Durão Barroso costumava contar um episódio que eu acho muito interessante. Como sabem ele teve muitas responsabilidades e muito sucesso na área da cooperação. Ele contou-me isso e impressionou-me muito – quando ia ao Parlamento, diziam-lhe sempre: “Porque é que o senhor não gasta mais dinheiro? Não apoia mais Moçambique, ou este ou aquele? Não faz mais isto, não faz mais aquilo? Não trata a sida de todo o africano, desde que passe por Angola”… ou seja, era sempre instigado e criticado por não gastar mais na cooperação, por não fazer mais despesa na cooperação. E quando estava com o amigo dele inglês, era exactamente o contrário. O membro inglês da cooperação – não tem nada a ver com o ser tory ou ser trabalhista – quando ia lá, ele dizia: “mas o senhor anda a gastar imenso em cooperação, o senhor já viu o que é? Então não temos dinheiro aqui para as nossas escolas, para os nossos hospitais, o senhor anda a gastar lá com a Suazilândia, com isto e com aquilo? Não pode ser. O senhor tem que ter cuidado. Deitar contas à vida”. Estes são dois paradigmas diferentes. Pois à medida que se desenvolve, as populações, e eu espero que o nosso País já comece a estar nessa fase, têm mais consciência do chamado custo de oportunidade. Ou seja, gastar um euro num estádio, em princípio é sempre bom, mas pelo contrário eu não estou a gastar esse euro noutra coisa importante.

Voltando a essa questão, eu acho que temos toda a capacidade. Agora tem que se deitar contas à vida e ver se efectivamente vale ou não vale a pena. É evidente que há coisas que tinham valido muito a pena.

Eu pessoalmente até, na minha modesta influência, colaborei por exemplo, para trazer para cá o American Cup, teria sido óptimo. Pouco investimento, muito sucesso, muito impacto. Sector prioritário, para nós, do turismo, etc. Não se conseguiu, temos de tentar outra coisa. Agora, ter cuidado em não repetir, por exemplo, o insucesso da Grécia, em termos de empreendimento dos jogos olímpicos, porque fica a pagar aquilo uma série de anos.

Vocês reparem o que é mais grave, por exemplo em relação ao Euro 2004, a rede de estádios não teve debate nenhum. Eu penso que isso nunca foi debatido em nenhum sítio. Na Assembleia da República nunca foi debatido. O Governo nunca explicou à população. Não houve uma sessão pública. Já reparam nisto? Isso é que é característico de um país de terceiro mundo. Isso é característico de comportamento de terceiro mundo. Isso não achamos positivo.

 

Jorge Nuno Sá

Bem acabamos a ronda pelos grupos e termos algum tempo para perguntas livres. Muito bem. Hoje foram melhores a levantar os braços do que ontem, portanto mais dificuldades para mim. Só para dizer o seguinte: As inscrições através do meu telemóvel não funcionam. Eu já deixei o telemóvel no quarto hoje, precisamente por causa disso, pelas sucessivas mensagens que recebi ontem. Mas se eu não estou em erro, o Luís foi o primeiro a levantar o braço e eu vou tentar tomar nota dos outros e vamos tentar fazer aqui o máximo possível. Agradecia-vos que devido ao número, mantivessem um bocadinho no ar, enquanto o Luís pode começar.

 

Luís Cané

Ora muito bom dia. Eu queria, ter aqui um momento para quebrar um bocado a monotonia, que não tem havido, mas fazer uma passagem, para estimular aqui um bocado os meus colegas. Relativamente ao tema da conferência de hoje, radiografia ao país. Ontem, vou pedir desculpa pelo pouco conhecimento, antes de sabermos propriamente que se tratava do senhor engenheiro, falou-se em radiografia, houve logo – agora estou a brincar – “isto seguramente é um médico, radiografia é médico”. Sei que não é. Mas em todo o caso não resisti em perguntar-lhe que tipo de medicamento é que entende que o nosso País precisava? Um sedativo, penso que não. Estimulante ou anti-depressivo, talvez. Um antibiótico ou anti-inflamatório, só se for para neutralizar algumas bactérias e fungos que vão entrando aqui nas engrenagens.

 

Valadares Tavares

Essa resposta é muito fácil. Eu acho que o medicamento é: vitamina.

 

Fernanda Azóia

Bom dia. A minha pergunta prende-se com a deslocalização de ministérios e de secretarias de estado que ultimamente têm ocupado a nossa política e na minha região tem dado tinta para grandes páginas de jornais e telenovelas que não importa agora aqui recordar. A minha questão é: Quais as vantagens e quais as desvantagens? Os argumentos que tenho ouvido prendem-se quase sempre com questões políticas. Ainda não fiquei esclarecida o suficiente sobre os custos da deslocalização. O nosso Primeiro-Ministro enquanto Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, quis tirar os ministérios do Terreiro do Paço e há estudos para isso, deslocalizá-los para a zona da Ajuda, em que iam ser desenvolvidas infra estruturas. Há estudos sobre isso. Os custos eram alguns. Portanto, deslocalizar da capital do País é necessário? Qual o tempo útil necessário também para essa deslocalização? Quais os custos? E depois as pessoas. Se é necessário deslocalizar também as pessoas, formar novas pessoas para acompanhar essa deslocalização? Enquanto Presidente do INA, gostaria de saber qual a sua opinião.

 

Valadares Tavares

Olhe, enquanto Presidente do INA, eu estou-me a deslocalizar, para usar essa expressão que é um bocado infeliz. Deslocalizar dá a sensação que só quando estamos em Lisboa é que estamos localizados, o resto é uma espécie de deserto. É relocalizar.

Neste momento, nós temos cursos que vão desde Viana do Castelo até Faro, Açores, Madeira, o que nunca tinha acontecido e 25% da nossa actividade é feita no estrangeiro. Ganhámos vários concursos. Brasil, PALOP’s e novos membros da União Europeia.

Bom, mas agora voltando exactamente a essa questão, eu diria o seguinte: Cada país tem que encontrar a sua solução, o seu modelo. Por exemplo, a Suécia, que é um dos países mais descentralizados do mundo, tem os ministérios todos no centro de Estocolmo…

Há outros países, é o caso por exemplo da Holanda, Inglaterra, que adoptaram exactamente a solução de colocar departamentos fora. E eu julgo que isso pode ser uma solução-exemplo para o nosso País. Eu sei que o Dr. Santana Lopes foi muito criticado por querer transferir as Secretarias de Estado para aqui ou ali, eu não sei se aí a variável custo é dominante. Eu acho tudo o que seja experimentar soluções para começar a ter centros de actividade e de poder, fora da cidade, vale a pena experimentar e vale a pena tentar ver quais são os resultados. A sociedade moderna baseia-se muito na comunicação social. Essas zonas, designadamente a sua, estão a aparecer muito mais na comunicação social. Isso é uma condição que lhe pode ser favorável. Agora, é necessário que essa região faça mais qualquer coisa.

Por exemplo, o facto de o Dr. Durão Barroso ser português e ser Presidente da Comissão, - eu tenho pena que as pessoas ainda não tenham percebido isso – para além dos aspectos políticos – não interessa agora discutir – é uma oportunidade de marketing. Porquê? Porque o Finantial Times no dia 20 de Agosto tem uma página inteira dedicada ao Dr. Durão Barroso, em que fala 20 vezes de Portugal. Eu se for vendedor ou produtor de vidros ou de cerâmicas ou de outra coisa qualquer, já tinha aproveitado para pôr um anúncio no Finantial Times. “Portugal is just not Durão Barroso, is also…” pois punha os nossos vinhos, outra coisa qualquer. Esta ideia da boleia mediática. Simplesmente, as pessoas ainda não perceberam isso.

Portanto, o facto de ter uma Secretaria de Estado – não dêem agora esta sugestão ao Dr. Santana Lopes, que ele pode concretizá-la – mas pegar numa Secretaria de Estado e pôr na Serra da Estrela, na Torre, lá em cima, nos 2.000 metros, uma coisa louca. Pode não ser louco. É uma forma de mediatizar a Serra da Estrela. Portanto, a sociedade moderna baseia-se muito às vezes nesses mecanismos. Eu acho que vale a pena experimentar esta solução.

 

Gabriela Queirós

Bom dia senhor professor. Bom dia a todos. Antes de mais, obrigada pela manhã fantástica com que nos brindou. Na radiografia que faz de Portugal - e que todos nós vamos conseguindo fazer, se calhar por isso é que estamos aqui - há uma coisa que eu acho que essa é que tem mesmo de mudar, que é a mentalidade dos portugueses. Senhor professor como é que se muda a mentalidade dos portugueses?

 

Valadares Tavares

Este problema da mudança tem sido muito estudado. Como é que mudamos mentalidades, ou mudamos no fundo culturas, o nosso estilo, a nossa maneira de ser? E há algumas conclusões que são habitualmente aceites. A 1ª não há mudanças universais. Não há nenhuma receita, tipo pó instantâneo que se dissolve na água e agora os 10 milhões de portugueses passam a ter outro tipo de comportamento. Portanto, não há nenhuma receita desse tipo. Não há mudanças universais. As mudanças baseiam-se em centros de mudança. Eu acho que a questão que se deve colocar é: na sociedade portuguesa, quais são os centros de mudança que podem protagonizar essa nova mentalidade? Por exemplo, uma juventude como a vossa deve com certeza ser um centro de mudança. De atitude, de mentalidade, de cultura. Mas haverá outros. Portanto, a mudança nas sociedades baseia-se nalguns paradigmas de mudança.

E depois os outros até por competição, por concorrência, por cópia, começam a ir atrás. Agora, de facto temos tido muita dificuldade. Olhem o problema dos acidentes nas estradas. A França usou um sistema de controlo de alcoolemia mais baixo, mais exigente, muito controlo e conseguiu evitar 1.400 mortes, no ano passado. Houve 1.400 franceses que não morreram em 2003, graças a esse sistema. Espanha, como viram na televisão há poucos dias, vai copiar esse modelo. E Portugal? É necessário, depois ter uma certa coragem para introduzir esses processos modernos. E eu penso que são possíveis.

 

Andreia Aguiar

Bom dia. Quero desde já dar-lhe os parabéns, pelo excelente orador que é, espero um dia conseguir chegar aos seus calcanhares. Queria colocar-lhe uma questão. Eu sou insular e na minha região deparo-me com uma situação: nós estamos constantemente a receber subsídios e à custa disso as pessoas às vezes tendem a evoluir no sentido contrário, isto é, compram casa ou carro topo de gama e usam assim o subsídio que devia ser para evoluir, melhorar, para se estar minimamente em pé de igualdade com os outros países. Acha que Portugal é um país de subsídios e que vive de facto à custa disso?

 

Valadares Tavares

Evidente que isso tem sido uma especialidade nossa nos últimos 800 anos. E conseguimos inventar coisas fantásticas, que nos ajudem, que nos apoiem, temos aquela estratégia de aparecermos mascarados, pobrezinhos, tristes, quer dizer, somos bons nisso. Mas é evidente que esse número teatral já está a chegar mais ou menos ao fim, portanto temos que deixarmo-nos desse papel.

Eu penso que o caso dos Açores é um caso preocupante, porque é uma região que teve muitos apoios, mas continua na zona debaixo do ranking, não é só do nosso País, mas do ranking da Europa. Portanto, é um caso em que se mostra que essa ideia do subsídio é uma ideia bondosa. Há pessoas com dificuldade, vamos-lhe dar dinheiro. Não funciona como desenvolvimento de região. Eu penso que o caso dos Açores merece uma reflexão séria para mudança de estratégia. Porque efectivamente, eu penso que é um caso de insucesso, em termos de desenvolvimento do nosso País.

 

Orlando Leal

Bom dia. Em primeiro lugar queria-lhe dar os parabéns pelo excelente professor que parece ser, e também queria não era fazer uma pergunta, era lançar um pensamento, uma coisa que toda a gente já sabe o que é. Desde que o António Guterres caiu só temos falado na crise, na crise, na depressão, mais não sei o quê. E apontam-se as soluções sistematicamente, mas não se avança. Portanto, eu pergunto-lhe de que é que estamos à espera?

Também queria perguntar, como é que, sendo nós um País pequeno e com recursos moderados, como é que, nos damos ao luxo de ter 2/3 do território ficarem abandonados, ocupando só 1/3. Portanto, de que é que estamos à espera para avançar?

 

Valadares Tavares

Também vos podia fazer essa pergunta, de que é vocês estão à espera para avançar? Mas aqui, (deixem-me ser muito sincero convosco), eu julgo que nós não devemos protagonizar excessivamente os problemas dos últimos anos num Primeiro-Ministro, chame-se Guterres ou não. Não protagonizem muito os insucessos nessa pessoa, até porque tinha sido fácil resolver o problema. Ele saía e deixávamos de ter esses problemas. Agora o que eu penso que se pode dizer é que nos últimos tempos temos tido muita dificuldade de aceitar que temos que mudar de vida. A ideia de iniciar um novo ciclo que não é mais do mesmo. Essa ideia tem sido difícil. Se vocês repararem, quando se fala na retoma, dá a ideia que a retoma vem de fora. Mesmo comentadores e economistas conhecidos, há uns que dizem não, “a retoma está quase a chegar”, ou “ainda está lá em baixo na praça”, outros dizem, “não, já vai aqui na rua, já está mais próxima de nós”. A retoma é qualquer coisa de exógeno a nós. Com esse raciocínio, não havia Irlanda, não havia Espanha, não havia Países Baixos, não havia norte de Itália, não havia nada disso. Esta ideia de não ser mais do mesmo. De mudar de vida, de menos dependência do Estado, de mais inovação, de aceitar o jogo da avaliação, da presença nos militares internacionais, de todos esses desafios, eu acho que os portugueses têm tido muita dificuldade de aceitar.

E deixem-me até dizer-vos o seguinte, com toda a sinceridade, eu acho que o perfil político de António Guterres que vai ficar na história, é mais o de representante dos gostos e simpatias dos portugueses do que propriamente um pensamento próprio. Realmente, houve muitas decisões assim, porque as pessoas gostavam mais assim. Chegou-se ao ponto de não conseguir manter o nível do grau de alcoolemia, (não se lembram disso?) porque houve um conjunto de grupos de pressão que lá conseguiram aumentar outra vez. Portanto, quando perguntam de que é que estamos à espera, eu acho que é um problema de nós nos convencermos (e é pena que a comunicação social não esteja a ajudar) de que os problemas não vêm de Vénus nem de Marte, a retoma não é um veículo espacial que vai a certa altura aterrar no nosso País. É um problema de percebermos que temos que fazer um jogo diferente. Quando percebermos, vamos ser tão bons ou melhores do que os outros. Infelizmente ainda não assumimos essa consciência. E pensa-se que o mau da fita é este ou aquele ministro…

 

João Alexandre

Bom dia, senhor Dr. Valadares Tavares. Ainda não se falou aqui muito de educação e é um tema que penso que falta falar. Acha que a passagem da escolaridade obrigatória do 9º para o 12º ano vai trazer alguns benefícios para o País ou alguma coisa? Obrigado.

 

Valadares Tavares

Vocês sabem porque é que aquela taxa de escolarização está a baixar? Há bocadinho apresentei-vos aquele slide e não falei sobre isso porque pensei que alguns de vocês me fossem fazer essa pergunta. É o único país da Europa em que isto está a acontecer. Sabem porque é que está a acontecer aquilo? Porque as pessoas deixaram de chumbar até ao 9º ano. Como todos nós sabíamos, nas nossas famílias, chegava-se ao Verão e havia uns pais que diziam: “que chatice o meu miúdo este ano não passou”, isso tudo desapareceu. O que acontece é que chegam ao 10º ano sem os activos fundamentais, desistem. É por isso que a taxa está a baixar. Ou seja, isto vem de encontro à tua pergunta. É evidente que é bom a escolarização obrigatória passar a ser de 12 anos, mas o que é essencial é passarmos a ter um sistema educativo diferente que ensine bem, que seja exigente e que as pessoas gostem de participar. Eu aí não quero falar muito porque sou muito crítico em relação ao que se tem feito em educação. Eu acho que em relação à educação tem que se fazer aquilo que nós às vezes com os computadores temos que fazer, que é o desligar e fazer o reset. Nunca vos aconteceu quando estão a trabalhar com o computador? Uma pessoa está tão ensarilhado com erros disto e daquilo que a gente põe o control alt esc e reinicia. Eu acho que com a educação devíamos fazer isso. Palavra de honra. E fundamentalmente, escolher outras pessoas. Quem tivesse tido mais intervenção – tirando aqui o meu amigo Carlos Coelho, que era a única excepção – todos os outros que já tivessem mexido no sistema, estavam proibidos de voltar a mexer. Porque os resultados foram desastrosos. Portanto, esses estão proibidos de mexer na máquina. Porque uma pessoa quando tem um relógio e uns tipos começam a mexer, e aquilo está cada vez pior, tu dizes “agora não mexes mais”. Esses não podem mexer, ou então mexam noutros países. Nós exportamos esses especialistas para outros países a preço de saldo.

 

João Ferreira

Bom dia professor. Eu ia fazer uma pergunta bastante rápida que tem a ver com algo que se tem vindo a assistir na administração, que é a questão da delegação de competências. Ainda ontem, eu lia no Diário de Notícias que vai passar a caber às juntas de freguesia – espero não errar – a fiscalização da habitação, ou da inspecção da habitação. Eu realmente acho muito bem que haja delegação de competências, porque havia um grande bloco ao meio na pirâmide de cima, mas a questão que eu coloco é: não terá essa delegação de competências de ser acompanhada por aumento de recursos humanos e financeiros. Porque ao fim e ao cabo estão a delegar competências em estruturas que não estão minimamente preparadas.

 

Valadares Tavares

Eu sou claramente a favor do chamado princípio da subsidiariedade: o que pode ser resolvido em minha casa, não deve passar para o condomínio; que pode ser resolvido no condomínio, não deve passar para o bairro; que pode ser resolvido no bairro; não deve passar para a freguesia. Se pode ser resolvido na freguesia, não deve passar para o município, o que pode ser resolvido no município, não deve passar para a região e o que pode ser resolvido na região não deve passar para o nível central. Eu sou a favor do princípio da subsidiariedade que, talvez alguns não saibam, pela 1ª vez foi formulado por um Papa no início do século que o explicitou de uma forma muito clara. Toda aquela utopia de se dizer “o que é bom é haver um super poder central, que é melhor, pensa melhor, decide melhor, tem mais recursos e consegue a justiça equitativa entre todos”. Esse foi um equívoco do marxismo. Vocês reparem que todas aquelas soluções de planeamento centralizado nas ideologias marxistas-leninistas baseiam-se nesse equívoco. Então criam um “super computador” que pode ser em Moscovo, que pode ser em Lisboa, que pode ser noutro sítio qualquer.

Eu sou contra isso. Agora, o problema que tu pões tem toda a razão de ser. Eu quando transfiro competências, o que é que eu também devo transferir? Pessoas e recursos. Haver pessoas que estavam a fazer essas actividades nos municípios que passam a fazê-las nas juntas de freguesia. Agora não é contratar mais funcionários públicos. Então o problema tende para infinito. Portanto, devemos fazer essas transferências. O que é interessante é que quando se discute isso, de um modo geral as pessoas são a favor, mas depois quando se vai concretizar é muito difícil. E aí temos realmente problemas.

 

Rui Freitas

Bom dia, senhor professor. Agradeço-lhe muito pela palestra que nos deu. Eu venho de uma região deprimida. Eu venho de uma região que é a região onde fazem os Prime ( Programa de Incentivos à Modernização da Economia) e o Prasd ( Programa de Recuperação de Áreas e Sectores Deprimidos), essas coisas todas. Eu sou da Região do Vale do Ave. E aqui há uns anos, tinha eu para aí 14 anos, agora tenho 21, e pensei assim: nós temos aqui a Universidade do Minho, uma zona, um pólo de formação excelente, temos dos melhores engenheiros de robótica, porque é que nós não tentamos fazer um parque de ciência e tecnologia, vamos deixar os sectores tradicionais, como os têxteis e vamos passar para indústrias com maior valor acrescentado. O meu pai disse-me assim: - Desculpa lá Rui, mas isso já existe. Já há o projecto para o parque de ciência e tecnologia. Se o senhor Professor me perguntar como está o parque de ciência e tecnologia, eu digo-lhe: ainda temos o projecto para o parque de ciência e tecnologia. E o mais engraçado é que por acaso agora, é entre Guimarães e Braga e eu sei que os vereadores das câmaras entre Guimarães e Braga já sabem quem vai ganhar o concurso e continua tudo na mesma. O que eu lhe pergunto é isto: será que nós não conseguimos avançar com estes clusters, que, sinceramente para mim, são uma solução fundamental? E eu falava aqui com a minha colega e dizia que são quase uma alquimia para resolver muitos dos problemas do nosso país. Será que é falta de vontade, será que é burocracia? Tal como em Itália, nós temos problemas imensos de burocracia e este ano estudava que Portugal assim como Itália, as pessoas tentam fazer o mínimo de contratos porque depois não os conseguem cumprir e tentam não os resolver. O que eu lhe colocava era isto: será que há um cocktail de problema estrutural, cultural e falta de vontade? Obrigado.

 

Valadares Tavares

É evidente que sim. E mesmo os contratos, é verdade. As pessoas estão a fazer menos contratos. Até contratos de casamento, como sabe. Vocês estão-se a casar menos. Em relação a esse problema dos parques, é aquilo que eu há pouco tinha dito: o português tem muita dificuldade de cooperar e a ideia de parque é ideia de cooperação. É por isso que este aqui de Lisboa, o Tagus Park correu bem e é um bom exemplo. Infelizmente no norte, eu penso que essa questão da cooperação ainda é pior do que no sul e portanto acho que os decisores no norte são ainda mais complicados - eu dizia isso ao Presidente da AIP e ao Prof. Valente de Oliveira, no outro dia quando estive a fazer uma palestra no Porto – tem havido muito este debate do declínio da região norte. Eu penso que o declínio da região norte se deve, antes de mais, à incapacidade de cooperação dos seus dirigentes. Não me venham agora dizer que a culpa é de Lisboa, ou minha, ou do Técnico. Isso não é verdade. O declínio da região norte deve-se fundamentalmente à perda de liderança, de figuras líderes na região norte e da sua capacidade de cooperação ser nula, é igual a zero. Deviam chumbar todos. Aí tens toda a tua razão.

Agora deixa-me dar-te aqui uma sugestão: tu se fosses, se calhar, americano com a tua idade, eras o Bell, o nosso amigo Michael Bell e em vez de ir falar com o pai para fazer um parque de ciência e tecnologia – não sei quem é o teu pai, pode ser que seja uma pessoa importante na região – ias dizer que não ias fazer um parque, ias fazer a tua empresa. Foi isso que o Michael Bell fez. A minha sugestão, em vez de propores a criação de um parque, fazer uma empresa tua de sucesso e eu terei muito gosto em participar depois na sessão inaugural da tua empresa. RISOS.

 

Jorge Nuno Sá

Vão ficar 6 questões por colocar, mas o último é o Luís Capão para terminar esta sessão, e cumprimento o Prof. Valadares Tavares por, apesar de tudo, ter sido o orador que respondeu a mais perguntas.

 

Luís Capão

Antes de mais, muito obrigado ao nosso orador por ser tão conciso nas suas respostas e tão informativo ao mesmo tempo. Eu lembro-me daquele slide que mostrava um gráfico de barras que relacionava o PIB em formação, o conhecimento e a aplicação do mesmo. Em relação à média europeia países como a Espanha e a Finlândia e que realmente a nossa escada crescia na direcção inversa à da Finlândia. A minha questão é porque é que em 97 se verificaram aquelas interrupções repentinas no crescimento do PIB e por acaso na escolarização também.

 

Valadares Tavares

Devo dizer que neste momento há um debate sobre isso. Porque é que realmente há aquele turning point em 98 em aspectos como os impostos, as contas públicas, ambiente, consumo de energia, escolarização, poder de compra? Dá a sensação que há uma mão maléfica que diz: “estes tipos a partir de agora estão tramados”. A impressão que temos é a seguinte: é que corresponde fundamentalmente ao esgotamento do modelo económico que vínhamos tendo. O mercado interno, o single market, o Mercado Único é a decisão oficial, a bandeira da Comissão Europeia de 93. Mas estas coisas levam sempre muito tempo a ser aplicadas. Uma série de directivas, uma série de iniciativas da União Europeia só foram aplicadas em 95, 96, 97. Por exemplo, no nosso comércio com Espanha, o enorme desequilíbrio é de 97. De certa forma 97/98 é o ano em que o mais do mesmo deixou de funcionar. E ao deixar de funcionar, num país pequeno e frágil como o nosso, o afundamento é global. As pessoas têm menos dinheiro, estudam menos, fazem menos. Mas de facto é um assunto que está mal estudado. Quando conseguirmos estudar melhor, vamos publicar um livro que se chama: “A teoria do cometa”.

 

Carlos Coelho

Senhor Professor Valadares Tavares, muito obrigado pela sua disponibilidade, pelas respostas que nos deu, pela magnífica intervenção que nos proporcionou e todos tiveram ocasião de sublinhar. Eu sei que há 6 inscritos que não tiveram ocasião de fazer perguntas ao professor Valadares Tavares, ele disponibilizou-se para almoçar connosco, portanto os 6 inscritos que salvo erro, (se houver algum erro, articulam isso com o Jorge), que são o Nuno Sousa, o Hélder Baptista, o Rodrigo Lopes, o Rui Reis, o Mário Santos, o Ricardo Lopes, ou mais alguém, não sei quantos lugares é que as mesas têm, quiserem almoçar connosco, estão convidados a sentar-se na mesa com o professor Valadares Tavares ao almoço. Nós vamos acompanhar agora o senhor professor à saída, de acordo com a tradição, vou pedir ao Duarte Marques e à Zita para coordenarem agora as operações. Antes de fazerem o vosso voto, ou melhor na altura em que façam o vosso voto à saída, agradecia que retirassem um impresso relacionado com a visita a Castelo de Vide amanhã, para saber quem é que está disponível e interessado. PALMAS.