O nosso orador da tarde está ligeiramente atrasado. Ele é Secretário de Estado e foi convocado pelo Ministro. Aliás, ele adiou uma iniciativa esta tarde para poder estar connosco. O seu atraso dá-nos a oportunidade de fazermos uma coisa que tínhamos que fazer noutra altura e assim aproveitamos este espaço para poupar tempo.
Eu disse, (com muita franqueza), aos vossos antecessores, os participantes da Universidade de Verão 2003, que eles eram cobaias duma experiência que resultou bem e da qual estamos a beneficiar hoje.
Em 2004 vocês já não são cobaias da Universidade de Verão, mas vão sê-lo em algo que vai ocorrer na sexta-feira à tarde.
A Universidade de Verão 2003 não teve uma simulação de Assembleia e vocês vão experimentar essa simulação. Com a vossa criatividade, energia, competitividade e inteligência, vamos aferir se o modelo que desenhámos é ou não eficaz.
Nós estamos aqui a preparar uma nova geração de quadros políticos. Para isso, como vos disse na Sessão de Abertura, há um nível de exigência intelectual e de formação que é necessário. Estamos a contribuir para esse esforço com o naipe de oradores que seleccionámos.
As diversas actividades da Universidade de Verão, no seu conjunto, criam mecânicas de participação essenciais na política. Uma delas (fundamental) é a troca de argumentos no palco de uma assembleia. Sermos capazes de ver um documento e perceber onde estão as armadilhas; se tivermos de ser nós a defender um ponto de vista, fazê-lo da melhor maneira, ou, se tivermos de ser nós a atacar, demolirmos da forma mais inteligente.
Este exercício está preparado para sexta-feira à tarde e todos nós vamos aprender com a vossa experiência. Assim, não se incomodem se perceberem que algumas coisas ainda não estão muito afinadas porque vamos todos trabalhar em conjunto pela primeira vez neste exercício. Agradecemos o facto de também nos ajudarem a melhorá-lo para edições futuras da Universidade de Verão.
Isto vai funcionar da seguinte forma. Vocês já viram as regras: cada Assembleia demora 17 minutos, o Governo estará aqui, junto da Mesa. O Governo estará virado para a frente, a primeira fila será reservada para as oposições. Há 2 Oposições em cada Assembleia e o resto dos sete grupos sentar-se-ão da segunda para a última fila. E tudo isto muda de 17 em 17 minutos, quase como no jogo das cadeiras: toca a campainha e estamos todos a rodar para a cadeira ao lado.
E o sistema é muito simples: o Governo apresenta uma Proposta durante 5 minutos, cada um dos grupos da Oposição contesta ou faz perguntas durante 3 minutos. O Governo responde pelo tempo de 3 minutos, depois há um grupo surpresa que vai fazer uma provocação de 1 minuto que será uma provocação acutilante. O Governo tem 2 minutos para responder.
A Assembleia termina com o voto dos sete grupos neutros que estão na Assembleia. Estes, podem aplaudir mas não usar da palavra. Quem usa da palavra é só o grupo do Governo, as 2 Oposições e o grupo surpresa que faz oposição. Os sete grupos neutros podem manifestar-se, não usam da palavra e, no final, vão votar respondendo a uma pergunta simples: Quem ganhou o debate? Foi o Governo? Foi a Oposição 1? Foi a Oposição 2?
E esta é a lógica da Assembleia. Dito isto, como é que isto se vai processar?
Nós vamos distribuir fichas de jogo. Estão 10 temas seleccionados e vão ser sorteados. Faremos o sorteio e cada grupo vai receber, numa reunião com os Coordenadores, em envelope fechado as instruções para a Assembleia.
Dou-vos um exemplo concreto: uma das Assembleias tem como tema “O aumento das propinas do Ensino Superior Público”, o Governo vai ter uma missão que não vou dizer qual é. O Governo e as Oposições sabê-lo-ão na devida altura, em envelope fechado. Terão uma dada função relativamente a este tema e as Oposições, 1 e 2, em envelopes fechados, vão receber também uma missão para desempenhar nessa Assembleia.
Além dos envelopes com as cartas de missão e com as instruções sobre qual é o vosso objectivo, vão receber também dois documentos.
Um documento é informação, nuns casos é real e noutros casos é fictícia (só para criar o ambiente para a simulação). Podem ser estatísticas, entrevistas a Ministros, a dirigentes da oposição, a comentadores internacionais ou nacionais. Podem também ser exemplos de como as coisas ocorrem noutro país, podem ser factos, testemunhos de cidadãos, etc. São elementos informativos universais. Como nós partimos do princípio que são dados públicos, todos os recebem, Governo, Oposições e o grupo surpresa. Aí não há jogo escondido. A informação é pública, é para todos. Mas não é muita coisa. Nós temos consciência de que não vão ter muito tempo para perder com muitas páginas. A informação está condensada. Nuns casos serão duas páginas noutros casos três. Um caso maior tem cerca de cinco mas nele figuram muitos mapas e não é nada de muito pesado. Mas essa informação é igual para toda a gente, jogo limpo. Governo e Oposições todos têm a mesma informação.
O outro documento, o terceiro documento, só é entregue ao Governo. É a iniciativa do Governo porque o Governo vai para a Assembleia apresentar uma coisa: pode ser uma Proposta de Lei, pode ser uma Resolução de Conselho de Ministros, pode ser uma simples declaração política mas materializada num documento.
Foi a organização da Universidade de Verão, através dos Avaliadores, Conselheiros e de outros membros, que escreveu as peças. Portanto o Governo, (cada um de vocês vai ser Governo uma vez e Oposição duas vezes) vai ter um documento proposto. Vamos supor o caso das Propinas, vamos dar ao Governo uma Proposta de Lei e só damos ao Governo porquê? Porque o grupo que for Governo tem a possibilidade de alterar esse texto. Ou seja, nós não vos estamos a impor o texto mas sim a impor-vos a orientação do texto - o objectivo - porque isso está nas cartas de missão e o vosso objectivo, enquanto Governo, vai ser contrariado pelos objectivos das Oposições. Isso está pré-definido, mas relativamente ao documento do governo vocês podem fazer alterações. Podem projectar toda a vossa criatividade no documento do Governo. Têm um dia para o fazer porque durante a tarde do dia seguinte têm que entregar às Oposições o vosso documento. Podem entregar sem alterações (não são penalizados se se cingirem à proposta que apresentámos) mas podem querer fazer as vossas “malandrices” e meter umas coisas pelo meio - desde que não desvirtuem o objectivo essencial. Depois dão uma cópia a cada um dos grupos de Oposição, (que vamos sortear). Compete à organização tratar das fotocópias: quem tratar disso, dá-vos o original e cópias para poderem fornecer a cada um dos membros da oposição ou coordenador da oposição e ficamos também com uma cópia.
Qual é a lógica da distribuição do tempo da palavra?
Vocês têm nessa Assembleia pelo menos três intervenções, falam enquanto Governo, falam enquanto Oposição 1 e falam enquanto Oposição 2 ou seja, vão falar em três Assembleias. Nós atribuímos ao grupo a capacidade de decidir como é que quer definir a divisão dos oradores quando são Governo. O que é que eu quero dizer com isto? É que quando vocês vão ser Governo têm três possibilidades de intervenção: falam uma vez 5 minutos quando apresentam a proposta, falam uma vez 3 minutos quando respondem às provocações, perguntas, comentários, debates ou interpelações das Oposições e falam 2 minutos quando respondem à provocação do grupo surpresa que fala durante 1 minuto.
Portanto, quando vocês são Governo falam 5, 3 e 2 minutos, têm três momentos com direito à palavra. Cabe-vos decidir se o grupo se faz representar enquanto Governo sempre pelo mesmo porta-voz, (pelo Primeiro-Ministro ou pelo Ministro competente em razão da matéria). Podem achar que a apresentação inicial é feita por um membro do grupo mas as duas respostas - quer a resposta às Oposições quer a resposta ao grupo surpresa - é feita por uma outra pessoa. Ou podem dividir-se em três oradores. Um para a intervenção inicial, outro para responder aos grupos da Oposição e outro para responder ao grupo surpresa. É inteira liberdade vossa: cada grupo decide quanto a isso, e não é valorizado nem desvalorizado. Tem a ver com a vossa estratégia. Porém, a estratégia quando são Governo é ligeiramente diferente da estratégia quando são oposição por razões evidentes.
Quem fala no Governo não fala na Oposição e quem fala na Oposição 1 não fala na Oposição 2. Nestes três momentos na Assembleia têm que ser pessoas diferentes. A forma de gerir os tempos cabe ao grupo decidir.
Os meus colegas de Organização me dirão se eu me esqueci de alguma coisa relativamente à mecânica das Assembleias, Gonçalo, Alexandre, Zita.
Se tiverem dúvidas podemos já esclarecer algumas e depois os vossos Conselheiros também poderão esclarecer alguma com mais detalhe.
Há alguém que queira fazer alguma pergunta a propósito desta mecânica?
Um Aluno
Relativamente à documentação, nós só podemos argumentar com base nos dados fornecidos? Não vale argumentar com dados a que tenhamos acesso?
Carlos Coelho
Não. Podem usar outros argumentos, podem até inventá-los. Desde que eles sejam convincentes como refere o Jorge Nuno, mas apenas desde que sejam compatíveis com as regras que têm definidas.
Isto é, se um documento de suporte relativamente às propinas aponta para determinados valores, vocês não podem inventar outros. Imaginem esta situação abstracta (porque não quero antecipar nada): o documento das propinas dizia que existiam três Universidades em Portugal - então vocês têm que trabalhar nesse pressuposto. Podem na argumentação dizer que vão construir amanhã mais dez mas não podem dizer que existem quinze Universidades. Podem inventar os argumentos que quiserem, desde que eles sejam convincentes e que eles sejam consistentes quer com a ficha de jogo quer com os elementos informativos que têm.
Vão reparar que há documentos de suporte que são verdadeiros, são relatórios de entidades oficiais, dados estatísticos autênticos e vão reparar que há outros que o não são, que são simulados e isso é relevante.
(ENTRA NA SALA O ORADOR) Entretanto chegou o nosso convidado.
Muito obrigado pela vossa atenção, espero que tenha ficado claro como é que vamos funcionar na sexta-feira à tarde.
Dou as boas vindas ao Senhor Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território.
O Eng.º Jorge Moreira da Silva foi Presidente da JSD como sabem, foi um brilhante Deputado Europeu, foi Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Ciência e Ensino Superior, agora é Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território. Fez uma excelente intervenção na Universidade de Verão 2003 falando sobre as mesmas matérias que vos vai falar hoje. Destacou-se numa questão que hoje foi objecto de discussão durante a Sessão e ao almoço: o comércio de emissões e da forma de fazer respeitar ou não o Protocolo de Quioto. Foi uma matéria a propósito das externalidades e das questões económicas aqui colocada pelo Professor Diogo Lucena, (de uma forma aliás muito simples) para exemplificar a teoria económica mas usando o exemplo dos “side effects” não contabilizáveis nos custos da poluição. Portanto, sem que o tivéssemos previsto, os últimos exemplos dados pelo Professor Diogo Lucena para explicar os seus conceitos de teoria económica, acabam por ligar não apenas com aquilo que o Eng.º Jorge Moreira da Silva seguramente nos vai dizer mas também com a matéria em que mais se destacou a nível nacional e internacional quando foi o relator no Parlamento Europeu para o comércio de emissões e responsável no Parlamento Europeu para as mudanças climáticas.
Os seus hobbies são o ténis, os livros e os museus
A cozinha que prefere é a cozinha tradicional portuguesa, resposta politicamente correcta para um Membro do Governo, não se esperava outra coisa (RISOS). O animal preferido é o cão. O livro que nos sugere é de Al Gore, “ Earth in the Balance”; o filme que sugere é “Les Amants de Pont Neuf” de Leos Carax. A principal qualidade que aprecia nas pessoas é o carácter.
Meu caro Jorge, a palavra é tua.
Eng.º Jorge Moreira da Silva
Muito boa tarde Carlos, Jorge Nuno e a todos.
Eu peço desculpa pelo atraso. Em todo o caso, e sabendo da intolerância do vosso Director quanto aos atrasos, avisei-o de que só chegava às três e portanto consegui chegar antes da hora que eu previa.
Tenho muito gosto em estar uma vez mais presente nesta iniciativa, agradeço o convite e tentaria não vos maçar muito na primeira intervenção e deixar para as respostas algumas das informações que gostava de transmitir.
A intervenção está estruturada para, em primeiro lugar, identificar o estado do planeta e os sinais de insustentabilidade que vão sendo conhecidos, relatório após relatório. Posteriormente partiremos para as linhas de fuga.
Não me convidaram para traçar o lado mais pessimista da questão mas para identificar algumas linhas de fuga, rumos de reparação do estado em que nos encontramos, fazendo a ponte com iniciativas internacionais/europeias que estão a ser lançadas, e depois o caso nacional.
Eu julgo que não existem verdades feitas quanto à ementa da insustentabilidade. Há autores que preferem identificar alguns progressos sempre dizendo que há áreas onde se evoluiu muito, nomeadamente no bem-estar social que a globalização (tendo sido capaz de integrar a tecnologia, informação e capital), permitiu acelerar o nosso modelo de desenvolvimento, permitiu democratizar umas qualidades que o modelo de desenvolvimento do Ocidente tinha e alargá-lo a outras partes. Mas a verdade é que ninguém (nem mesmo os mais optimistas) escapa a uma constatação: há hoje sinais de insustentabilidade que, nalguns casos, sendo os mesmos de há 20 ou 30 anos, se tornaram mais intensos, agravaram-se. Em certos casos estamos a falar mesmo de novas consequências resultantes do nosso modo de consumir e de produzir.
Gostava de dar alguns exemplos de sinais que apontam para esta situação de alguma ruptura no plano ambiental e no plano do bem-estar social e que nos devem preocupar em particular para mobilizar os mais jovens na acção política.
Começo pela área do ambiente, identificando alguns sinais que demonstram que o tempo que estamos a viver não é o mesmo ao nível das consequências daquele que vivíamos há 10, 15 ou 20 anos atrás. E começo por um dos sinais que no meu ponto de vista é um sinal mais grave. Foi a matéria que me fez envolver mais directamente na política nos últimos anos e a ela voltarei um dia, tenho a certeza. É a área da mudança climática.
No último século assistimos a uma subida da temperatura na casa dos 0,5º centígrados. No século anterior este aumento estava entre 0,1º e 0,3º. O que nos dizem os cientistas é que desde 1970 que se verifica uma subida sustentada, sem qualquer hesitação, em que em 30 anos a temperatura aumentou a um ritmo que não tem par na história do registo meteorológico. Por outro lado, sabe-se que em 2003 tivemos o verão mais quente de sempre da Europa (eu estive aqui precisamente há um ano poucos dias depois dos incêndios que devastaram a região); sabe-se que a dimensão da calote polar árctica diminuiu, em vinte anos, 3 metros para um metro e meio; sabe-se que os cientistas apontam para que, nos próximos oitenta anos em Portugal, o número de dias no sudoeste português com temperatura acima dos 35º passe dos 20 para 90 dias, (estamos a falar de um aumento brutal do número de dias com temperatura acima dos 35º). A temperatura média no interior, aqui nesta região, aumentará 10º centígrados, (estamos a falar de temperaturas médias), o que significa que nalgumas regiões do nosso território, o nordeste transmontano, o sudoeste, o interior, podem facilmente atingir os 50º nalguns momentos do ano. O que significa que o território não vai desaparecer mas a qualidade de vida sustentável essa vai desaparecer. Podemos ficar limitados a um terço do território nacional passível de se poder viver com alguma qualidade.
Eu irei às causas disto mas deixem-me falar primeiro das consequências.
O litoral português será afectado como o litoral em todas as partes do mundo. A subida prevista da temperatura pode atingir os 5,8º centígrados nos próximos cem anos. Reparem: 0,5 nos últimos cem, entre 0,1 e 0,3 no século anterior, e 5,8 até ao fim deste século. Assim, o nível do mar poderá aumentar até 88 centímetros, em média. Significa que em algumas partes do Mundo haverá uma subida de cinco metros e a submersão de uma série de ilhas, noutras partes do Mundo essa subida do nível do mar será irrisória mas ainda assim estamos a falar quase 90 centímetros em média. Isto leva a que 2/3 do litoral português, (há pouco falei-vos do interior), será afectado e o custo de reparação do litoral será de 2.500 milhões de euros ou 500 milhões de contos que custará a reparação do litoral devido à mudança climática.
A isso associaremos doenças de outros climas que passarão a ser frequentes em Portugal. Hoje abrem-se telejornais porque há um mosquito que eventualmente terá vindo de outro Continente: ora isso deixará de ser noticia nos telejornais porque daqui a 30, 40, 50 e 100 anos a mudança climática decorrente da subida da temperatura a subida do nível médio do mar não apenas mudará por completo os equilíbrios nos ecossistemas como provocará mudanças climáticas mais bruscas: terramotos, ciclones, tornados.
Ainda ontem a SIC abria com um ciclone, uma mudança climática repentina no Japão. Isso infelizmente será de tal forma frequente que deixará de ser notícia, estamos a falar de um sintoma de insustentabilidade.
A mudança climática, o aquecimento global decorre da nossa acção. A história meteorológica mundial já teve diversos fenómenos de alteração climática mas esta é a primeira alteração climática decorrente da acção humana porque os cientistas provaram que existe uma relação de causa/efeito entre emissões de gases com efeitos de estufa e aumento da temperatura. Se virmos isto em termos gráficos há duas linhas paralelas em que ao aumento das emissões de gases com efeitos de estufa associa-se a subida de temperatura.
Dos gases com efeitos de estufa o mais grave é o metano. Mas o mais democratizado é o dióxido de carbono. Este é o que tem um peso maior na economia internacional. O dióxido de carbono é provocado pela produção de energia por fontes térmicas. É provocado pelo sector dos transportes, em tudo o que está envolvida a combustão. Daí decorre a emissão de dióxido de carbono.
Nós vivemos numa economia muito assente no fogo, a combustão está presente na indústria, nos transportes, na produção de electricidade. A economia do fogo, a que mais adiante me referirei enquanto solução paralela à economia do carbono, a economia do fogo é a base da mudança climática.
Outro sinal de insustentabilidade que afecta directamente a nossa saúde é o do ozono estratosférico.
A camada do ozono, que deu origem a um protocolo, não é uma moda - como a dado momento alguns radicais dos Verdes procuraram destacar - mas a verdade é que a diminuição da camada do ozono elimina uma barreira de protecção que temos quando circulamos. O uso dos gases fluorados, (vou tentar fugir a um jargão mais técnico mas às vezes incontornável), os gases fluorados, os CFC’s, HFC’s, aqueles gases que estão presentes nos sistemas de climatização e refrigeração, são responsáveis pela diminuição da camada do ozono.
A diminuição da camada do ozono fez disparar o número de doenças de pele: reparem que hoje temos registo de um número muito maior de cancro de pele e de consequências de queimaduras solares que há alguns anos não tínhamos. Todos nós temos noção que hoje a exposição ao sol tem consequências muito mais graves do que há 30 anos. Isso é indesmentível.
Outro sinal, (vou procurar falar essencialmente de sintomas que estão associados à qualidade de vida das pessoas) é o do ozono troposférico, ao nível mais baixo.
Estão a aumentar casos de asma e doenças respiratórias em particular nos mais jovens, em crianças. A asma hoje é uma doença generalizada, quando há algum tempo atrás eram felizmente poucas as crianças que tinham asma. A consequência do ozono está nas doenças respiratórias como a asma.
Outro exemplo também relacionado com a saúde é o da resistência aos antibióticos. Os médicos dizem-nos que, por causa da banalização dos antibióticos na alimentação animal (e até no tratamento humano), se verifica uma resistência mais rápida a alguns antibióticos e hoje todos conhecemos casos dentro das nossas famílias em que nas crianças o primeiro antibiótico não serve e o segundo também não e vão ao terceiro porque a banalização do antibiótico levou a que esse forte aliado perdesse alguma força.
Outro sintoma que há trinta anos não tínhamos também relacionado com a saúde (vou procurar fazer sempre esta ponte entre ambiente e saúde humana) está relacionado com os produtos químicos.
O boom da indústria química dos anos 50 - numa altura em que o princípio da precaução era uma ilusão e que a produção integrada não era ainda um tema (que dentro de instantes referirei) - levou a que a produção dessas substâncias perigosas estivesse apenas orientada pela produtividade e pela eficácia tecnológica do produto. Levou a que não tivessem em consideração os efeitos na biodiversidade e na saúde humana. Foi por isso que algumas substâncias como os PCB’s (que são isolantes muito importantes nos transformadores de alta potência) fossem de tal forma democratizados como cádmio, o chumbo e os PCT’s, que nos países nórdicos (onde alguma dessa indústria estava na orla costeira) originou uma contaminação do pescado que, por indicações estatísticas, comprovou uma quebra na fertilidade masculina na Suécia e na Noruega, por exemplo. Há hoje estudos que comprovam que a fertilidade masculina nesses países diminuiu devido à banalização desses produtos químicos organicamente persistentes que são cumulativos. Um peixe que absorva algum mercúrio não degrada esse mercúrio e quando nos vem parar ao prato tem efeitos cumulativos que não são degradados por nós. E ao segundo e terceiro peixe acumulam a substância química perigosa. Ora essas substâncias químicas são disruptores endócrinos: rompem o nosso sistema hormonal. Estamos a falar de um sinal do nosso tempo de há 10, 15, 20, 30 anos.
Falando agora de matérias menos relacionadas com a saúde mas que também comprovam um sinal de insustentabilidade. O congestionamento das cidades provocada pelos transportes: é um sinal deste tempo e não de alguns anos atrás. O aumento dos transportes tem como consequência para o quadro geral do efeito de estufa, mas também para a qualidade de vida, para a degradação da qualidade do ar. As emissões de gás com efeitos de estufa no sector dos transportes tem vindo a aumentar de forma impressionante e prevê-se que aumente na Europa nos próximos dez anos mais 50% e em Portugal mais 110% se não fizermos nada.
Os solos. Esta é uma questão que afecta essencialmente Portugal, Itália e Espanha e muitas vezes não está na agenda política europeia precisamente porque é um problema essencialmente dos países da bacia mediterrânica: o empobrecimento do solo e a degradação do solo. Os cientistas dizem-nos que o stress que está a ser provocado ao solo é muito maior do que aquele que era conhecido. O uso de nitratos, de pesticidas, a agricultura intensiva, a construção galopante na orla costeira, todas estas actividades humanas têm vindo a empobrecer o solo e a degradá-lo. Este é um dos sinais que é menos reconhecido pela população porque olhamos para o solo, olhamos para uma mão de terra e achamos que a terra é a mesma com as mesmas qualidades físicas, químicas, biológicas daquela que conhecíamos há 10 anos. Mas não é a mesma, estamos a assistir a uma alteração do estado e da qualidade do solo quando ainda por cima nos afecta particularmente – a Portugal, Espanha e Itália.
Outro sinal da insustentabilidade na área ambiental, (raramente pensado por cada um de nós quando utiliza esse recurso), está na água.
Portugal felizmente não tem problemas de quantidade, mas há cada vez mais países que têm problemas relacionados com a falta de água.
Portugal faz parte daquele conjunto de países que não tem problemas ao nível da quantidade mas que se não tivermos algum cuidado, teremos problemas ao nível da qualidade da água, em particular das águas subterrâneas.
A qualidade das águas subterrâneas tem vindo a diminuir de uma forma muito drástica ao ponto de se achar que a par da mudança climática este é um dos problemas ambientais mais graves e que demoram mais tempo a reparar. Quando aqui em Castelo de Vide se faz um furo de dez metros num campo aqui perto não haveria grande problema de contaminação das águas subterrâneas. Porém, com a tecnologia que hoje está disponível que permite perfurar centenas muitas centenas de metros e quando a dez quilómetros daqui, dois furos que antigamente não estavam em contacto e a partir de agora passam a estar em contacto por via das águas subterrâneas e um furo que seja feito a duzentos quilómetros daqui também está em contacto com o furo que é aqui feito (porque eu já não tenho uma profundidade de dez metros, tenho de 400 ou 500 metros) significa que o controlo da situação se tornou muito mais difícil. Porque a democratização do dano ambiental aumentou e a intervenção que poderíamos fazer caso a caso, deixou de ser possível porque neste momento existem milhares de pontos de ligação a uma determinada água subterrânea. Assim é muito mais difícil combater esse dano ambiental.
Não quero deprimi-los (RISOS), daqui a pouco falaremos, das medidas que estão a ser tomadas a nível nacional, europeu e internacional precisamente porque a política e os organismos se têm mobilizado por algumas destas causas. Mas faz mais sentido que comece por identificar os problemas.
A segunda ruptura que gostava de me referir (perceberam que quis fazer a ligação entre a degradação ambiental e prejuízo para a saúde pública?) refere-se ao bem-estar social e é isso que me vai permitir fazer a ponte para o conceito do desenvolvimento sustentável. Sendo certo que todos nos impressionamos muito com os dados que eu acabei de referir, (a mudança climática, o ozono troposférico, estratosférico, perda de biodiversidade e por ai adiante), percebe-se que tudo isto sendo relevante, perde alguma da sua relevância se tivermos noção que há 3.000 milhões de cidadãos que vivem com menos de 1 € por dia e se dissermos que há 1.000 milhões de pessoas que vivem em situação de pobreza extrema e que 2.000 milhões de pessoas não têm acesso a energia eléctrica. Reparem, nós estamos a falar do efeito de estufa, da mudança de paradigma da promoção das energias renováveis, da mudança (“mix” energético) do petróleo para as renováveis mas atenção: há 2.000 milhões de pessoas que não têm energia eléctrica sequer. A questão não é tanto a de saber a qualidade da fonte energética mas saber se têm fonte de energia. E há 2.000 milhões de cidadãos que a não têm. Como há 1.000 milhões que não tem acesso a água potável e 2.400 milhões que não têm saneamento básico. Vejam a diferença de preocupação que todos temos ao nível ambiental quando do outro lado do planeta a questão ainda não é a da degradação ambiental: é o acesso aos recursos que a norte degradamos.
Outro exemplo é de que há 28.000 crianças (eu sei que às vezes em conferências isto funciona muito bem porque é uma forma de provocar o choque, mas estou a usar estes dados porque eles devem ser conhecidos e porque nos devem mobilizar em termos políticos) que morrem diariamente. Num momento em que a norte banalizamos os antibióticos, há 28.000 que morrem diariamente por não terem medicamentos de uso corrente e há 3 milhões de pessoas que morrem anualmente por doenças do foro diarreico derivado da má qualidade da água. E um milhão e meio são crianças.
Se a isto juntarmos que 70% da população contaminada com HIV está em 7 países da África Subsariana, percebe-se que o modelo de desenvolvimento assente na globalização (que permitiu democratizar capital, tecnologia e informação, que criou um mercado único ou um mercado global e que permitiu acelerar o modelo de desenvolvimento a Norte) não foi capaz, até ao momento de, a Norte, regular os efeitos ambientais dessa globalização nem de, a Sul, resolver a ruptura ao nível do bem-estar social. Não é (julgo eu) importante termos uma solução única para a insustentabilidade – é, sim, imprescindível ligarmos o combate à pobreza à protecção ambiental. Foi isso que esteve na base do conceito de desenvolvimento sustentável. Eu vou utilizar a definição que foi pela primeira vez utilizada pela Senhora Bruntland em 87, na primeira Comissão que trabalhou o desenvolvimento sustentável:
“O desenvolvimento sustentável é o que permite alcançar as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de alcançarem as suas próprias necessidades.”
Não estamos por isso a falar de conservacionismo ou de pressão zero sobre o planeta, estamos a falar de solidariedade inter-geracional.
É que o planeta é como um elástico: vai aguentado a pressão que vai sendo feita sobre ele mas, mesmo antes de romper, há um momento em que largando o elástico, ele já não volta ao ponto inicial. Ficou com uma dimensão maior, ficou esbranquiçado.
Alguns desta sala já me ouviram utilizar esta analogia várias vezes, mas eu não consigo encontrar uma melhor analogia. Que é a ideia que o planeta tem capacidade para se regenerar face à nossa pressão, voltar ao estado inicial, mas que há um limite a partir do qual ele já não consegue voltar à situação inicial.
E eu acho que estamos a caminhar perigosamente para alguns dos sinais que identifiquei, para pontos de não retorno e que podemos minimizar, mitigar e lançar dinheiro para minorar.
Ou seja, não combatemos a mudança climática e gastamos 500 milhões de contos a reparar os danos da mudança climática no litoral. Não combatemos o ozono troposférico, mas em contrapartida vamos desenvolver vacinas e medicamentos para combater a asma. Há sempre soluções a jusante. Mas o que é importante é percebermos que a intervenção que faz sentido, é a intervenção a montante, a intervenção nas causas.
Quais são as linhas de fuga?
A primeira é a de lançar o “greening” da economia e o Prof. Diogo Lucena, hoje, terá já referido esta noção. Só há uma solução para mudar comportamentos. É haver um sinal de preço. Não há outra solução. Durante 50 anos a política ambiental nascida com o clube de Roma e depois consolidada em Estocolmo foi muito orientada para o concreto. Para a regulamentação, para a identificação das boas práticas. A verdade é que nem tudo mudou, e provavelmente a maior parte não mudou. O único instrumento capaz de mudar comportamentos é o sinal de preço. É o sinal de preço que permite reorientar escolhas. Que o consumidor perante três produtos escolha o mais verde, que o produtor perante quatro tecnologias prefira utilizar a mais limpa. Hoje, por ausência de sinal de preço, quem produz verde perde dinheiro, e quem consome verde consome um luxo.
Portanto a questão fundamental é lançar o “greening” da economia. Isto é, na composição de custos, naquilo que permite chegar ao preço final de um produto é preciso meter lá dentro o custo das “externalidades” ambientais desse processo ou desse produto. Vendo de outra forma: quando se produz este telefone é importante que se saiba, na composição de custos, quais são os efeitos ambientais de produzir este telefone com uma tecnologia de injecção que não é a mais eficiente, e portanto, que emite mais gases com efeito estufa. O custo de não fazer nada existe! Se não fizermos nada existe um custo associado. É fundamental internacionalizar! É a isto que se chama internacionalização dos custos ambientais na economia. Com essa prática, consumidor e produtor têm vantagens. Para além da “internacionalização dos custos ambientais”, gostava de associar ao greening da economia uma outra noção: “produção integrada”. É algo sobre o qual vão ouvir falar muito fortemente nos próximos dois anos a nível Europeu e a nível Nacional.
A produção integrada é a filosofia de produção industrial que obriga a que, quando o produtor começa a desenhar esta esferográfica, já tenha em conta o nível tecnológico e o nível económico, o tempo de produção, o modo e o tempo de consumo, mas também, o momento em que esta esferográfica perde a sua validade e termina o seu ciclo de vida.
O produtor passa a ser responsável pela programação e pelos custos, desde a produção até à eliminação, reciclagem, reutilização do seu produto. Ora, ele é responsável por todo o ciclo de vida do produto, e se, num determinado automóvel, tiver que escolher entre utilizar material reciclável ou não reciclável, vai preferir o material reciclável porque vai diminuir os custos quando tiver que ser ele a receber o automóvel em fim de vida útil. Este conceito de produção integrada é um conceito que vai presidir a toda a legislação ambiental a nível Nacional e a nível Europeu e é este conceito de greening da economia e de sinal de preço que deve obrigar à eliminação progressiva dos subsídios a combustíveis fósseis. Como é que se pode subsidiar um tipo de combustíveis quando sabemos que os custos ambientais desses combustíveis são assinaláveis?
É este conceito que vai dar origem à tributação ecológica, à internacionalização dos custos ambientais por via da fiscalidade.
É este conceito que vai dar origem a taxas obrigatórias de reciclagem e de colocação no mercado de produtos verdes. Para além das energias renováveis é importante começar a dizer que 30%, 40%, 50% do papel colocado no mercado deve ser reciclável e, como hoje já temos para a área da embalagens, estipular metas vinculativas de presença no mercado de produtos mais limpos. Eu podia dar mais exemplos, (e mais adiante poderei fazê-lo na parte das perguntas e respostas), da existência de condições para internacionalizar os custos ambientais na economia e vencer nesta economia e encarar o ambiente como uma grande oportunidade.
Eu ainda ontem, estando a discutir as grandes opções do plano, hesitava entre manter o ambiente no capitulo da justiça social e da igualdade de oportunidades (que é onde está), ou colocar o ambiente no capitulo de crescimento sustentável ou do crescimento económico. Precisamente porque o ambiente não pode ser visto apenas como um custo ou um direito. O ambiente é mesmo uma grande oportunidade, há um milhão de postos de trabalhos que podem ser criados no sector das energias renováveis. Portanto é um sector florescido, como diz o Prof. Hernâni Lopes, estamos a falar de uma constelação de investimentos que gera uma constelação de oportunidades na área do ambiente, como na área dos transportes.
Segundo impulso, é o da “governança” internacional. (Eu estou a falar em tese. Não cheguei ao detalhe e não o vou conseguir fazer nesta primeira parte das políticas europeias e das políticas nacionais). O segundo vector para a sustentabilidade é o da governança internacional, porquê? Porque estamos a falar de matérias nos ambientes em que a solução nacional, a solução europeia, não é capaz de resolver o problema. O problema das águas subterrâneas, o problema da poluição dos recursos hídricos, o problema da mudança climática, do ozono troposférico, do ozono estratosférico, o problema dos produtos químicos organicamente persistentes, nenhum destes problemas pode ser resolvido com políticas de matriz nacional (ainda que possam ser voluntariosas), porque os seus efeitos são internacionais. Portanto, é importante que possamos continuar, em primeiro lugar, a desenhar novos instrumentos de regulação da globalização a nível ambiental. O Protocolo de Quioto precisa de irmãos. O Protocolo de Quioto, que estabelece soluções, que estabelece uma grelha com a qual os países têm de viver para que a mudança climática possa ser mitigada, precisa que a ele se associem outros protocolos para outros problemas ambientais de incidência internacional e não apenas nacional.
Por outro lado, é necessário, (e sei que esta matéria é cara, nomeadamente ao Gonçalo Capitão que sobre isto já falamos várias vezes) interferir na remodelação dos organismos existentes, reformando algumas instituições. As Nações Unidas, os Padrões de Bretton Woods, a OMC são instituições onde o ambiente ainda não está suficientemente presente na equação dos custos e das oportunidades. Estas instituições foram desenhadas numa época onde aqueles sinais que vos apresentei no início ainda não existiam da forma dramática como hoje existem. Para além de novos instrumentos, também temos de intervir ao nível das novas instituições, reformando as instituições existentes.
Por último, é necessário caminhar para o surgimento de novas instituições, não apenas reformando só as actuais. Estou a falar de um tribunal para os crimes ambientais em que sendo os crimes ambientais de incidência transnacional, não pode o direito nacional ser a única malha em que se tece a vida do prevaricador. É importante que o prevaricador em Espanha, que produziu um dano sobre as águas subterrâneas que afectam Portugal, em particular se estivermos a falar em reincidência, possa ser alvo de um enquadramento penal internacional. Tenha aliás, a certeza, que muitos dos problemas ambientais mais gritantes que hoje vemos poderiam ser remediados pela via da dissuasão. A existência muitas vezes de algumas das instituições tem um efeito dissuasor.
Terceiro e último vector, (perdi muito tempo com a primeira parte) é ao nível da acção. O conceito de greening da economia - governança internacional que permite regular a globalização colocando-a ao serviço do desenvolvimento sustentável e não fazendo dela factor de prejuízo do desenvolvimento sustentável - só é passível de ser concretizado se tivermos um plano de acção, um roteiro, que diga que “até 2004, é preciso fazer isto, até 2005 é preciso fazer isto”, haver metas vinculativas, calendários, mecanismos de concretização a nível internacional, como a nível Europeu e Nacional.
Joanesburgo foi a resposta internacional aos sinais de insustentabilidade que eu tracei no início e aos vectores de fuga que acabei de identificar. Joanesburgo significou uma passagem do conceito à acção.
O Rio e Estocolmo foram o conceito do desenvolvimento sustentável. Joanesburgo aponta para a acção. De Joanesburgo saiu um plano de implementação que vincula Portugal e os outros Estados ao nível da água, da biodiversidade, dos stocks de pescado, da produção e consumo sustentáveis a 10 anos, por aí adiante. Existem metas vinculativas e calendários de cumprimento. A nível Europeu também foi desenhada uma estratégia europeia para desenvolvimento sustentável que aponta também para metas, para calendários, para mecanismos de concretização dessas metas.
Por outro lado, o vosso Reitor e meu amigo Carlos Coelho sabe disso melhor que todos nós. Há um pânico, há uma pressão enorme sobre as Instituições Europeias a partir de Fevereiro, porque em Março são fotografados os Estados na Cimeira da Primavera, não a partir do PIB, mas a partir de 90 indicadores de desenvolvimento sustentável, onde há uma estratégia europeia de desenvolvimento sustentável. E em Março, na Cimeira da Primavera, todos os Estados são fotografados a nível do seu desempenho, de uma forma independente o que permite dizer que o PIB já não é o indicador-rei, já não é a produtividade, já não é a taxa de empregabilidade o factor crucial para dizer que um país está na vanguarda do desenvolvimento, mas é a conjugação de 90 factores, sendo que mais de metade deles estão relacionados com produção e consumo sustentáveis.
Por último, para fechar o ciclo da solução, sem entrar no conteúdo das questões:
Estratégia Internacional do desenvolvimento sustentável; Estratégia Europeia do desenvolvimento sustentável; Indicadores de motorização; Avaliação e depois, directivas Europeias que estabelecem o tal “greening” da economia.
Eu só vou dizer o nome:
Directiva das energias renováveis que aponta para a obrigatoriedade de 12% da energia primária até 2010, decorrer de fontes renováveis.
Passando para a electricidade: Portugal tem que cumprir uma meta de produção de electricidade a partir de fontes renováveis de 39%, até 2010.
Directiva do Comercio de Emissões que envolve 12.000 instalações europeias (224 portuguesas), e que diz de que forma se pode vencer na economia do carbono impondo uma bolha progressivamente decrescente, em que as empresas cumprirão o Protocolo de Quioto numa lógica mais sustentável. Isto é, reduzindo de cumprimento em 35%.
Directiva dos Biocombustíveis que impõe uma meta de utilização de biocombustíveis de 5,75% no peso global dos combustíveis, até 2010.
Directiva dos Residios de Embalagens que impõe uma meta de 55% de reciclagem até 2008, quando a meta de 2001 era de 25%.
Directiva Quadro da Água que permite que possamos viver mais descansados na relação Portugal–Espanha. Portanto, têm aqui um exemplo de como uma directiva europeia aumentou a nossa soberania. Aponta para obrigações ao nível da quantidade, da qualidade e da internacionalização dos custos ambientais no preço final da água. Como disse há pouco, solta-nos de uma relação de dependência com Espanha uma vez que essa directiva do quadro da água vincula Portugal e vincula Espanha. O que é importante, uma vez que é em Espanha que está uma grande parte dos nossos recursos hídricos.
Directiva dos Veículos em Fim de Vida Útil que diz que o produtor (BMW, Renault etc.) é responsável pela recolha de todos os veículos em fim de vida e que tem de financiar a sua reciclagem.
Podia ter aqui uma lista muito longa. Felizmente, daí o meu optimismo de directivas ambientais que apontam para o greening da economia, sempre com este conceito: o planeta tem um limite de sustentabilidade. A internacionalização dos custos ambientais é a única solução para que produtor e consumidor encontrem aí vantagens.
O Ambiente está ou deve estar dentro da economia e o Homem no centro das políticas ambientais. Portanto, estamos do meu ponto de vista, a falar de um novo conceito, de uma nova geração de políticas ambientais que aponta para o Humanismo Ecológico. Que não é tanto o que sucedia com os movimentos radicais dos últimos 50 anos, em que havia uma certa lógica de conservacionismo e de naturalismo. Julgo, que o que está em causa é colocar o Homem no centro das preocupações ambientais e o Ambiente dentro da economia.
Deixaria outras matérias mais para a frente porque já ocupei o tempo previsto.
Muito Obrigado
PALMAS
Jorge Nuno Sá – Presidente da JSD
Bem, vamos então começar a sessão de perguntas. Pelo grupo bege é o Rui Freitas o primeiro a colocar a questão.
Rui Freitas
Antes de mais, Boa Tarde!
Algumas das perguntas que eu queria fazer já foram respondidas. No entanto, há algumas coisas que eu queria que fossem aprofundadas.
Na Cimeira do Rio de Janeiro, acho que foi em 92, saiu uma coisa muito engraçada que foi a Agenda XXI. Acho que estou certo. E aí começou-se a falar pela primeira vez das Estratégias Nacionais para o desenvolvimento sustentável. Uma Assembleia Geral das Nações Unidas, há uns anos, estabeleceu 2002 como data para se apresentarem essas mesmas estratégias e na última Cimeira Mundial para o desenvolvimento sustentável dizia-se que 2005 era finalmente a data dessa implementação. Eu queria saber de facto qual é a estratégia de Portugal. Queria conhecê-la mais profundamente.
Depois queria colocar outra questão, relativa ao sinal do preço. Hoje em dia o sinal do preço funciona da forma contrária. O que eu digo é o seguinte:
Uma pessoa que utiliza um carro diesel emite mais gás e paga menos. Uma pessoal que tenha um carro com uma energia mais limpa, como uma sem chumbo 98 (que mesmo assim polui), paga muito mais. E depois, o exemplo dos automóveis híbridos que em Portugal já existem e não são utilizados devido ao preço que eles chegam a atingir e são vendidas unidades irrisórias. Para já, era isso.
Muito Obrigado
Jorge Moreira da Silva
Muito Obrigado!
Eu vou separar a resposta em duas.
Sobre as Agendas XXI:
Tem toda a razão, é um compromisso que tem sido permanentemente falhado, não cumprido. Mas a própria Estratégia Nacional para o desenvolvimento sustentável que devia ter sido apresentada em 97, foi apresentada pelo anterior governo do PS, em cima praticamente da Cimeira de Joanesburgo. O que levou a que, na época, o Primeiro-Ministro Durão Barroso tivesse dito que não se reconhecia naquela estratégia, que era pobre e foi por isso que foi desenvolvida uma nova estratégia de desenvolvimento sustentável com muito detalhe. Não é uma estratégia vaga, aponta para metas e instrumentos de concretização, mas que agora, não tenhamos ilusões, só pode ser concretizada se cada um dos Ministérios assumir essa estratégia como vinculativa e avançar com medidas para a concretizar. E por outro lado, só pode ser concretizada se não tivermos a ideia que o desenvolvimento sustentável se faz com um passe de mágica nacional dispensando os Municípios.
As Agendas XXI locais deviam, numa lógica ideal, até ser anteriores aos PDM`s.
Os PDM`s deviam ser a territorialização das Agendas XXI.
As Agendas XXI, sendo planos de acção sustentável, equilibrando a economia, bem-estar social e o ambiente em cada Município e envolvendo os conceitos de internacionalização de custos ambientais, qualidade vida e por aí adiante, deviam ser a base de elaboração dos PDM`s.
O que acontece não é isso, e daí que o Ministério do Ambiente, (vou dizê-lo quase em primeira-mão), vindo aí a próxima geração da revisão dos PDM`s, (os primeiros PDM`s foram desenvolvidos em 80 e chegou o momento de fazer a sua revisão), entendemos que deve haver um movimento de aceleração das Agendas XXI, para que sejam anteriores à própria revisão dos PDM`s e vamos avançar com um instrumento para facilitar a elaboração das Agendas XXI e acima de tudo para as harmonizar. Porque há Agendas XXI e Agendas XXI.
Há quem faça uma Agenda XXI numa semana, uma Agenda de papel. E há quem desenvolva projectos que são debatidos durante um ano, com todas as comunidades locais para chegar a um compromisso. Ora é para esta segunda opção que nós gostávamos de caminhar, numa lógica harmonizada para que as Agendas XXI encaixassem umas nas outras, principalmente porque é o principal motor para a territorialização para os tais PDM`s.
Sobre a sua segunda questão, e tocou provavelmente na matéria mais polémica do relacionamento da área do Ambiente com as áreas da Economia e das Finanças.
Portugal é um dos países onde ainda se fala menos verdade no preço do ponto de vista ambiental. Somos um dos Estados que tem o menor número de taxa e de impostos de raiz ambiental ou energética. E muitas vezes o sinal de preço está distorcido: não só não se dá o sinal de preço certo por via da tributação, como às vezes até se subsidia a fileira errada.
Se quisermos cumprir Quioto e criar oportunidades na área do ambiente, não vamos poder fugir a um debate sobre fiscalidade e sobre tributação. Do ponto de vista fiscal, é mais importante nesta fase, (não estou a falar de Portugal mas sim de todos os Estados), tributar a utilização intensiva de recursos do que tributar o trabalho. Muitos Estados estão a substituir progressivamente a carga fiscal no trabalho, substituindo-a por carga fiscal na utilização intensiva de recursos.
Portanto, para o Estado isto dá uma equação de soma zero, para as empresas e para o cidadão é muito vantajoso porque estariam aí criadas as condições para mudar comportamentos. Esse debate é um debate essencial se quisermos falar verdade em termos de greening da economia.
Jorge Nuno Sá
Muito bem, o segundo grupo é o encarnado e é o Luís Capão que coloca a pergunta.
Luís Capão
Boa Tarde!
Portugal assumiu a concretização do Plano Estratégico Nacional de Desenvolvimento Sustentável que visa metas do plano ambiental, económico e social com objectivo de um desenvolvimento equilibrado nos próximos 10 anos. Sendo inquestionável os efeitos em Portugal da política Espanhola para os recursos hídricos, preocupa-nos saber se há uma convergência entre os dois países nessa matéria.
Obrigado!
Jorge Moreira da Silva
Sobre recursos hídricos, como disse há pouco, temos uma vantagem que não tínhamos há quatro anos, que é a existência da Directiva Quadro da Água e que muda completamente a pressão negocial entre Portugal e Espanha. De qualquer forma, a concretização da directiva obriga que a gestão das bacias hidrográficas seja feita de forma conjunta. Há pouco referi que a Directiva Quadro da Água impõe caudais ecológicos, e portanto, uma manutenção do estado quantitativo da água. Impõe normas da qualidade da água, nomeadamente transfronteiriça e impõe também a repercussão dos custos ambientais no preço final. Até 2010, os Estados têm de demonstrar que no preço da água-produto está incluída a recuperação de danos ambientais sobre a água-recurso. E portanto, todas as actividades de captação, tratamento, transporte do recurso têm de estar reflectidos na água-produto, que nos chega a casa.
Para além disto, (para ir à sua questão) a Directiva também diz que a partir de agora as bacias hidrográficas têm de ser geridas de forma conjunta. Mesmo que a maior parte de uma bacia hidrográfica esteja em Espanha, é a comissão de bacia Portugal-Espanha que faz a gestão desse recurso hídrico. E a primeira reunião da conferência das partes sobre a gestão das bacias vai ser feita agora em Outubro ou Novembro, exactamente para assegurar que as decisões que vão ser tomadas em Espanha estão a ser feitas à luz da Directiva Quadro da Água e do nosso interesse.
Felizmente, o Governo Espanhol mudou a sua opção no quadro dos transvazes. Habituámo-nos a criticar os Espanhóis, principalmente da lógica dos grandes transvazes, do grande transvaze do Ebro. Ora, o Governo Espanhol decidiu que já não vai fazer um grande transvaze e que vai apostar essencialmente na des-salinização, na gestão sustentável do recurso hídrico e por isso, numa lógica de gestão da água mais sustentável. Isto baixa a nossa pressão negocial. A nossa ameaça (ameaça espanhola) sobre o nosso recurso hídrico baixou, mas também aumenta a nossa responsabilidade, porque no momento em que temos Alqueva com aquela quantidade toda de água é caso para pensarmos que de futuro, algumas boas práticas baseadas em novas tecnologias que estão a ser desenvolvidas podiam também ser seguidas em Portugal.
Se em Espanha a des-salinização, que é uma tecnologia ainda hoje cara, vier a provar que é o futuro, Portugal teria tido vantagem em participar nesse movimento também desde o início.
Foi o que a Dinamarca também fez, quando no momento em que faliu a sua indústria naval e havendo postos de trabalho que não queriam eliminar, desenvolveram um novo negócio, o dos aerogeradores. Ora passados 10 anos, a Dinamarca tem três empresas que são lideres mundiais na produção de aerogeradores que são o futuro da produção da energia.
Portanto, frequentemente, importa investir para ter vantagens competitivas quando se chegar a esse paradigma e seguramente na área da água a tecnologia mais sustentável não são os grandes transvazes, não são as grandes albufeiras, não são as grandes barragens, é a gestão sustentável do recurso hídrico.
Jorge Nuno Sá
Terceira questão é para o grupo Roxo e é o Luís Mendes.
Luís Mendes
Boa Tarde!
A minha pergunta e do meu grupo é muito específica e é sobre o Biodiesel em Portugal. Sabemos que a União Europeia para 2005 pretende que 3% do Diesel consumido seja Biodiesel. Sabemos que a produção do Biodiesel é feita com base em matérias-primas como os óleos de soja de frituras provenientes da restauração que muitas vezes são despejadas para o meio ambiente e queria saber que medidas e que investimentos é que Portugal está a fazer na produção de Biodiesel, em infra-estruturas, em unidades de produção e de transformação.
Obrigado!
Jorge Moreira da Silva
Tem aí uma área onde nós não temos que fazer muito, temos é de apresentar uma grelha clara aos operadores, porque eles tratam do resto. O que os operadores económicos precisam de saber é se isto é a sério ou não é a sério?
Porque se não for a sério aqui, os operadores vão para um país onde isso seja a sério. Isto é, os investidores na área do bio diesel não estão à espera de financiamento ou subsídios, espero eu, pelo menos não é assim que acontece lá fora.
Estão à espera de ter a certeza que nós vamos apontar para a concretização dessas metas. Porque se Portugal transpuser para o direito nacional a directiva do Biodiesel (que ainda não está transposta e que estamos a preparar com o Ministério das Actividades Económicas, e se essas metas forem vinculativas, (as do 5,75% até 2010), os empresários desta área tem noção que vale a pena apostar no Bio diesel, porque têm a certeza que o País está obrigado a cumprir essas metas. Têm aí o exemplo, que o sinal que deve ser dado não é tanto o sinal do financiamento ou o dos investimentos, é o da grelha que provoca robustez, que diminuiu o arrependimento de um determinado investimento. O exemplo ligando isso às energias eólicas, existe um investimento disponível para 100 estádios do Euro, (equivalente a 6 Expo’s 98), para área das energias renováveis. Tudo investimentos privados, não pedem um cêntimo ao Estado. Precisam é de ter a noção se isto é a sério ou não é a sério. Se vamos apostar nas energias renováveis ou não. Se vamos licenciar pontos de ligação ou não. Se vamos continuar a ter 300 Mega watts de energias renováveis instaladas, quando a Galiza tem 2.000 Mega watts. Se vamos ter 300 Mega watts instalados quando estão licenciados já 3.750 Mega watts ou se de facto vamos concretizar. Se concretizarmos, esse financiamento privado está disponível.
No Biodiesel é a mesma questão, desde que o legislador europeu e nacional garanta que essa meta é para cumprir, o mercado faz o resto. É necessário, do nosso lado, assegurar que a meta é para cumprir e que em termos de concorrência não se está a subsidiar de forma insustentável o Biodiesel. Porque também o Biodiesel não é a panaceia. Portanto, nesta lógica de fileira energética é determinante impor metas vinculativas mais do que introduzir financiamento.
Mas a sua questão é perfeitamente pertinente e por isso é que já em Outubro se vai avançar para a transposição da Directiva Comunitária para os Biocombustíveis.
Jorge Nuno Sá
Daniel Fangueiro pelo grupo Castanho.
Daniel Fangueiro
Muito Boa Tarde!
Desde já Sr. Secretário de Estado, temos o Ambiente como uma grande aposta no futuro. Gostámos de ouvir aqui um tema que ainda não foi falado hoje. Essencialmente, e ligando o Ambiente a uma grande área como seja o Turismo, e vendo o desenvolvimento sustentável como uma grande área ligado ao Turismo sustentável.
Querendo saber em termos de políticas ambientais, estratégias e prioridades quais são aquelas que servirão e estarão a ser tomadas para potenciar esse Turismo sustentável?
Muito Obrigado!
Jorge Moreira da Silva
Estava a pensar na melhor forma de introduzir essa questão, que é um dos principais problemas de relacionamento entre operadores e designadamente entre organismos do Estado.
Ninguém ganha, nem o ambiente nem o turismo se a opção desenvolvida na área do turismo não for sustentada, se as normas ambientais não forem cumpridas, se a edificação for feita em cima de falésias ou de arribas. E portanto, a nossa posição (e quando digo nossa, não é a nossa de Portugal, mas a das pessoas que estão tradicionalmente na área do ambiente) e que decorre das políticas ambientais é esta:
Não pode o turismo ser utilizado como instrumento para agravar ainda mais a insustentabilidade ambiental num determinado País. Logo, há algum tipo de turismo que nunca pode ser feito em algumas partes do território.
Nós estamos aqui, a maior parte de nós acredito que não temos a noção, estamos dentro de uma área protegida. Este hotel está numa área protegida. O que circunda este hotel, o que circunda Castelo de Vide e o Marvão está numa área protegida, num parque natural. E portanto, uma das iniciativas que deve ser potencializada é a da valorização no nosso património natural, potenciando o seu usufruto por parte das populações e não uma posição que nem é conservacionista, nem é economicista.
Na conservação da Natureza, Portugal é um dos Estados que tem maior área coberta pela Rede Natura. Temos 22% do nosso território coberto por Rede Natura. Temos 29 áreas protegidas. Os nossos Parques são uma vantagem e não um custo. A conservação da natureza deve começar a ser vista cada vez mais como uma vantagem competitiva no momento em que o turismo é cada vez mais exigente e não tanto como uma maçada que não permite que nada se construa. A circunstância de haver uma área protegida deve ser valorizada. O turismo da natureza deve ser impulsionado porque isso é uma vantagem competitiva. O tipo de turismo que cada vez será mais procurado, não será só o de sol e praia. O turismo da natureza é uma vantagem que Portugal tem, que outros países não têm. Nós somos o Estado da União Europeia com a maior área coberta pela Rede Natura 2000.
Portanto, uma das iniciativas que queremos desenvolver é a de potenciar cada vez mais o turismo de natureza no âmbito do ICN, abrindo os parques naturais à população e não fechando, dando a entender que “aqui ninguém toca, porque isto é área protegida”. De facto, ninguém deve tocar, mas isso deve ser valorizado e deve até potenciar receitas. É assim que é feito no Canadá, e nos Estados Unidos.
Com o outro turismo, o da orla costeira, neste momento sinto-me muito mais tranquilo, visto que só falta um plano de ordenamento da orla costeira ser aprovado. Mas depois de termos instrumentos de planeamento da orla costeira aprovados sabe-se o que pode ser feito e o que não pode ser feito. É importante assegurar que esses planos de ordenamento são concretizados. Se a intervenção for feita ao abrigo desses planos de ordenamento isso é uma vantagem para o próprio turismo. Olhemos para o Sudoeste Alentejano ou à Costa Vicentina: é uma área onde existem muito projectos, infelizmente, para tornar essa zona do Algarve igual a outras onde foram cometidos erros. Isso é uma falácia, porque nem sequer do ponto de vista turístico representa uma vantagem. Basta verificar que quantidade de turistas que começaram a deslocar progressivamente para a área do Algarve menos povoada, menos urbanizada, com um número mais baixo de hotéis e de campos de golfe, aumentou.
Portanto, há um tipo de turismo que é amigo do ambiente. Julgo que é esse turismo que neste momento urge potenciar. Caso contrário, tornar-nos-emos numa imensa Ibiza da Europa quando isso é violentar o nosso património, o nosso código genético natural.
Nós somos um dos Estados com maior valor natural. Dou o exemplo de uma coisa que se faz na Bélgica e que vamos tentar que aqui também se faça. A Bélgica tem uma costa pequeníssima, não tem grande história sequer ligada ao mar. Ora, as crianças da Primária até ao 9º ano têm uma semana de mar, onde as aulas (todas as disciplinas) são dadas em infra-estruturas na costa. No Inverno, a Biologia, a Botânica, a Geografia, a História toda dirigida para um conceito, que é o mar. Essa é uma área onde nós poderemos fazer muito em Portugal relacionada com as áreas protegidas. As escolas começariam, em vez de apenas visitar, a terem dias por ano onde algumas disciplinas são dadas nesses parques. Nesses parques é transmitida uma relação entre nós e a natureza, um conceito que não é aprendido num banco de escola, sobretudo se estamos num ambiente urbano, distante da natureza. Estamos a potencializar o espírito crítico nos jovens.
Eu derivei um bocadinho da pergunta que fez, mas como me falou de turismo, quis utilizar uma área que é tradicionalmente utilizada como um custo, como uma maçada. Lá está o ICN a chumbar mais um hotel! Lá está o Ministério do Ambiente a chumbar mais um campo de golfe! Tiremos partido da natureza como os Estados Unidos e o Canadá e a Finlândia fazem das suas áreas protegidas, criando receitas.
Jorge Nuno Sá
A quinta pergunta é para o grupo azul, e é o Nuno Presumido que faz a questão.
Nuno Presumido
Boa Tarde!
Dentro da certeza que os combustíveis derivados do petróleo são limitados e poluentes, que medidas está a pensar tomar como Secretário de Estado do Ambiente para que o uso de energias alternativas seja implementado em Portugal?
Jorge Moreira da Silva
Pois eu imaginava que essa pergunta do petróleo ia-me ser feita e estava ansioso por me poder referir a essa matéria.
É que todos os modelos económicos que foram desenvolvidos nos últimos 10 anos, quanto à utilização do petróleo como base ou como alavanca da produção nunca referiram que o petróleo pode chegar aos 50 euros.
Nem no pior cenário isso aconteceu. Ora, neste momento o preço do petróleo e há questões do ponto de vista geo-estratégico que o acentuam, tem que passar a ser encarado de outra forma.
Eu estive a ler alguns textos, até para preparar esta intervenção, ontem à noite, textos da Comissão Europeia de 2002, de 2003 e alguns até de 2004, mesmo desenvolvidos pela área do ambiente da Comissão Europeia que nunca apontavam para um cenário de 50 euros do barril do petróleo nesta fase. Apontavam para esse valor daqui a 30, 40 anos até mais do que isso, no momento em que as reservas começassem a diminuir. Estamos a falar de um facto novo que deve ser encarado também com criatividade. A dependência do petróleo, particularmente Portugal que depende em 90% do exterior e é o país europeu (a par do Luxemburgo) que mais depende do exterior em termos energéticos.
É um factor que do ponto de vista competitivo é grave. É grave porque a China decidiu alavancar o seu desenvolvimento, não nas energias renováveis mas nos combustíveis fósseis. A China tomou uma decisão como já há alguns anos os Estados Unidos tomaram quando construíram 80 centrais a carvão e a fuel, que não valia nesta fase apostar nas novas tecnologias. Ainda era preferível, esgotar os recursos fósseis existentes e só mais tarde dar o salto tecnológico. Como sabemos que a China é a economia que vai ter o maior crescimento no consumo nos próximos anos e quando já se sabe que a China já decidiu basear o seu modelo de produção de electricidade nos combustíveis fósseis, temos aí um sinal como a nossa dependência do petróleo nos coloca em prejuízo fase a outros Estados. Porque a tendência já não é também conjuntural, começa a ser estrutural e esta é a novidade. Hoje ouvirão o Eng. Carlos Pimenta provavelmente referir-se a isso.
O preço do barril do petróleo pode baixar, vai provavelmente baixar, porque os produtores de petróleo têm a noção da necessidade de não orientar muito rapidamente algumas escolhas no outro sentido por parte dos consumidores. Mas a tendência é o aumento sustentado do petróleo. Há uma segunda agravante, que é o factor ambiental. Não é possível vencer na economia do carbono, em que quem produzir o mesmo com menores emissões vence e que quem produzir o mesmo com as mesmas emissões ou com mais perde, se continuarmos a depender do petróleo desta forma.
Vencer na economia do carbono não é uma fantasia. Hoje a tonelada de carbono tem um preço no mercado. Se forem à Internet, no momento em que o comércio de emissões ainda não arrancou, a tonelada de carbono já está a 12,65 euros. Esse custo de carbono vai passar a ser internacionalizado no custo de todos os produtos.
Quioto ainda é um passo de bebé, são 5,2% de redução de gases com efeito estufa até 2010, quando os cientistas dizem que não é possível mitigar a mudança climática se não dermos um passo de redução em 70% das emissões. Temos de saber ler o jogo. Quioto é incontornável, até pode ser que um dia lhe chamem outra coisa, que o preço a pagar para ter os Estados Unidos de volta seja mudar o nome. Mude-se o nome, mude-se o que quiser. A ideia de Quioto está lá. Redução das emissões, internacionalização dos custos ambientais, mais, Quioto é um passo de bebé, o passo maior, mais sustentado vai ser dado mais adiante.
Portanto, mais tarde ou mais cedo todos os Estados estarão em Quioto, logo quem diminuir a sua dependência do petróleo e dos combustíveis fósseis ganha duplamente. Ganha, porque não fica dependente do recurso económico que vai aumentar e que está baseado em paragens do mundo que são muito agitadas. E por outro lado ganha porque tem condições para vencer nesta economia do carbono em que o mercado é global e os produtores têm vantagens se conseguirem produzir o mesmo com menos emissões.
É por isso, que é necessário apostar nas energias renováveis. E o que lhe posso dizer, é que um dia o papel do Ministério do Ambiente deixará de fazer sentido, há um dia em que o Ministério do Ambiente desaparecerá. É o dia em que o Ambiente estará em todos os Ministérios, ainda não está.
O papel do Ministério do Ambiente não é o papel de definir a política energética. Não é o de definir a política dos transportes. Não é o de definir a política Agrícola. Não é definir a política de Pescas, não tem esse poder. Mas tem o poder de pressionar, tem a obrigação de pressionar os outros Ministérios, identificando oportunidades e identificando custos. E esse é em alguns casos, potenciando e concretizando esses custos. Posso-lhe garantir que a produção de energias renovável é uma das maiores prioridades que temos para estes próximos dois anos.
Como disse há pouco, há 300 Megawatts instalados, 3.750 Megawatts licenciados nos últimos dois anos. Ainda não foi possível disponibilizar novos pontos de ligação, porque nem sequer aqueles que foram licenciados há mais de dois anos estão concretizados. Não é possível cumprir a meta das energias renováveis, 39% de electricidade. Não é possível vencer a economia do carbono. Não é possível cumprir Quioto se não se acelerar a introdução das energias renováveis, a começar na eólica mas também na Biomassa, na energia das marés e na energia solar.
Portanto eu acho que chegamos ao momento em que as energias renováveis já não são vistas como eram por alguns, como uma ilusão. Ilusão é daqueles que acham que é possível sermos competitivos continuando a depender a 90% do petróleo.
E eu pergunto se conhecem algum país, um único país que aposte em tecnologias limpas e que não seja competitivo?
Não há nenhum país à escala internacional que tendo apostado no verde não tenha aí criado oportunidades de negócio, postos de trabalho, novas empresas e riqueza instalada. Julgo que Portugal está em boas condições. Não temos menos recursos, muito pelo contrário, que a Dinamarca. Não temos menos recurso que a Finlândia. Temos massa cinzenta. É fundamental olhar para os bons exemplos e os bons exemplos não só aqueles que têm recursos, basta olhar para aqueles que mudando de políticas conseguiram vencer.
Jorge Nuno Sá
Vamos para a sexta questão que é do Grupo Cinzento, Luís Cané.
Luís Cané
Ora, Boa Tarde!
Escolhi os fogos porque também são um problema ambiental, estando nós inseridos num concelho e num distrito que foi particularmente martirizado no ano passado.
Para além do aumento da temperatura do planeta que já citou e da mão criminosa que todos já sabemos existir. De que forma é que a PAC influencia, uma vez que resultou numa diminuição da produção e num consequente abandono das populações do Interior para o Litoral.
Não será um dos principais factores dos fogos florestais?
Queria aqui deixar dois tópicos de duas medidas comunitárias, que vêem nesse seguimento: o pousio obrigatório e o voluntário que são ambos pagos e o pouco incentivo à criação do pequeno ruminante que é um agente biológico de limpeza da floresta.
Muito obrigado!
Jorge Moreira da Silva
Já vi que é um perito e eu não consigo debater política agrícola com esse pormenor.
Posso dizer que do nosso lado, do lado do ambiente olhamos para esta PAC como um sinal positivo. Esta PAC e o nosso companheiro Arlindo Cunha teve uma presença e um papel determinante no desenho desta Reforma da PAC em Bruxelas. Permitiu reduzir a pressão sobre a utilização intensiva de recursos que estava muito materializada na primeira PAC.
A PAC foi feita numa altura em que havia falta de abastecimento, havia problemas de abastecimento de produtos e neste momento existe excesso de produção em alguns casos. Foi com simpatia que verificamos que esta PAC aposta mais no Desenvolvimento Regional e menos na utilização intensiva de recursos.
Sobre a questão dos fogos e da presença humana, o que vou dizer é algo que foi dito duma forma muito eloquente no ano passado. A presença humana é o principal factor de dissuasão dos fogos. O Homem continua a ser o melhor vigilante e quem melhor pode desenvolver actividades preventivas, principalmente quando depende desse recurso. O afastamento da presença humana da actividade económica relacionada com a floresta (a relação entre o silvicultor/floresta e o agricultor/agricultura) conduziu ao tal abandono das terras.
Posso dizer, sem levantar muito o véu, porque isso compete ao Ministro da Agricultura que sei, que ele vai lançar uma iniciativa na área do abandono dos solos. Precisamente, porque foi identificado como principal causa passada e eventualmente futura dos incêndios, um progressivo afastamento dos solos. Essa é uma tendência europeia, aliás 50% da população europeia é residente até 50 km das costa e a tendência é que se não fizermos nada, 80% da população pode vir a concentrar-se numa faixa de 50 km.
Portanto são necessárias rapidamente iniciativas que fixem as pessoas à sua região e que se combata o abandono do solo. Há um problema que vai ter que ser resolvido, é que não se pode ter a intervenção durante 10 anos sobre terras que foram alvo de um incêndio. E esta é a dificuldade da solução que vier a ser encontrada. Por um lado sabemos que não há solução que não passe por fixar as pessoas nessas regiões e por outro lado, há razões que são facilmente compreensíveis, se disser que em áreas que foram alvo de um incêndio não se pode construir, não se pode fazer nada durante 10 anos.
Vai ser preciso encontrar aqui um compromisso para combater o abandono do solo. Posso dizer que o ICN (isto ainda é um mérito dos meus antecessores) apostou na primeira intervenção e na área da vigilância dos fogos florestais. E que aquele fogo da Arrábida foi detectado pelos novos sistemas de vídeo vigilância. Foi o sistema de vídeo vigilância instalado pelo Parque Natural da Arrábida que permitiu detectar aquele incêndio e que permitiu que ele pudesse começar a ser combatido desde o início. Eu gostava que tivesse sido combatido de uma forma que evitasse os resultados obtidos. Ainda assim, o que vos posso dizer é que as espécies que foram afectadas não são da área de protecção total, da protecção integral, são espécies que de acordo com os especialistas, em 5 anos podem estar restauradas. Mais difícil é o problema dos animais que se afastaram; o seu regresso vai ser mais difícil.
Jorge Nuno Sá
Muito bem!
Sétima pergunta cabe ao Grupo Rosa e é o Guilherme Costa que faz a questão.
Guilherme Costa
Olá, muito Boa Tarde!
Só que dizer, Parabéns! Deixou-nos com um pouco de falta de perguntas, visto que a sua intervenção acerca deste assunto foi brilhante. Nada do que nós não estávamos à espera de elementos do nosso Governo! Mas deixaram-nos mesmo sem palavras!
(Risos)
O que acontece, numa altura que se fala tanto na desertificação do Alentejo, da zona Interior que se fala de falta de emprego, que se fala da nossa dependência do petróleo:
Não acha que as Energias Renováveis seriam uma boa aposta para tentar travar a desertificação em massa do nosso Alentejo?
Eu não falo em energia renováveis como o hidrogénio etc., eu falo do girassol, da beterraba, de tudo, de culturas que podiam ser desenvolvidas no Alentejo.
Falou há pouco em 1 milhão de postos de trabalho, como se sabe Portugal está com bastante desemprego. Enquanto há algum tempo atrás era só uma ideia interessante, acho que era agora a altura e uma excelente oportunidade para nós (como deu há pouco o exemplo de outros países que começaram a apostar noutras energias alternativas), começarmos a apostar em Portugal em ser líder por exemplo nestas energias renováveis.
E quem sabe até começarmos a exportar? Porque assim conseguiríamos não só apenas criar postos de trabalho e evitar a desertificação do Alentejo, como também diminuir a grande dependência que nós temos em relação ao petróleo. Nós por ano importamos 105 milhões de barris de petróleo. Se nós conseguíssemos fazer com que esta dependência fosse menor, não só a nossa economia ficaria mais estável e menos dependente do abastecimento.
(Estão-me a dizer que já chega!!!)
(risos)
Bem mas já agora eu gostava de fazer uma crítica, se é que me é permitido! E é uma das coisas boas que a JSD tem é que nos permite fazer às vezes duras críticas!
Eu sou perto de Setúbal, começo bastante bem a Arrábida. Vou para lá correr e andar de bicicleta.
Falou-me do sistema de vídeo vigilância! É engraçado falar do sistema de vídeo vigilância, de um investimento desses, quando coisas tão elementares como a limpeza das matas não são feitas!? Como é que é possível? É só.
Dou por terminada a minha intervenção.
Muito obrigado!
Jorge Moreira da Silva
Começo pela última referência. Tem razão, mas há pior do que isso: perguntei aos Bombeiros, quando estive na Arrábida, porque é que era tão difícil combater lá o fogo?
Explicaram-me que na Arrábida como em outras zonas do país, quando estamos a falar de uma escarpa, só há uma forma para aumentar a humidade, a aérea. Não apaga o fogo, é só para aumentar a humidade relativa. E depois é preciso ir lá, directamente com os homens fazer a intervenção terrestre. Que não pode ser feita com jipes ou com carros porque estamos a falar de uma escarpa.
E que é necessário cada vez mais introduzir caminhos e corta-fogos precisamente para isso puder ser feito.
Perguntei ao ICN, e explicaram-me que existe uma enorme polémica com as ONG´s e até dentro do ICN, porque se entende que não se deve desmatar nem fazer grandes limpezas porque atenta contra a biodiversidade. O que eu expliquei é que vai tudo! Às vezes para não cortar uma árvore, a Arrábida ia ardendo toda.
Portanto, há aqui também uma zona fronteira, há algumas verdades feitas que vão ter de ser abaladas. O fogo controlado, a desmatação, a limpeza é essencial como nos disseram os técnicos americanos que estiveram cá até há 15 dias. Às vezes sacralizam-se alguns conceitos que caem pela base. Uma das razões da situação que há pouco referi, é precisamente porque não foi possível encontrar um consenso quanto a um plano de desmatação e abertura de caminhos que permitissem aos bombeiros ter uma rede para chegarem rapidamente aos locais de incêndio
Quanto às energias renováveis e ao Alentejo:
É precisamente uma região que pode beneficiar dos seus número de dias por ano de sol. Já está em construção um parque de energia solar em Moura. Sei que existem mais alguns projectos. A energia solar para já é muito competitiva no plano técnico, no aquecimento. A seu tempo será competitiva na produção de electricidade a partir de células foto-voltaicas. Os países que mais apostarem nisso a seu tempo mais ganharão. É verdade que no início há um custo associado, há algum cepticismo. Mas ninguém tem dúvidas que um dia a energia solar, a par do hidrogénio, porque são recursos inesgotáveis, será o futuro do nosso abastecimento de energia primária.
O Alentejo está em boas condições de fazer projectos-piloto nesta área. Digo eu, que tem ainda mais relevância, porque é uma das áreas onde o êxodo para os grandes centros é maior. A fixação da população a partir das energias renováveis é uma das soluções. Por isso há pouco referi um milhão de postos de trabalho a nível europeu que pode ser criado nesta área das energias renováveis nos próximos anos (6 anos). Sendo que os próprios autarcas me têm referido que a fixação de energias renováveis é uma das principais fontes de financiamento de projectos estruturantes nesses municípios. Sabendo que há um tão grande interesse em fixar fontes de energia renováveis, os autarcas têm negociado com os promotores condições muito vantajosas para a instalação dessas energias eólicas.
Hoje vão estar com uma pessoa que é considerada mais generosa do ponto de vista das populações (o Eng. Carlos Pimenta) no financiamento desse projecto nas vilas e nas cidades. E portanto, as energias renováveis têm vantagens em si mesmas, mas também vantagens induzidas para a economia local e até para o financiamento de infra-estruturas. Ainda ontem o Secretário Geral da Associação Nacional de Municípios me dizia que há um concelho no interior onde foi possível fazer um projecto de um milhão de contos de habitação social, porque foi uma das contrapartidas que colocaram ao promotor de energia eólica para que se pudesse fixar no concelho. Isto são vantagens que vão surgir cada vez mais. Estamos a falar de 300 Megawatts instalados, quando queremos até 2006 ter 3.750 Megawatts instalados. Portanto, há aqui um momento fantástico que se vai deparar nos próximos dois anos e que importa ser aproveitado também por todas as regiões.
Jorge Nuno é um minuto só para referir uma outra energia renovável que nunca ninguém refere, que é a poupança energética.
O custo que pode ser diminuído por iniciativa na área da poupança de energia, da deficiência energética no consumo é muitas vezes, muito superior às oportunidades geradas por algumas energias renováveis. Há um potencial de redução do consumo de 20% na União Europeia. Portanto, há 20% de consumo que se sabe que se pode diminuir rapidamente se forem dados sinais que mudem os comportamentos.
A Califórnia depois do último “apagão” introduziu uma taxa elevada para levar a que as pessoas utilizassem menos electricidade e baixassem os consumos. Em dois meses o consumo de electricidade na Califórnia baixou 25%. As pessoas entenderem o sinal de preço. Essa taxa desapareceu ou foi mitigada porque se resolveu o problema de segurança do problema eléctrico, mas as pessoas não mudaram de comportamento felizmente. Houve um momento em que uma taxa, um imposto levou a que as pessoas fizessem algo que já deviam fazer sem grande sacrifício, e no momento em que a taxa foi removida as pessoas mantiveram esses bons comportamentos.
Ora, em Portugal há um enorme desperdício, nos transportes, na indústria, nos edifícios, essencialmente neste sectores, e que pode conduzir a uma poupança de carbono, e uma poupança da economia, menor dependência do exterior. E é uma das áreas onde vamos desenvolver iniciativas nomeadamente na qualidade, na eficiência energética dos edifícios impondo normas vinculativas em termos de conservação térmica dos edifícios e dessa forma dar sinais para que se possa diminuir o consumo de electricidade.
Jorge Nuno Sá
Muito bem! Agora calha ao Grupo Amarelo colocar a próxima questão, e é a Márcia a próxima oradora.
Márcia Silva
Boa tarde!
Segundo estivemos aqui a ouvir, o ideal é existirem políticas de desenvolvimento sustentável na Europa, mas também sabemos que isso implica um custo elevado. Queremos saber se neste momento a Europa está preparada para enfrentar esses custos?
E se não corre o risco de perder competitividade com economias estrangeiras que não aplicam essas medidas?
Jorge Moreira da Silva
Eu não vou dizer que vamos ganhar dinheiro amanhã. Há um custo associado a algumas políticas ambientais. Depende de que tema estamos a falar, há temas em que a reprodutividade de um investimento é mais rápido. Estou a falar das energias renováveis, no momento em que o consumo de electricidade aumenta em Portugal em 5% ao ano, em que estamos ligados a Espanha através do mercado Ibérico de electricidade. As energias renováveis são um investimento reprodutivo a curto prazo. Há outras tecnologias muito relacionadas com o protocolo de Quioto, principalmente ligadas à indústria que tem um custo para as empresas de curto prazo. A questão é esta!
Estamos a falar de um problema ambiental grave que é o da mudança climática. Sabemos que o problema se vai evidenciar mais, não no nosso tempo, mas no tempo dos nossos filhos. Sabemos por outro lado que não é possível resolver tudo nessa altura e portanto é necessário começar já. Estamos perante uma dificuldade que é sermos políticos deste tempo, num momento em que a população não apreende o carácter negativo dessas consequências para a sua vida, e de terem de tomar algumas medidas impopulares. Mas é por isso que há pouco referia a solidariedade intergeracional. Se não houver coragem em Portugal, na Europa, no Mundo de tomar decisões nesta área, não há futuro em termos de qualidade de vida para aqueles que de nós descendem.
Portanto, estamos a falar aqui de uma questão ética quase moral mas colocaria no plano ético. Há coisas que temos de fazer, porque temos de fazer. Por acaso vai-nos trazer vantagens competitivas a médio prazo. Mas mesmo que não trouxesse há iniciativas que devem ser tomadas quando um bem maior está em causa.
Neste caso das alterações climáticas e refiro este caso porque os Estados Unidos não estão dentro do protocolo de Quioto e porque há esta noção que eventualmente estamos a ser voluntaristas, ingénuos, altruístas, moralistas, por aí adiante porque estamos a cumprir Quito e “porque são 130 países que estão em Quioto, quando os Estados Unidos estão de fora e que vamos perder competitividade”. Neste caso sabemos que a médio prazo vamos ganhar. Porque a mudança climática é incontornável, porque os Estados Unidos vão ter de aderir ao Protocolo de Quioto ou a outro qualquer porque a mudança climática vai incidir especialmente na costa leste dos Estados Unidos. E porque sabemos que no momento que eles adiram a Quioto, a circunstância de estarem a entrar mais tarde vai faze-los pagar custos económicos essencialmente porque evitaram algumas oportunidades. Porque a Dinamarca ao ter tido um custo de produção de aerogeradores, teve um custo inicial que foi reprodutivo a médio prazo, mas hoje ninguém faz um parque eólico sem comprar tecnologia dinamarquesa.
As nossas cimenteiras europeias que vão ter de colocar no preço de cada saco de cimento o seu custo ambiental, a tonelada de carbono, a curto prazo estão colocadas numa dificuldade face às empresas norte-americanas porque não têm que internacionalizar esse custo ambiental. A médio prazo isto traz vantagens porque as cimenteiras portuguesas e porque as europeias já o fazem, estão a introduzir tecnologia mais limpas nos motores, nas caldeiras, nos fornos e por aí adiante.
O que é importante, é com uma mão avançarmos com o Protocolo de Quioto, porque deve ser feito e ainda por cima sabemos que a médio prazo venceremos a economia do carbono, porque vão ser criadas novas tecnologias, novas empresas nestas áreas, mas também não sermos ingénuos na Organização Mundial do Comércio. E esta é uma batalha que eu procurei travar quando estava no Parlamento Europeu e que terá de voltar à agenda dos Estados em breve.
Quero dizer aos Estados Unidos que são livres de não ratificarem o Protocolo de Quioto. Cada Estado é livre de fazer o que quer. Mas não é livre de exportar para a União Europeia produtos que têm um custo mais baixo decorrente de não fazerem aquilo que é preciso ser feito. Portanto, todos os Estados são livres de fazerem o que querem não podem é ter vantagens competitivas ilegítimas decorrentes de uma opção que não é correcta.
Esta é a agenda que eu espero que a União Europeia venha a colocar na Organização Mundial de Comércio que é assegurar progressivamente que nos produtos essencialmente de base industrial e energética dos Estados Unidos, haja uma internacionalização dos custos ambientais. Mas deixem-me dar uma nota positiva, quando estava no Parlamento Europeu a negociar a nível internacional as áreas de alteração climáticas e quando fui autor da directiva do Comércio de Emissões, não imaginam o interesse que havia (e há) dos Estados Unidos face àquilo que estamos a fazer, é impressionante o interesse e até o receio de perda de competitividade por não estarem no Protocolo de Quioto e não estarem no Sistema Europeu do Comércio de Emissões.
Se excluir as Petrolíferas, a maior parte dos sectores económicos norte-americanos têm um grande interesse em acompanhar e participar nas iniciativas que a União Europeia está a desenvolver e este é o nosso ponto forte e é o ponto fraco da administração americana. É que neste momento Quioto não é uma matéria das ONG`s americanas, é uma preocupação das empresas de base tecnológica norte-americanas da área da indústria e da energia que têm receio que a Europa possa dar o seu salto tecnológico por estar em Quioto e que eles continuem numa lógica de subsidiação de comportamentos que não são certos e a dado momento vão-se deparar com perda de oportunidade. Portanto, era só para introduzir também aqui alguma nota positiva e não fugindo à questão: há custos que a curto prazo vão ter de ser pagos. Mas como disse há pouco, há também coisas que têm de ser feitas mesmo quando se podem (vou dizer aqui uma frase que não poderia dizer se estivesse aqui algum jornalista, mas estando aqui entre vós vou) dizê-lo.
Há uma condição para vencer na economia do carbono, que é de não ter medo de perder as eleições. Porque todas as políticas ligadas à economia do carbono têm alguma impopularidade associada. Portanto na Europa é essencial, se quisermos continuar a liderar o debate internacional e necessário darmos o exemplo interno para podermos ser consistentes na prática com aquilo que dizemos lá fora.
Jorge Nuno Sá
Grupo Laranja, Rui Robalo, e apelo à capacidade de síntese uma vez que nos estamos a aproximar do limite e todos os grupos têm de colocar as questões.
Rui Robalo
Boa Tarde Sr. Eng. Moreira da Silva!
Que medida deve tolerar a sobreposição de interesses económicos nomeadamente ao nível de exploração e comercialização da indústria mineira face aos interesses e objectivos ambientais?
A verdade é que no início da exploração de uma pedreira, nem sequer se realizam sondagens de carotagem. Não sabemos o que andamos a fazer, não sabemos o que andamos a explorar. Já não é hora de brincar.
A maior parte dos empresários de pedreiras não fazem estudos ambientais, não respeitam as quotas. Não há manutenção das máquinas, ou seja não há aspiração, não há desmatação, criam-se as lagoas ácidas e há a contaminação de aquíferos. Qual o motivos das serrações estarem muito afastadas das pedreiras? Temos de perder tempo, temos de gastar dinheiro em meios logísticos. E agora há quem diga que a indústria das pedreiras está mal, há quem diga que a comercialização de rochas ornamentais está péssima, mas o que é verdade é que nós vendemos a preços de chuva as rochas ornamentais aos italianos e a seguir vamos comprar o mesmo material já com o certificado de qualidade por dez vezes mais. Antes que se dê novamente o “Big Bang”, qual a solução que poderá haver para acabar com isto tudo?
Obrigado.
Jorge Moreira da Silva
As pedreiras são uma das fileiras económicas mais polémicas. Para além da nova legislação sobre inertes e sobre pedreiras que está a ser articulada entre o Ministério do Ambiente e o Ministério da Economia.
A pergunta permite-me, porque aquilo que refere sobre as pedreiras, poderia ser também utilizado para outros sectores da actividade económica de utilização intensiva de recursos, permite-me referir que nós temos dois instrumentos que podem e vão ser utilizados e que nos defendem e que eu ainda não referi porque estava à espera duma pergunta que me permitisse ligar essa directiva a comportamentos que todos associamos como negativos decorrentes de uma determinada actividade económica que é a responsabilização ambiental.
A maior parte de nós tem a noção de que aquilo que falta é cumprir a legislação que existe e de penalizar os prevaricadores. Ora, acabou de ser há dois anos aprovada uma directiva comunitária, a Directiva sobre Responsabilidade Ambiental que teria que ser transposta até 2007 em Portugal mas que nós vamos tentar antecipar essa transposição porque tem grandes vantagens para os bons empresários, as boas empresas e para os cidadãos.
A Directiva da Responsabilidade Ambiental diz que um dano provocado contra o solo, contra a água e contra a biodiversidade tem de ser reparado pelo operador económico, se não for reparado pelo operador económico tem de ser reparado pelo próprio Estado. Há aqui dois ou três conceitos que são totalmente novos. O primeiro é o da reparação, não estamos a falar de multas, de compensação. Estamos a falar de reparação do dano ambiental colocando-o no estado inicial. O que tem muito peso económico, como imaginam. A contaminação do Alviela no dia em que entrar a responsabilidade ambiental vai ter um impacto enorme. Eu espero que se resolva antes disso. Mas se hoje a Directiva da Responsabilidade Ambiental estivesse a funcionar em Portugal o que acontece no Ave, no Alviela, no Trancão, e adiante não eram problema, porque eram os próprios promotores que uma vez tendo uma determinada licença eram responsáveis por reparação do dano ambiental restaurando o seu estado inicial.
Este é o primeiro facto novo. Segundo facto novo:
Aqueles que não fizerem, faz o Estado. Ora, o Estado é o principal interessado a partir de agora pela fiscalização. E portanto mais do que fiscalizar de uma forma casuística, o Estado vai ser o principal interessado em monitorizar, inspeccionar, fiscalizar, aquilo que é feito pelos operadores, porque senão face a Bruxelas é o Estado que tem que reparar o dano, ou então entramos num processo de contencioso. Estamos a falar de um edifício jurídico que vai ter um efeito enorme na separação do trigo e do joio e que vai passar a dar garantias maiores aos cidadãos.
A outra directiva é da Produção Integrada que há pouco referi e não vou entrar nesta porque há pouco já referi.
Jorge Nuno Sá
A última questão é colocada pela Andreia Correia do Grupo Verde.
Jorge Nuno Sá
A última questão é colocada pela Andreia Correia do Grupo Verde.
Andreia Correia
Boa Tarde!
Tendo em conta a descredibilização da classe política, porque nem sempre dá um exemplo coerente com as políticas que defende e sendo o Senhor o Secretário de Estado Adjunto do Ambiente e do Ordenamento do Território e perito no assunto, gostaríamos que nos contasse que medidas concretas toma no dia a dia e que contribua para o desenvolvimento sustentável?
Será que poderá servir-nos, Sr. Secretário de Estado do Ambiente, como exemplo prático para a educação ambiental tão necessária?
Jorge Moreira da Silva
Eu posso dar-lhe alguns exemplos, mas permita-me que separe até porque na política da lógica europeia eu acho que aquilo que é da esfera privada vincula-nos aquilo que é da esfera pública é que é escrutinável. E portanto, eu espero ser avaliado não por exemplos da minha vida pessoal, mas por aquilo que for capaz de fazer para que todos possamos mudar de comportamentos. Mas posso dizer-lhe que tenho ao nível da separação do lixo, do consumo dos resíduos, do consumo da electricidade, e da utilização da água alguns cuidados, que não decorreram de educação ambiental, porque não tive educação ambiental quando andei no ensino básico ou secundário. Dependeu de duas coisas: Primeiro, do meu filho ter essa educação ambiental, logo a partir dos 2 anos os miúdos começam a ter alguma noção de educação ambiental e foi ele (e é ele) que muitas vezes me diz vamos levar o lixo, ao vidrão, ao papelão, ao embalão e por aí adiante.
Isto para fazer a ponte com a educação ambiental, é fundamental apostar tudo na educação ambiental, quanto mais apostarmos na educação ambiental mais garantias teremos que as coisas mudem num prazo razoável. Mas por outro lado, também na área da água e da energia eu passei a ver o mundo de forma diferente.
Foi particularmente importante, no desenvolvimento duma nova percepção, da minha parte, relativamente à Educação Ambiental, a participação na Conferência de Joanesburgo em 2002.
Na África do Sul, que é um país rico, aquilo que gastamos numa simples descarga do autoclismo seria suficiente para satisfazer as necessidades de água de 7 crianças. Quando no Soweto, a 5 km de Joanesburgo, cidade riquíssima da África do Sul, as pessoas não têm energia eléctrica e usam para cozinhar combustível de péssima qualidade que provoca a emissão de dioxinas e de furanos. Percebi que isto não é sustentável e que no meu próprio consumo de electricidade, devo ter aqui algumas noções de racionalidade, não por avareza mas por respeito. Há uma lógica que me irrita imenso e que passou a irritar-me mais desde que fui aí, se me permitem esta nota pessoal, eu acho que a minha vida mudou muito em termos políticos desde que estive nessa conferência. O deslumbramento ocidental, o deslumbramento do norte que utiliza intensivamente recursos sem o mínimo de respeito para com a falta que esses recursos fazem a sul nesse mesmo momento, é um deslumbramento que me provoca alguma repugnância e portanto devo dizer-lhe que introduzi alguns conceitos. Passei olhar para o consumo de electricidade e de água de outra forma, mas mais do que isso, passei a avaliar as políticas públicas de água, de energia, de assistência ao desenvolvimento de saúde com outros olhos. Espero que me avaliem mais por aí do que pelos meus próprios comportamentos. Muito obrigado
PALMAS
Carlos Coelho
Muito obrigado. Jorge Moreira da Silva.
Eu ainda vos queria dizer mais duas coisas, mas farei a seguir à votação, portanto pedia ao Gonçalo, ao Alexandre e à Zita que viessem para aqui. Nós vamos acompanhar o nosso convidado lá fora e eu voltarei dentro de 2 minutos.
Gonçalo Capitão – Avaliador da UV
Então agradecia a vossa atenção, até porque isto é um momento de glória que me reservaram na Universidade de Verão e é um momento de alguma exigência intelectual. Estou um pouco nervoso, não estou habituado a estas coisas complicadas (RISOS), vocês já sabem o que vão fazer, vão graduar a intervenção do Jorge consoante a ordem de interesse e por isso é com muita responsabilidade que vos peço na primeira fila que votem. Como vêm, tenho uma equipa de trabalho eficientíssima. Eu depois dou-vos o telemóvel desta rapaziada toda (RISOS). Agora a segunda fila por favor, terceira fila por favor, quarta fila, quinta. Pronto muito obrigado, foi emocionante, acreditem, nunca mais serei o mesmo.